sexta-feira, 3 de abril de 2015

CARTAS DE CASTRO LABOREIRO 



2.ª - «Senhor Redactor: foi-nos tão grata a publicação generosa da nossa primeira carta, em que buscávamos defender este bom povo de tantos e tão perniciosos inimigos que (…) lhe rogamos paciência para nos ser mais uma vez arauto, forte e sonoro, das nossas infelicidades e reveses, para que o mundo saiba o quanto nesta terra, que adoramos, como mãe carinhosa, e outros acoimariam de madrasta, se sofre e se há calado. Hoje, estamos dispostos a fazer conhecidos os nossos males; e tanto, tanto, até que – aqueles a quem compete minorá-los – nos oiçam. Iremos longe, mas como é agora a época do pagamento das contribuições e vemos que faltam no rebanho muitas das ovelhas, perguntamos: Fulano? Sicrano? Beltrano? Foram pagar a décima. Não voltaram?! Fulano já está por lá há dois dias; sicrano… foi trasanteontem; e beltrano encontrámo-lo no Vila Verde (pensão), descoroçoado e triste, porque se lhe vai minguando o dinheiro e não sabe se lhe chegará, após as despesas, para pagar a contribuição! Ora isto é um horror. Lembramos, pois, ao Tesoureiro de Finanças um alvitre, a que Sua Ex.ª atenderá, pois, de viso, nas suas excursões cinegéticas, conhece as nossas circunstâncias. Para que nós, desprotegidos da sorte e, até, da natureza, para que estes homens e mulheres, que deixam os seus lares, para irem concorrer com o estipêndio lançado pelo Estado (…) possam voltar às suas casas, no mesmo dia, seria justo e equitativo que, como esta freguesia é muito populosa e a mais distante da sede do concelho, a que mais trabalha e a que menos tem, mesmo em consideração (salvo em tempo de eleições), se lhes marcassem dias próprios e, por lugares, conforme a população de cada um, e que nesses dias, sem consideração por alguém (isto é, sem privilegiar ninguém), os determinados fossem acender o lume à sua lareira, agasalhar os filhinhos e olhar pela vida!...Caminhos impraticáveis, clima frigidíssimo e sangrias duplas na bolsa magra – quase esquelética, não pode nem deve ser. Sua Ex.ª, que alia a uma bela alma os mais humanitários sentimentos, ouvirá o nosso justo apelo e remediará de futuro, com o que conquistará o nosso eterno reconhecimento. Creia-o, porque é sempre grato.» (Correio de Melgaço n.º 185, de 6/2/1916).   

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