segunda-feira, 4 de maio de 2015



Desenho de Rui Nunes


ROSTOS DA CIDADE


    Cansados. Nos olhares ténues lembranças fulgentes. Esperam – dias! Esperam noites de duvidoso prazer. Rostos, sem rosto! Sombras de seres que vegetam e arrastam na vida a vida! Vegetarianos comendo carne humana: a sua! Vejo os rostos nas filas intermináveis do autocarro; vejo-os nos mercados e afins; nas feiras, nos cinemas e teatros; vejo-os, depois, a caminho da sepultura: não mudaram! Voltam outros, e o ciclo cumpre-se e repete-se. Rostos de rostos! Rostos desgostos. Máscaras sem máscara! Nada refletem. Tudo significam! No rosto, dos rostos sem rosto, os olhos olhando para dentro de si – olhando horizontes apenas esboçados; horizontes imaginados sem imaginação! Se alguém quisesse ler nestes rostos inexpressivos só poderia ler: resignação! Rostos em negativo de fotos jamais tiradas! Rostos macerados e sulcados por rios de sofrimento. Rostos poluídos por ambientes degradantes e degradados! Rostos de indiferença; rostos de iceberg; rostos paisagem árida; rostos de cera. // - Rostos da cidade, rostos morte, túmulo, mármore, granito, olhai e vejam: os rostos do campo; os rostos da vida (como aí o sangue circula); os rostos da natureza-mãe. Ouvi e respondei: ao murmúrio das ondas, ao chilrear das avezinhas, ao eco profundo das montanhas; à voz da vida; à voz da natureza!

                                                Joaquim Rocha (14/11/1979)  

Sem comentários:

Enviar um comentário