FIGURAS MELGACENSES
Introdução
Alguns leitores vão pensar, certamente,
que só existiram estas personalidades no nosso concelho, ou então que foi uma
escolha pessoal, de acordo com as minhas preferências científicas ou
ideológicas. Nada disso. Para mim todos aqueles que nasceram, ou residiram, em
Melgaço são importantes, desde que possuam obra feita e com algum valor,
segundo a minha própria avaliação (sujeita, obviamente, a reparos e retificações),
ou de pessoas credenciadas para esse efeito. Já escrevi outras biografias, que
foram publicadas em jornais e no “Dicionário Enciclopédico de Melgaço”. Algumas
delas já tiveram o privilégio de figurar nos escritos do Dr. Augusto César
Esteves e de Aldomar Rodrigues Soares (Mário), mas eu pretendo aqui dar-lhes
realce, visto que os melgacenses em geral já as empurraram para uma zona de
sombra, para o enigmático limbo. A Câmara Municipal, nestes últimos trinta
anos, tem rasgado bastantes ruas e avenidas, mas o nome desta gente não figura
aí! Qual o motivo? Na minha opinião apenas o esquecimento é o culpado, pois não
existem quaisquer razões plausíveis para os votar ao ostracismo. // Hermenegildo
José Solheiro, Dr. António Augusto Durães, Dr. Augusto César Esteves, entre
outros, merecem ter o seu nome nas ruas, avenidas e praças melgacenses; julgo
que ninguém porá isso em causa. Mas também José Cândido Gomes de Abreu, um
homem que lutou toda a sua vida pelo engrandecimento da sua e nossa terra, que
fez obra no seu tempo, devia ter o seu nome em grande destaque na sede do
concelho. Mas não: tem hoje apenas a lembrá-lo uma pequena rua, quase uma
travessa, antiga caneja. O Largo da Calçada, que ostentava o seu nome, foi dado
a outro melgacense, Amadeu Abílio Lopes, nascido em Chaviães, generoso para com
o concelho nos últimos anos da sua vida, mas o qual residiu, desde a
adolescência, no Brasil, vindo à terra apenas em gozo de férias. É certo que
nessas ocasiões dava sempre algum dinheiro aos BVM, talvez ao Hospital da
Misericórdia, doou as suas ações da empresa “Quintas de Melgaço, Agricultura e
Turismo, SA” (da qual foi um dos fundadores), à Câmara Municipal de Melgaço, mas
isso não chega, não é altruísmo suficiente, quanto a mim, para o promover a
figura concelhia. Dinheiro é dinheiro, obra é obra. Imaginem só se a moda
pegava e todos aqueles que têm ações de sociedades anónimas as doassem às
Câmaras Municipais em troca de uma Avenida, Praça, Rua…? Havia de ser bonito!
Os outros aqui biografados jamais
mereceram sequer um simples elogio dos poderes públicos! No entanto vemos ruas
e avenidas com nomes de não melgacenses, alguns dos quais provavelmente nunca
puseram os seus pés em terras de Melgaço, ignorando porventura a sua existência.
Dou somente dois exemplos: Afonso Costa – foi primeiro-ministro na I República
(1910-1926), publicou legislação meritória, tal como a criação da Conservatória
do Registo Civil, a separação da Igreja e do Estado, o divórcio, a reforma do
ensino, a abolição dos títulos nobiliárquicos, etc.; e Salgueiro Maia – militar
de Abril, o qual ajudou a derrubar o regime corporativista (1933-1974). Foram
sem dúvida pessoas importantíssimas, a quem devemos respeitar e admirar. Que todos
eles tenham o seu nome nas ruas de Lisboa e Porto concordo plenamente, pois
foram figurais nacionais e essas cidades têm centenas de ruas e cabem lá todos;
agora em Melgaço, com um número escasso de ruas, eles estão a ocupar indevidamente
o lugar dos melgacenses ilustres, o que não devia acontecer. «O seu, a seu dono».
A
antiga Rua de Baixo ostenta agora o nome do padre Justino Domingues. Que eu
saiba esse sacerdote, já falecido, nunca fez nada de significativo pelo
concelho! Os cargos que teve: pároco da freguesia da Vila, da legião portuguesa,
arcipreste, e pároco da Santa Casa da Misericórdia são – que eu saiba –, cargos
religiosos, ligados à sua profissão e à sua ideologia e crença. Alguém achará porventura
que têm a ver com o desenvolvimento, seja material ou cultural, do nosso torrão?
Era um homem com alguns saberes, boa pessoa, ótimo conversador, mas nada nos
legou, pelo menos que eu tenha conhecimento. Alguém terá? Uma rua? Então todos
os sacerdotes que nasceram ou exerceram o seu múnus em Melgaço teriam direito a
uma rua na Vila! Se querem prestar homenagem a ministros da Igreja Católica
então selecionem. O padre Bernardo Pintor e o padre Aníbal Rodrigues nasceram
em Castro Laboreiro; esses, que eu saiba, deixaram alguma obra. O segundo tem
um busto e uma avenida em Castro, é certo. E o primeiro?! Os irmãos Vaz: padre
Carlos, cónego António e padre Júlio, nasceram em Fiães. Apesar de todas as
polémicas, foram muito mais importantes para o concelho do que o padre Justino.
