DICIONÁRIO ENCICLOPÉDICO DE MELGAÇO
Por Joaquim A. Rocha
22.ª - «Senhor Redactor: os
reparos ao adiantamento da hora, feitos no último número do “Correio” para
águas de rega são mais do que justos, se alguma coisa há mais justa do que a
própria justiça. Nós não regamos mais do que as hortas e, raro, os batatais,
porque o sol rútilo e bendito rega-nos e aquece-nos nos pendores e alcantis
destas serras amigas, destes vales, sem dúvida inclementes para outros, mas
belos e produtivos para nós. Domámo-los cultivando-os e fazendo de terrenos
sáfaros produtivos, como os meninos brincam e montam o cão velho da casa. Mas
as razões do “Correio” sugerem-nos ideias e supostos factos que
indubitavelmente se darão e altamente concorrerão para graves prejuízos que
urge providenciar às autoridades competentes. E porque estas, nas respectivas
freguesias, são as colectividades administrativas – nem sempre fruto de uma
selecção conscienciosa e quase sempre simples instrumentos – autómatos
consumados de um galopim (que ainda os há conquanto a lei os proíba), é
indispensável que autoridades superiores legislem e ordenem, a fim de que, quem
tem o absoluto dever de olhar pelos interesses dos povos e foi
inconscientemente eleito, não seja espoliador dos mesmos eleitores. Isto porque,
geralmente, nem os legisladores conhecem as colectividades administrativas, nem
os eleitores sabem de que são capazes! Vá com vista à nossa paróquia: um misto
de homens de peso, e médios, em medidas de massa, como me diz cá o garotito,
que frequenta a escola; mas todos democráticos de polpa – talvez, até, alguns
Afonsos, no nome. Pois, meu caro redactor: nem tugiram nem mugiram, até agora,
no que respeita à campanha de há meses, aqui encetada, a favor da Instrução –
único farol iluminante do nosso povo, único meio de progresso desta pobre, mas
querida terra. Levar a sério isto, pensar na gravidade de uma eleição, para que
os eleitos desconheçam o mais comezinho dos seus deveres, para que se limitem a
fazer sessões secretas, impem de membros duma colectividade administrativa,
enverguem uma opa vermelha e bastão de prata, em dia de incenso na igreja…
Nada! – isto não cheira senão a bafio de antigualhas cancerosas e pútridas;
isto é o supra sumo do desdém pelo que mais caro nos custa, pelo que mais
desejamos e pelo que menos temos, à falta de energias e de boas vontades. Note
mais a edilidade paroquial castreja: se não tinha envergadura precisa para
olhar pelos interesses mais palpitantes da freguesia que representa, declinasse
o encargo que lhe imprimiu o sufrágio. Era mais digno deste gesto e, talvez,
até um exemplo a seguirem edilidades de igual jaez. Claro, claríssimo como a
água filtrada pelas rochas da Anamão, somos amigos particulares dos edis
castrejos; mas não podemos nem devemos furtar-nos a verberar-lhes as suas
faltas que, creiam-no, são crimes. Relevem-nos este desabafo, mas trabalhem em
prol da nossa grandeza, sem o que os teremos maiores. Odeiem a inércia, que
nada vale, para só olharem os voos altaneiros das águias das nossas penedias,
que podem, sem perigo, afrontar as proximidades do sol. // A feira do
derradeiro foi regularmente concorrida, mas com poucas transacções e preços
médios. // À Santa Isabel faltaram-lhe as espanholitas dos nossos tempos de
rapaz, segundo nos informaram. Bem… como já não podemos dançar… Castro Laboreiro,
7/7/1916.»
«Administrador
do concelho: não sabemos com que
fundamento as “más-línguas” do Jornal de Melgaço se referem ao pedido de
demissão desta autoridade, querendo mostrar que encalhou com o célebre guarda-fiscal
de Castro Laboreiro. O que porém podemos garantir aos nossos leitores e ao
público é que aquela autoridade durante o tempo que tem exercido aquele lugar
tem estado sempre ao lado dos humildes, ao lado da Justiça e, principalmente ao
lado do povo de Castro, por ser este o que mais tem carecido do seu auxílio
para que justiça lhes fosse feita. E tanto assim que, sendo um dos maiores
desejos dos habitantes de Castro Laboreiro a mudança do posto de despacho, o senhor
Administrador conseguiu que este fosse mudado para Alcobaça, visto não o poder
ser para o lugar do Rodeiro, daquela freguesia. Abstemo-nos de falar na
“questão do célebre guarda”, porque poderia causar dissabores a quem não tem
culpa das idiotices do tão notável e histórico Jornal de Melgaço. O senhor
Administrador, com quem, por acaso, trocamos algumas palavras acerca daquele
eco, disse-nos, sorrindo, o seguinte: «estarei sempre ao lado do povo de Castro
Laboreiro e de todo o concelho, quer como autoridade, quer como homem, e em
qualquer parte onde me encontre. (…) Deixo a administração voluntariamente,
como sabe, mas com a convicção de que o povo de Castro Laboreiro e de todo o
concelho terá no jovem e talentoso advogado, Dr. António Augusto Durães,
ilustre chefe do Partido Republicano Português neste concelho, um defensor dos
seus direitos e um amigo sincero e leal com quem todos podem contar nas horas
de aflição e de perigo, que é quando se conhecem os verdadeiros amigos.» Ora
nós que conhecemos bem as qualidades de carácter, sinceridade e inteligência do
Dr. Durães, concordamos plenamente em que todas as informações daquele nosso
amigo serão cumpridas integralmente e estará sempre ao lado dos desprotegidos.
O senhor Administrador não fica, porque não quer» (Correio de Melgaço n.º 206,
de 9/7/1916).
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