UMA MÁ NOTÍCIA
Mais um amigo que parte. Era um amigo, sem
dúvida, porém desde os dezassete, dezoito anos, que não convivíamos. A razão de
ter sido assim é simples de explicar: na década de sessenta do século XX rebentou
a guerra colonial; ele, certamente com receio de ser enviado para África e
também com o fito de melhorar a sua vida financeira, emigrou para França. Eu,
por não ter conseguido o dinheiro para pagar aos passadores, tive de ir para a
chamada tropa, exército, onde cumpri três anos, dois dos quais nas matas da
Guiné-Bissau. Lembro-me que quando fui à inspeção militar, em Melgaço, sede do concelho,
éramos meia dúzia; os restantes tinham emigrado! Ninguém espere que eu diga que
nós fomos o heróis e eles os cobardes; jamais direi tal barbaridade. A guerra
colonial nunca deveria ter existido. Fomos empurrados para um conflito
inglório, sem fim à vista, por causa de um ditador chamado Salazar, cujo
objetivo era eternizar o seu império, apesar de ter pés de barro. O maldito,
que nem sequer cumprira o serviço militar, um sacerdote frustrado, iniciou uma
tremenda guerra, na qual morreram e ficaram feridos milhares de jovens
portugueses. Bastava sentar-se à mesa com os chefes africanos, aceitar algumas
das suas reivindicações, e com toda a certeza evitaria o conflito. // O meu
amigo António Esteves fez bem em ter emigrado. Aprendeu imenso com os
franceses, casou, teve esposa e filhos, viveu a sua vida com dignidade. //
António: lamento a tua morte, não por ter sido curta, mas por teres sofrido
tanto. Como não professo nenhuma religião, não posso rezar à tua alma, se é que
ela existe. Lembrar-me-ei de ti durante algum tempo, sobretudo daqueles
momentos quando jogávamos futebol na Avenida das Tílias e no Monte de Prado: os
da Vila contra os das Carvalhiças. Depois desapareceste, tu e tantos outros, e
ficamos nós, sozinhos, sem rapazes para formar equipa. A vida é assim mesmo:
nascemos para um dia partirmos para uma viagem sem regresso; uns mais cedo,
outros mais tarde. «Ninguém foge ao seu destino.» Algumas pessoas sentirão
saudades nossas, umas lágrimas sentidas, mas isso, salvo raras exceções, será
sol de pouca dura. Ninguém resiste ao esquecimento. // Gostaria muito de
mostrar aos meus leitores a tua fotografia, mas não a possuo, quase que já nem
lembro do teu rosto; o tempo, esse relógio implacável, cruel, inventado pelo
ser humano, tudo faz esquecer.
NOTA: acho estranho que a Câmara Municipal de Melgaço nunca tenha pensado em erguer um pequeno monumento em granito, ou noutro material qualquer, aos emigrantes melgacenses. Eu sei que o dinheiro é escasso, mas talvez se pudesse poupar, para esse fim, uns quantos euros gastos anualmente nas festas.
Encomendaram há anos uma estátua, a um escultor conhecido, por bom preço, segundo consta, a fim de homenagear a lendária Inês Negra. Embora eu reconheça que de certa maneira o dinheiro não foi mal gasto, penso que seria melhor para o concelho homenagear figuras melgacenses que muito contribuíram para o prestígio da terra. Dou apenas um exemplo: mestre Morais.
NOTA: acho estranho que a Câmara Municipal de Melgaço nunca tenha pensado em erguer um pequeno monumento em granito, ou noutro material qualquer, aos emigrantes melgacenses. Eu sei que o dinheiro é escasso, mas talvez se pudesse poupar, para esse fim, uns quantos euros gastos anualmente nas festas.
Encomendaram há anos uma estátua, a um escultor conhecido, por bom preço, segundo consta, a fim de homenagear a lendária Inês Negra. Embora eu reconheça que de certa maneira o dinheiro não foi mal gasto, penso que seria melhor para o concelho homenagear figuras melgacenses que muito contribuíram para o prestígio da terra. Dou apenas um exemplo: mestre Morais.
ESTEVES,
António (…) Filho de António Augusto Esteves e de Irene Nabeiro Pereira. Nasceu
na Vila de Melgaço, a --/--/1944. // Depois da quarta classe iniciou a
aprendizagem de pedreiro, com seu pai, um verdadeiro mestre. // Antes da tropa
emigrou para a terra dos franceses. // Casou a --/--/1972 na igreja de
Colombes, França, com Maria de Fátima Nunes, natural de Moncorvo, Portugal,
também emigrante. Padrinhos da boda: João Octávio Rodrigues e sua esposa,
Madalena Nabeiro Pereira, tios do noivo. // A sua mulher morreu com quarenta e
um anos de idade, em Agosto de 1993, vítima de um desastre de viação, em
Friestas, na estrada Melgaço a Monção, e foi sepultada no cemitério da Vila de
Melgaço. // Ele, logo que pôde, voltou para a sua terra natal. // Em 2019
encontrava-se internado no Instituto de Oncologia do Porto. // Morreu a
25/11/2019 (a confirmar). // Pai de Gabriel e de David, a residirem em França, a
quem envio os meus sentidos pêsames.
Joaquim A.Rocha
Sem comentários:
Enviar um comentário