POEMAS DO VENTO
Por Joaquim A. Rocha
desenho de Rui Nunes |
FIM E PRINCÍPIO
Já ao longe vislumbro o teu exército.
O malvado, qual fera, vem atacar-me!
Os infantes apontam-me as suas
metralhadoras de cano negro;
são portadoras da fria morte!
Os mercenários avançam como robots,
Máquinas preparadas para matar!
Os teus aviões preparam-se para me bombardear.
Bombas gigantes estão a ser lançadas do espaço!
Os «drones» já descobriram o meu frágil corpo.
Os teus navios, vorazes monstros de guerra,
começam a vomitar a sua cólera incontida;
e as árvores, minhas protetoras,
caem como bebés: desamparadas e impotentes!
O teu juízo está feito. A tua sentença foi lida:
condenação à fogueira! A Santa Inquisição ordena.
Devo morrer, desaparecer deste mundo.
Devo mergulhar no esquecimento
como coisa, ou objeto coisificado!
As primeiras chamas atingem-me.
As faúlhas elevam-se no espaço
As bombas começam a explodir.
O meu pobre corpo já não existe.
Está destroçado. Está reduzido
a pequenas partículas que as botas dos infantes
enterram na areia do deserto.
O oásis desapareceu. A vida pereceu.
Sobreveio-lhe a cruel lembrança…
O silêncio! Mas eis que a memória prevalece.
Existem as imagens retidas no armazém
do Tempo.
Agora já não mais
poderão destruir-me!
Nem com blindados, nem com balas mortíferas,
nem com gases
venenosos,
nem com a indiferença dos deuses.
Agora, reduzido a fragmentos, a pó, eu já poderei viver!
Ninguém pode afastar-me, sou apenas sombra.
Não poderão fragmentar-me segunda vez!
O poderoso exército já nada
pode contra mim.
Não suscitará ciúmes, nem ódio,
a minha sombra invisível.
As horas supremas de prazer, serão esquecidas,
O meu não corpo pairará no espaço como um balão que fugiu
das mãos de uma criança!
Não sentirei medo, jamais terei esperanças.
Os meus sentimentos dissipar-se-ão no meio do infindo
universo.
Visitarei galáxias, sóis escaldantes, planetas desabitados.
Saciarei a minha sede de ser na bruma.
Em todas as aflições, se surgirem,
Ultrapassá-las-ei com o esquecimento.
Superarei a dor se regressar ao fingido corpo.
Eu sou uma ideia!
Eu sou uma não existência!
Ninguém poderá, doravante, ignorar-me!
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