segunda-feira, 13 de abril de 2015

MELGAÇO E AS INVASÕES FRANCESAS

                                                                        Por Augusto César Esteves

                                   Os Conjurados (continuação)

     Quando, em meados de Julho de 1666, D. Baltazar de Roxas Pantoja, Governador das Armas de Espanha, com os melhores soldados do exército de Flandres, passou junto a Lapela por uma ponte de barcas para ocupar o Entre-Douro e Minho, aquartelou as suas tropas em Cortes, entre Monção e aquele castelo.
          Quase no fim do mês, deixando para trás a freguesia de Moreira, foi acampar junto dum afluente do Vez, nos montes de Pereira, e depois em Aboim das Choças, donde foi natural Frei João de Nossa Senhora da Peneda, no século João António de Brito Pereira. E das Choças para Giela, junto à vila dos Arcos de Valdevez, e daqui para a terra do Guardião do Convento das Carvalhiças, encontrando sempre barrados pelo nosso exército os caminhos para Valença, Ponte de Lima ou Braga, acabou por, em meados de Outubro daquele ano, se aproximar do rio Minho e ocupar os montes de Lordelo, terras de Monção, donde ameaçava Melgaço. O conde de Prado, atento sempre aos menores movimentos de Pantoja, mandou logo segurar a nossa terra, enviando-lhe um comboio de munições e abastecimentos, que tendo sido atacado no caminho por forças do Governador das Armas de Espanha, foi completamente livre e posto a salvo pelo destacamento do nosso compatriota Matias de Sousa e Castro, fundador do vínculo do Pombal, depois de renhidas pelejas, das quais este saiu ferido numa das mãos. Pouco depois baixou do Lordelo à ribeira o grande exército espanhol e foi aquartelar-se, para passar o inverno, na freguesia de Barbeita, entre Monção e o forte levantado na foz do rio Mouro.
          O Governador das Armas espanholas, Pantoja, nos princípios de Novembro pensou em ocupar Melgaço e, por isso, mandou fazer o seu reconhecimento por uma forte unidade de exploração. A guarnição teve conhecimento disso e sob a direcção e comando de Diogo de Sousa e Castro, capitão-mor e senhor da Casa das Várzeas, preparou-lhe uma emboscada, saindo, gentilmente, a recebê-la a meio caminho.
          Incorporado nesta força foi Domingos Gomes de Abreu, sem divisas de oficial, e de tal forma foram apresentados os cumprimentos, tão amistoso foi o abraço trocado, que o Conde da Ericeira escreveu no tomo IV da História de Portugal Restaurado:

   «...porém, os exploradores foram tão mal hospedados da guarnição, que não voltaram a inquietá-la

          Destemido mas prudente, corajoso mas sereno, Domingos Gomes de Abreu tinha sido o homem escolhido pelo Governador da Praça para prender Ramon Vallasquez, havido como traidor à Coroa Portuguesa e, com risco da vida, no ano anterior de 1661, um pouco acima daquele forte levantado pelos espanhóis junto ao Mouro, em vão atravessou o rio a nado para fazer a referida captura. // Naquele falado ano de 1662 bateu-se também com o inimigo no lugar de Valadares e nuns paços vizinhos do rio de S. Lourenço. Nesta última façanha, ali pelas proximidades de Mourentão, atravessou outra vez o rio Minho e já na Galiza, perseguindo-o por entre penhascos até o render, aí prendeu o capitão João Esteves, outro traidor a Portugal. O seu brio, porém, andava ferido com as proezas de Ramon Vallasquez; e por isso, no ano seguinte (para o colher às mãos), fez-lhe uma emboscada junto daquele forte e sendo o primeiro a avistá-lo, sobre ele correu até ao rio Minho, em cujas águas Vallasquez afogou. Em seguida foi à Galiza, ao lugar de Padrenda, tomar língua de uma tropa de cavalos, conseguindo trazer consigo três soldados com montadas e armas e, depois, ao lugar de Queirão, a cujo saque assistiu e onde no ano de 1664 pelejou valentemente também.
          O avô fora assim. Combatera. O pai seguiu-lhe os passos, mas como bom discípulo, ultrapassou-o. Domingos Gomes de Abreu Coelho de Novais, nasceu em Melgaço, numa das duas casas sitas em frente da fachada da igreja da Misericórdia, em 21/1/1668, e seguiu a carreira militar, falecendo no posto de capitão de uma companhia de ordenanças, do terço do capitão-mor Pedro de Sousa Gama, fundador do Morgado da Serra. Com vinte e quatro anos, a 8/2/1692, foi admitido irmão da Confraria das Almas desta vila e com perto de trinta, devido aos serviços prestados a Sua Majestade pelo pai, recebeu o padrão do Hábito de Cristo, com 30$000 réis de tença, paga pela verba do pescado, salvo erro em Viana Foz do Lima. Fez-se armar cavaleiro desta Ordem a 31 de Dezembro do mesmo ano, na igreja de Nossa Senhora da Conceição em Lisboa, por Frei Gastão José da Câmara Coutinho, comendador da mesma Ordem, sendo testemunhas Frei Vicente Huette Soto Mayor e Frei Estevão Pereira Bacelar e professou no ano seguinte, a nove de Fevereiro, no Convento de Tomar, nas mãos de Frei Fernando de Moraes, superior do referido Convento, renunciando primeiro o ano e dia do seu noviciado e aprovação. Familiar do Santo Ofício, cujos privilégios especiais concedidos aos mais antigos ele chegou a gozar, por três anos exerceu o cargo de Feitor Geral das Alfândegas da Província de Entre Douro e Minho, tocantes aos portos secos, molhados e vedados.
          Em meados de Maio de 1701 já a sua carta de certidão de armas, fidalguia & nobreza estava registada num livro da Câmara de Melgaço; mas do seu conteúdo, hoje conhecido por outra fonte, extracto apenas esta passagem:

   «…a saber um escudo esquartelado posto ao balom ([1]); primeiro quartel as armas dos Abreu que são em campo vermelho cinco cotos de asas de águias de ouro postas em sautor; em o segundo as armas dos Coelho, que são: em campo de ouro um leão de púrpura, rompente, e armado de vermelho, faixado de três faixas enxaquetadas de ouro, e azul de uma orla de azul carregada de sete coelhos de prata, malhados de preto: em o terceiro as armas dos Novaes, que são em campo azul cinco novelos de prata postos em aspa: em o quarto as armas dos Gomes que são em campo de prata três cabeças de negro de sua cor com arrecadas de ouro na orelha, e nariz e um colar do mesmo no pescoço, elmo de prata aberto guarnecido de ouro, paquife dos metais, e cores das armas, por timbre um dos cotos das asas das armas dos Abreu, e por diferença meia brica de prata com um trifólio verde por lhe pertencer




[1]  Em francês Au balon — trata-se do escudo inclinado à esquerda.

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