domingo, 3 de abril de 2016

OS NOVOS LUSÍADAS
(tentativa de continuação de «Os Lusíadas» de Camões) 

Por Joaquim A. Rocha


27

Índio não aceita ser submetido,
Esconde-se nas árvores, no mato;
Prefere andar no matagal fugido,
Como coelho selvagem, ou rato;
Até ser morto, gravemente f’rido,
Viver as sete vidas como o gato.
Do branco rejeita qualquer lição,
A cruz de Cristo, hóstia ou pão!

28

O europeu, mui astuto, esperto,
Atrai a si o indígena puro,
Diz-lhe que a fouce anda por perto,
Estar junto de si é mais seguro;
E o inocente, de peito aberto,
 Cérebro limpo, mas um pouco duro,
Aproxima-se do hábil gatuno
Vencendo o parvo por oportuno.

29

Tudo rouba, o cínico estrangeiro:
As terras, costumes, a liberdade;
Só não lhe rouba casas e dinheiro
Por eles estarem noutra Idade.
Apesar de ser tudo verdadeiro
Há quem diga que isto é falsidade.
É bom que a história se refaça
Para a gente se rir desta chalaça.

30

E ainda que digam que sou cruel,
Que transporto o mal no meu fraco peito,
Que tenho nos olhos peçonha e fel,
E que às crónicas perco o respeito…
Eu pergunto: quem destruiu Babel,
Quem desviou aos rios o seu leito?
Porventura Moisés era assaz mau
Por segurar nos braços grosso pau?

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