quinta-feira, 25 de agosto de 2016

DICIONÁRIO ENCICLOPÉDICO DE MELGAÇO


Por Joaquim A. Rocha






cartas de um castrejo
 
 
19.ª - «Senhor Redactor: o santo precursor, que os cristãos vão festejar em breves dias – os graves – assistindo aos exercícios litúrgicos, e as cachopas e os enamorados, cantando e dançando em volta das fogueiras, e roubando cravos dos minúsculos canteiros, para se enfeitarem, num momento de estupefacção e profundo desalento, clamou: «eu sou a voz que clama no deserto.» Mas as suas profecias realizaram-se aos olhos dos crentes; mas Ele viu e batizou o que anunciava. Nós, que temos uma fé viva na causa – também santa e justa – que advogamos, nós que prometemos e cumpriremos fielmente o sagrado dever de pugnar pelo engrandecimento progressivo da nossa querida terra, engrandecimento que só pode firmar-se na disseminação da instrução, pela criação de novas escolas e reforma radical da existente – única, e nas mais vergonhosas condições higiénicas e pedagógicas para população escolar superior a trezentas crianças! Não desesperamos. Isto faria perder a paciência ao beneditino mais paciente, como ao artista chinês que tentasse fazer de um ovo um palacete habitável ou que consentisse que lhe cortassem o rabicho sem protesto. Assistimos à inércia da Paróquia, à incúria da Câmara, não sabemos se ao desprezo do Ministro, que já, decerto, conhece das nossas necessidades inadiáveis – reclamadas e a reclamar, e não perdemos a paciência nem a fé e estamos certos de que, à força de persistência e de boa vontade – que não nos falham – conseguiremos a consecução das nossas aspirações, tão justas como desejadas. E, com esta convicção inabalável, ainda não exclamos como o São João dos namorados: «eu sou a voz que clama no deserto.» Castro Laboreiro, 16/6/1916.»

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