Intervieram publicamente, criaram um jornal, através do qual levaram o nome de
Melgaço a diversos países do planeta. O primeiro foi provedor da Santa Casa da Misericórdia
de Melgaço durante muitos anos, e arcipreste do concelho, e o segundo e
terceiro foram professores, jornalistas e escritores, com obra publicada.
E por
que não homenagear os professores universitários melgacenses? Sobretudo aqueles
que já têm uma obra considerável? De que estão à espera? O Professor Doutor
José Marques, nascido na freguesia de Rouças, é uma figura consensual. Para
quando uma homenagem digna do seu prestígio?
A
antiga Travessa da Rua Direita é chamada agora “Viela Pedro Pires”. Esse senhor
viveu na Idade Média e foi prior do mosteiro de Longos Vales, sito no termo de
Monção. Mandou erguer, à custa do tal mosteiro, parte das muralhas do castelo
de Melgaço, recebendo em troca consideráveis privilégios reais.
Afonso
Henriques, primeiro rei de Portugal, que deu foral a Melgaço, tornando-o
concelho, preocupando-se com o seu desenvolvimento, com a sua defesa, não será
mais importante do que o prior Pedro Pires?
E o
rei João I, que escorraçou os castelhanos do castelo, ou praça de guerra, que
pelejou duramente para o reaver, não será mais importante do que o prior de
Longos Vales ou do que a lendária Inês Negra, cujo nome foi inventado (salvo erro)
pelo Conde de Sabugosa? No seu livro “Neves de Antanho”, página 38 (Livraria
Bertrand, 3.ª edição) escreveu: «Era uma
mulher daquela região, a quem chamavam Inez Negra.»
E os naturais de Melgaço que combateram na
1.ª Grande Guerra, morrendo em França em 1917 e 1918 sob as balas das armas alemãs?
E os melgacenses (militares ou não) que ficaram feridos e morreram nas matas
africanas entre 1961 e 1974?
Espero que não sejam mal interpretadas as
minhas palavras. Eu apenas desejo que o nome daqueles conterrâneos (ou não, mas
ligados à nossa terra pelos seus feitos), honrados, e com mérito (pondo de lado
ideologias, credos e preconceitos, se possível) os quais trabalharam uma vida inteira
em prol do concelho, quer materialmente, como os políticos, quer na área da
cultura, como os escritores, pintores, artesãos, etc., sejam oficialmente
reconhecidos, tratados com dignidade, e que sirvam de exemplo aos atuais e
futuros habitantes de Melgaço. Devemos sentir orgulho neles, lembrá-los
constantemente, sobretudo nas escolas, estudar e enaltecer o muito ou pouco que
nos legaram.
Eu sei que existe o problema dos
critérios. O que é bom para uns pode não prestar para outros. Tudo se mede e
tudo se compara. Eu pauto-me pela obra. Quem não a tem não a pode exibir. E até
aqueles que a deixaram (grande ou pequena), essa pode não agradar a gregos e
troianos. Enfim: «cada cabeça, sua
sentença», como já diziam os nossos avoengos. Esperemos no entanto que um
dia se faça justiça.
Eu reconheço que o poder de decisão está
nas mãos dos políticos que se candidataram democraticamente às eleições e as
ganharam. São eles, durante o seu mandato, que decidem, que se responsabilizam
pelo cumprimento de tudo aquilo que prometeram durante as campanhas. Não quero,
nem posso, substituí-los, mas deixem-me ao menos desabafar e sugerir. E nunca
se esqueçam, aqueles que detêm o poder local, duma coisa: o concelho de Melgaço
não é da Câmara Municipal. Pelo contrário: a Câmara Municipal é que é de
Melgaço.
Há tempos
fui dar um passeio pelos arredores do Centro Histórico e no caminho dei de
caras com ruas novas: Rua da Caneja, Rua da Fonte, Rua do Mercado…! Só porque
houve outrora ali uma tosca caneja, vai de se lhe atribuir o nome! Se
seguíssemos esse paradigma, teríamos a Rua do Campo do Milho, a Rua do
Canastro, a Rua da Horta, a Rua do Muro, a Rua do Rego, etc. Quanto à Fonte,
esqueceram-se do tanque de lavar roupa. Aquela pequena obra do século XIX era
composta de fonte e tanque. Por outro lado, já tínhamos a Fonte da Vila. Eu
prefiro o nome de seres humanos. E mais: gostava de ver nas placas uma legenda,
elucidando o transeunte sobre aquela personalidade – quem foi, o que
fez...
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