domingo, 1 de janeiro de 2017

DICIONÁRIO ENCICLOPÉDICO DE MELGAÇO
 
Por Joaquim A. Rocha 





22.ª - «Senhor Redactor: os reparos ao adiantamento da hora, feitos no último número do “Correio” para águas de rega são mais do que justos, se alguma coisa há mais justa do que a própria justiça. Nós não regamos mais do que as hortas e, raro, os batatais, porque o sol rútilo e bendito rega-nos e aquece-nos nos pendores e alcantis destas serras amigas, destes vales, sem dúvida inclementes para outros, mas belos e produtivos para nós. Domámo-los cultivando-os e fazendo de terrenos sáfaros produtivos, como os meninos brincam e montam o cão velho da casa. Mas as razões do “Correio” sugerem-nos ideias e supostos factos que indubitavelmente se darão e altamente concorrerão para graves prejuízos que urge providenciar às autoridades competentes. E porque estas, nas respectivas freguesias, são as colectividades administrativas – nem sempre fruto de uma selecção conscienciosa e quase sempre simples instrumentos – autómatos consumados de um galopim (que ainda os há conquanto a lei os proíba), é indispensável que autoridades superiores legislem e ordenem, a fim de que, quem tem o absoluto dever de olhar pelos interesses dos povos e foi inconscientemente eleito, não seja espoliador dos mesmos eleitores. Isto porque, geralmente, nem os legisladores conhecem as colectividades administrativas, nem os eleitores sabem de que são capazes! Vá com vista à nossa paróquia: um misto de homens de peso, e médios, em medidas de massa, como me diz cá o garotito, que frequenta a escola; mas todos democráticos de polpa – talvez, até, alguns Afonsos, no nome. Pois, meu caro redactor: nem tugiram nem mugiram, até agora, no que respeita à campanha de há meses, aqui encetada, a favor da Instrução – único farol iluminante do nosso povo, único meio de progresso desta pobre, mas querida terra. Levar a sério isto, pensar na gravidade de uma eleição, para que os eleitos desconheçam o mais comezinho dos seus deveres, para que se limitem a fazer sessões secretas, impem de membros duma colectividade administrativa, enverguem uma opa vermelha e bastão de prata, em dia de incenso na igreja… Nada! – isto não cheira senão a bafio de antigualhas cancerosas e pútridas; isto é o supra sumo do desdém pelo que mais caro nos custa, pelo que mais desejamos e pelo que menos temos, à falta de energias e de boas vontades. Note mais a edilidade paroquial castreja: se não tinha envergadura precisa para olhar pelos interesses mais palpitantes da freguesia que representa, declinasse o encargo que lhe imprimiu o sufrágio. Era mais digno deste gesto e, talvez, até um exemplo a seguirem edilidades de igual jaez. Claro, claríssimo como a água filtrada pelas rochas da Anamão, somos amigos particulares dos edis castrejos; mas não podemos nem devemos furtar-nos a verberar-lhes as suas faltas que, creiam-no, são crimes. Relevem-nos este desabafo, mas trabalhem em prol da nossa grandeza, sem o que os teremos maiores. Odeiem a inércia, que nada vale, para só olharem os voos altaneiros das águias das nossas penedias, que podem, sem perigo, afrontar as proximidades do sol. // A feira do derradeiro foi regularmente concorrida, mas com poucas transacções e preços médios. // À Santa Isabel faltaram-lhe as espanholitas dos nossos tempos de rapaz, segundo nos informaram. Bem… como já não podemos dançar… Castro Laboreiro, 7/7/1916.»  
   
 «Administrador do concelho: não sabemos com que fundamento as “más-línguas” do Jornal de Melgaço se referem ao pedido de demissão desta autoridade, querendo mostrar que encalhou com o célebre guarda-fiscal de Castro Laboreiro. O que porém podemos garantir aos nossos leitores e ao público é que aquela autoridade durante o tempo que tem exercido aquele lugar tem estado sempre ao lado dos humildes, ao lado da Justiça e, principalmente ao lado do povo de Castro, por ser este o que mais tem carecido do seu auxílio para que justiça lhes fosse feita. E tanto assim que, sendo um dos maiores desejos dos habitantes de Castro Laboreiro a mudança do posto de despacho, o senhor Administrador conseguiu que este fosse mudado para Alcobaça, visto não o poder ser para o lugar do Rodeiro, daquela freguesia. Abstemo-nos de falar na “questão do célebre guarda”, porque poderia causar dissabores a quem não tem culpa das idiotices do tão notável e histórico Jornal de Melgaço. O senhor Administrador, com quem, por acaso, trocamos algumas palavras acerca daquele eco, disse-nos, sorrindo, o seguinte: «estarei sempre ao lado do povo de Castro Laboreiro e de todo o concelho, quer como autoridade, quer como homem, e em qualquer parte onde me encontre. (…) Deixo a administração voluntariamente, como sabe, mas com a convicção de que o povo de Castro Laboreiro e de todo o concelho terá no jovem e talentoso advogado, Dr. António Augusto Durães, ilustre chefe do Partido Republicano Português neste concelho, um defensor dos seus direitos e um amigo sincero e leal com quem todos podem contar nas horas de aflição e de perigo, que é quando se conhecem os verdadeiros amigos.» Ora nós que conhecemos bem as qualidades de carácter, sinceridade e inteligência do Dr. Durães, concordamos plenamente em que todas as informações daquele nosso amigo serão cumpridas integralmente e estará sempre ao lado dos desprotegidos. O senhor Administrador não fica, porque não quer» (Correio de Melgaço n.º 206, de 9/7/1916).      

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