Desenho de Rui Nunes
ROSTOS DA CIDADE
Cansados. Nos olhares ténues lembranças fulgentes. Esperam –
dias! Esperam noites de duvidoso prazer. Rostos, sem rosto! Sombras de seres
que vegetam e arrastam na vida a vida! Vegetarianos comendo carne humana: a
sua! Vejo os rostos nas filas intermináveis do autocarro; vejo-os nos mercados
e afins; nas feiras, nos cinemas e teatros; vejo-os, depois, a caminho da
sepultura: não mudaram! Voltam outros, e o ciclo cumpre-se e repete-se. Rostos
de rostos! Rostos desgostos. Máscaras sem máscara! Nada refletem. Tudo significam!
No rosto, dos rostos sem rosto, os olhos olhando para dentro de si – olhando
horizontes apenas esboçados; horizontes imaginados sem imaginação! Se alguém
quisesse ler nestes rostos inexpressivos só poderia ler: resignação! Rostos em
negativo de fotos jamais tiradas! Rostos macerados e sulcados por rios de
sofrimento. Rostos poluídos por ambientes degradantes e degradados! Rostos de
indiferença; rostos de iceberg; rostos paisagem árida; rostos de cera. // - Rostos
da cidade, rostos morte, túmulo, mármore, granito, olhai e vejam: os rostos do
campo; os rostos da vida (como aí o sangue circula); os rostos da natureza-mãe.
Ouvi e respondei: ao murmúrio das ondas, ao chilrear das avezinhas, ao eco
profundo das montanhas; à voz da vida; à voz da natureza!
Joaquim Rocha (14/11/1979)
Sem comentários:
Enviar um comentário