domingo, 22 de setembro de 2019

ESCRITOS SOBRE MELGAÇO
 
Por Joaquim A. Rocha





SALPICOS

 

     Para um número razoável de leitores de “A Voz de Melgaço” a leitura deste artigo nada lhes diz porque ainda não leram o livro sobre o qual vou tecer comentários; no entanto, tenho esperança de que um dia o venham a ler. Por outro lado, espero que haja uma segunda edição, e nessa altura estas contribuições poderão ser levadas em conta.

     Como há tempos disse, os trabalhos do “Mário” recentemente publicados, enfermam de algumas imprecisões. Prometi destacá-las para que leitores menos atentos não as considerem como verdades imutáveis. Vejamos: na página 41 diz-se que o vocábulo Cristóval se compõe de duas palavras - Christos (hebraica) e phoros (grega); acontece, porém, que o hebraico não possuía a palavra Christos, mas sim maxiah, que quer dizer messias, o ungido. Passou para o latim com a forma Messias. Cristo vem do grego «kristós».

     Na página 81 o “Mário” diz desconhecer o nome da herbácea que originou o topónimo Merelhe, Merão ou Meruje. Trata-se de uma erva anual, da família das cariofiláceas, chamada morugem.

     Trancoso, páginas 83 e 84. Quando escreve: «… documentos bastante posteriores àquela data…», quer dizer precisamente o contrário, isto é - «documentos anteriores àquela data». E já agora, Trancoso, quanto a mim, deve significar rio com muitos troncos (árvores), dificultando a circulação pela sua margem (ou apelido de família). Doma poderá vir do latim hebdomas (semana) e poderia querer dizer que no período em que a água é pouco abundante ela seria repartida semanalmente para regar os campos pelos diferentes lavradores de um lado e de outro do rio. São apenas especulações, pois carecem de uma base científica.       

     Na página 99 afirma que o 1.º periódico publicado na nossa terra foi o “Jornal de Melgaço”, sendo seu fundador Duarte Augusto de Magalhães. Não é assim: o primeiro jornal a aparecer no concelho foi “O Melgacense”, a 6/11/1887, tendo como administrador José Cândido Gomes de Abreu e seu redator Aníbal de Vasconcelos Passos. O livro “Na Terra de Inês Negra” informa-nos de que ele acabou a 18/10/1888. O Jornal de Melgaço começou a ser publicado a 1/12/1893 e acabou no número 1316, de 31/12/1920.

     Na página 107 surgem-nos duas incorreções. Primeira: José Maria Alves (Zinona) não era neto, como lá está escrito, de José Maria Lourenço e de Josefa Antónia Gonçalves. Seus avós maternos foram Manuel José Lourenço e Maria Teresa da Silva, moradores na Rua do Rio do Porto, freguesia de Rouças. Por conseguinte, não era primo co-irmão de sua mulher Belmira dos Prazeres Pires. Segunda: Manuel José Alves, conhecido por Nené, falecido na vila a 23/12/1924, não era cunhado do “Zinona”, mas sim seu irmão. Não pronunciava corretamente as palavras e um dia esforçando-se por pronunciar o vocábulo bacalhau disse qualquer coisa parecida com balaca e assim ficaram com essa alcunha as sobrinhas Maria Leonor e Leonídia Augusta! O ir a Braga visitar o Sameiro ou o Bom Jesus e regressar a pé não me admira nada, porque ainda hoje vão milhares de peregrinos a pé a Fátima, é uma questão de fé. E nós, não íamos à Peneda a pé? Além disso, o automóvel deu entrada em Portugal nos finais do século XIX e nessa altura já o “Nené” tinha vinte e tal anos de idade. Até ao século XIX e primeiras décadas do século XX as pernas é que levavam as pessoas a todo o lado, o cavalo e a carruagem custavam dinheiro. Em nossos dias até para tomar um café a cinquenta metros de distância se utiliza o pó-pó!   

     Ao longo do texto aparece-nos a palavra «acerbo», que significa acre, áspero. Claro que é lapso. A palavra correta é acervo (montão, abundância…), por vezes utilizada como património. «Refeiro», página 125, está por «referido». «Porpurado» coscubilheiro», página 131, devem ler-se «purpurado» e «coscuvilheiro». «Por ao fresco», página 137, deve ler-se «pôr ao fresco». «Descriminadas», página 131, está por «discriminadas». Descriminar significa tirar a culpa, inocentar; discriminar quer dizer diferenciar, distinguir, separar. «Comulou», página 160, está por «cumulou».

     Nas «Efemérides», página 159, o “Mário” começa por nos dizer que o nosso primeiro rei concedeu foral a Melgaço no ano de 1181. Lê-se em «Melgaço, Sentinela do Alto Minho, 1.ª parte, das origens ao liberalismo», página 5, de Augusto César Esteves: «mas conforme informou em 1949, e num quinzenário local, o reverendo padre Manuel António Bernardo, a este foral é atribuída a data de 1183 pelo senhor Dr. Rui Pinto de Azevedo, da Academia da História (…) Deve, pois, estar certa a data por ele indicada, porquanto Alexandre Herculano não verificou a cronologia dos bispos confirmantes do foral, e como sobre a mesma não incidiu a sua crítica, não reparou em Martinus, bispo de Coimbra, e Pelagius, eleito de Évora, só nesse ano de 1183 aparecerem assim qualificados em documentos portugueses…»      

     Na página 174 verifica-se uma repetição. O texto «Em 25 de Junho 1666…» já se encontra na página anterior.

     Outro lapso encontra-se na página 201. Onde se lê «4 de Março de 1910» devia ler-se «4 de Março de 1900», pois a mãe do “Mário” não o deu à luz com treze anos de idade, mas sim com vinte e três anos. Para confirmar o que digo, baseio-me na data de nascimento do pai do “Mário”, Luís Cândido Soares: 15/4/1885; a 4/3/1900 tinha cerca de quinze anos de idade.

     O “Mário” informa-nos nas páginas 231 e 232 que Hermenegildo José Solheiro, nascido em 1837, exerceu os cargos de juiz substituto, vereador, e presidente do município. Não estará a confundi-lo com seu filho Hermenegildo José, que foi de facto presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Melgaço de 1926 a 1931?

     Para terminar, e olhando para a página 292, outro reparo: Raul Ferreira Cardoso não foi casado com Generosa Miquelina Barreiros, porque essa senhora era a sua mãe! Casou, isso sim, com Maria Alzira da Costa Velho, uma empresária que administrou o seu restaurante com grande eficiência durante muitos anos e criou seus sete filhos: Generosa, Fátima, Lurdes, José, Aurélio, Raul e João, com dignidade e bem-estar, numa altura em que a miséria rondava a maior parte das casas melgacenses.

     Não encontrei no livro mais falhas relevantes; claro que vários topónimos carecem de estudo aprofundado, mas isso já será matéria para outra dissertação.

 

Artigo publicado em A Voz de Melgaço n.º 1066, de 15/2/1997.
 
 
 
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Preço: 10 euros.

 





 




 



 





 




 






 





 







 






 








 







 
 
 
 
 
 
 
 
 

 

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