DICIONÁRIO ENCICLOPÉDICO DE MELGAÇO
Por Joaquim A. Rocha
cartas de um castrejo
19.ª - «Senhor
Redactor: o santo precursor, que os
cristãos vão festejar em breves dias – os graves – assistindo aos exercícios
litúrgicos, e as cachopas e os enamorados, cantando e dançando em volta das
fogueiras, e roubando cravos dos minúsculos canteiros, para se enfeitarem, num
momento de estupefacção e profundo desalento, clamou: «eu sou a voz que clama
no deserto.» Mas as suas profecias realizaram-se aos olhos dos crentes; mas Ele
viu e batizou o que anunciava. Nós, que temos uma fé viva na causa – também
santa e justa – que advogamos, nós que prometemos e cumpriremos fielmente o
sagrado dever de pugnar pelo engrandecimento progressivo da nossa querida
terra, engrandecimento que só pode firmar-se na disseminação da instrução, pela
criação de novas escolas e reforma radical da existente – única, e nas mais
vergonhosas condições higiénicas e pedagógicas para população escolar superior
a trezentas crianças! Não desesperamos. Isto faria perder a paciência ao
beneditino mais paciente, como ao artista chinês que tentasse fazer de um ovo um
palacete habitável ou que consentisse que lhe cortassem o rabicho sem protesto.
Assistimos à inércia da Paróquia, à incúria da Câmara, não sabemos se ao
desprezo do Ministro, que já, decerto, conhece das nossas necessidades
inadiáveis – reclamadas e a reclamar, e não perdemos a paciência nem a fé e
estamos certos de que, à força de persistência e de boa vontade – que não nos
falham – conseguiremos a consecução das nossas aspirações, tão justas como
desejadas. E, com esta convicção inabalável, ainda não exclamos como o São João
dos namorados: «eu sou a voz que clama no deserto.» Castro Laboreiro,
16/6/1916.»
Sem comentários:
Enviar um comentário