MELGAÇO E AS INVASÕES FRANCESAS
Por Augusto César Esteves
(continuação)...
O
curioso, porém, pode ler ainda estas linhagens na pedra por ele mandada colocar
no portão da sua quinta de Lapela. Em 14/3/1703 comprou a metade do Moinho
chamado de «Ponte Pedrinha.» Mas pouco depois, um ou dois meses andados
tão-somente, Frei Domingos Gomes de Abreu foi enviado pelo Conde de Atalaia,
Governador das Armas da Província do Minho, ao reino da Galiza «a certo negócio»
do serviço de el-rei. // Por razões hoje ignoradas, mas que é legítimo filiar
em questões da Guerra da Sucessão ao trono de Espanha, na qual el-rei D. Pedro
II se tinha envolvido em 1701, o Governador de Vigo prendeu este mensageiro do
Conde de Atalaia em sua casa e durante cinco dias o reteve nas minas do Castelo
do Crasto; dali passou-o para o Castelo de Santo António, na Corunha, e por
último para o Cárcere Real, a fim de lhe «darem questão de tormento».
Foi nestes aflitivos transes que o
familiar do Santo Ofício, lembrando-se dos inumeráveis milagres realizados
naquelas redondezas por Nossa Senhora da Pastoriza, a excelsa titular duma
pequena paróquia da província de Lugo, a invocou e lhe pediu amparo, prometendo
levantar-lhe uma capela na sua terra natal, no vistoso sítio do Coto da
Pedreira, se a Senhora da Pastoriza permitisse o seu regresso a casa dentro de
um ano. E como passados cinco meses e cinco dias foi degredado para fora dos
limites de Espanha por decreto especial, nunca mais esqueceu o seu voto e, se
mais cedo o não cumpriu, foi por seu espírito andar ocupado das operações da
Guerra da Sucessão, na altura desenroladas neste termo.
Com efeito, Frei Domingos Gomes de
Abreu, português de lei, patriota exaltado, militar brioso e aguerrido, nunca
permitiu aos galegos ofenderem-nos impunemente e, por isso, durante esta guerra
permaneceu sempre de ouvido à escuta, sempre pronto para fazer pagar caro aos
vizinhos da fronteira os tormentos que lhe infligiram. E caro foram eles pagos
uma e muitas vezes. // Certo dia, a 10/5/1704, quando ouviu nesta Vila o
primeiro rebate sineiro, que dava os galegos a pretenderem lançar ponte junto
da Barca Nova, no vizinho termo de Valadares, não perdeu tempo a reunir a sua
companhia; armou-se logo, montou a cavalo, arrastou consigo os criados da casa
e foi reconhecer o poder do inimigo. Animando todo o povo e especialmente os de
Valadares, que estavam presentes ao acto mavórtico carecidos de energia
belicosa, levou-os à defesa intransigente da passagem, resultando desta sua
atitude o inimigo tomar e queimar tão-somente algumas barcas postadas da sua
banda. // No ano seguinte Frei Domingos requereu para ser provido no posto de
Sargento-Mor das Ordenanças desta vila e termo, que não tinha ordenado ou
emolumento algum, mas só o honorífico, como alegou, mas foi indeferida a pretensão;
não, decerto, por carência dos necessários requisitos, mas, talvez, por ter
requerido findo o prazo marcado nos editais afixados a anunciar a vaga.
Após tudo isto, a 20/5/1706, quando o
inimigo intentou passar a esta província de Entre-Douro e Minho, D. Sancho de
Faro e Sousa, Mestre de Campo General e Comandante das Armas da Província, ordenou
ao Capitão-Mor deste termo, Pedro de Sousa Gama, mandasse duas companhias do
seu distrito guarnecer o posto de Cavaleiros e ali abrir as trincheiras de
antemão delineadas para impedirem o passo ao inimigo. Para este serviço uma das
companhias escolhidas por este militar foi a do Capitão Frei Domingos Gomes de
Abreu, que nesse tempo escavou cento e cinquenta braças de trincheiras e noutra
altura mais sessenta braças e o comandante apenas foi rendido quando foi
necessário acudir a outros pontos.
Em 1707 as suas energias não foram dadas
exclusivamente ao serviço militar. Em 3 de Março tomou posse do cargo de
vereador da Câmara e nele continuou durante alguns anos, tendo-se evidenciado
numa questão com o abade da Vila, reverendo João Dias dos Santos, retratado
algures em letra do Padre Bernardo de Araújo, como o que «folga bem de
meter-se aonde o não chamam.» // (continua)...
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