POEMAS DO VENTO
Por Joaquim A. Rocha
// continuação de 25/02/2024.
PERDIDA EM TEUS SONHOS
Aqui vieste um dia,
não sei se em romaria,
se perdida em teus sonhos;
em pesadelos medonhos
eu vivo o dia a dia.
Talvez seja fantasia…
talvez sejam sonhos meus;
mas se tiver de sofrer,
sofrerei nos braços teus
até ao dia em que morrer.
E se tiver de escolher,
escolherei livremente,
vá-se o passado, o presente,
venha o futuro infeliz:
sonho triste, a alma o diz!
VIDA SOMBRIA
Vivo em fortes anseios,
e são tantos os receios
de teu carinho perder;
voo por sobre as nuvens,
procurando na solidão
remédio para esta ilusão,
pra não viver por viver!
Antes de te conhecer,
jamais podia prever
este sofrimento atroz;
agora, a minha vida,
é como casca de noz
boiando no mar, perdida!
DESPEDIDA
Antes de embora te ires
olha para mim docemente;
será o melhor presente
que a tua alma me dará.
Mesmo que após faças rir,
contando a tua estória,
não apagarás a glória
ao teres olhado pra mim!
Sonho belo que hei sonhado,
foi um momento que se foi;
é ferida que sempre dói,
um sofrer não terminado!
Leva em tua rude memória
Minha efémera vitória,
coisa pra ti sem valor;
deste-me aquilo que queria,
um olhar de fantasia,
uma pitada de amor!
ANSEIO LONGO
Toquei do meu país os dois extremos:
Melgaço lindo e belo Portimão;
alcançando assim um bem supremo:
anseio longo de meu coração.
Antigo e justo desejo,
finalmente conseguido;
o Algarve agora eu vejo,
o Minho já o hei visto.
1971
O MESMO SANGUE
Portugueses, do tempo de Afonso Henriques,
que montados em vossos cavalos
de todo o inimigo vos ristes…
Também nós, vossos sucessores,
diremos ao mundo, e seus senhores,
que somos filhos dignos de vós…
e tudo faremos para merecer
os dotes que nos deixastes;
lutaremos a valer, até força já não ter;
do mundo inteiro não teremos medo,
seremos gigantes destemidos,
homens fortes, aguerridos,
a pátria nunca iremos esquecer!
ESTRADA DA VIDA
Estrada da desventura…
quanto custas a percorrer;
jamais tu darás ventura
a quem não te souber vencer.
Percorri eu essa estrada,
ainda a percorro lentamente;
minha vida está fadada
para a vencer certamente!
Estrada do desespero,
estrada da esperança,
estrada do sofrimento,
estrada da insegurança.
Vences os fracos e os fortes,
os bons… esses nem tentes;
podes dar-lhes mil mortes…
combatê-los em mil frentes!
E a estrada vai chegando
ao seu fim, ao seu termo;
e os corpos definhando,
e os espíritos caminhando
para o seu longínquo ermo!
1968/1970
PASSADO MORTO
Céu azul, sem nuvens, límpido.
Enches o meu coração
de alegria desmedida;
tu fazes da minha vida
uma onda de ilusão.
Não quero viver passado,
já sou alegre, feliz;
pra trás fica o torturado,
o eterno enamorado…
fraco mestre, o aprendiz!
Tempos remotos lá vão,
não os quero relembrar;
fazem-me sofrer imenso,
tornam minha alma doente,
as minhas ideias vogar.
Vou tentar tudo esquecer,
esse passado infeliz;
vou-me divertir, viver,
já basta tanto sofrer;
quero ser, enfim, petiz.
Mas não será fantasia
este meu louco desejo?
Toda esta minha euforia?
Será apenas, magia,
Um pretexto, um ensejo?
DIA DE SOL
Dia de sol, puro e belo,
nunca vi outro assim;
daqui avisto o castelo,
falando assim para
mim:
«Estou aqui, aonde me vês,
há longos séculos talvez,
mas tão forte como dantes;
por mim travaram-se lutas
e lindas damas pedantes
sorria
- e todos dizem merecida –
àquele santo de Deus.
Seu nome aqui ficou
para a posteridade;
passe o tempo, a idade,
seu nome se consagrou.»
1970
62
AMOR DE MÃE
Se soubesses o que era
ser mãe, pura e doce mãe,
não estarias à espera:
- amá-la-ias tu também.
Pobre criança mimada,
não tens olhos para ver
chorar – tão amargurada,
tua mãe por muito querer?
Não a faças mais sofrer.
Criança: cresce e aprende;
é tão grande esse querer
que às vezes até ofende!
Quando tiveres teus filhos
verás o quer dizer:
«quem tem filhos tem cadilhos»
não o vais nunca esquecer.
O amor de pai é ardente,
o de mãe é escaldante
- até por vezes saturante –
Mas sempre terno e quente.
ELA
Não quero o perdão teu!
Quem tudo te ofereceu?
A própria vida, o coração…
E, no final, … a desilusão!
Abandonaste-me, deixaste-me só.
Ai de mim que sofro o teu desdém!
Já não te merece, ao menos, dó,
aquele que já foi para ti alguém?
Tempos passados, horas perdidas,
amarguradas, sentidas,
sonhos não realizados,
vidas mal vividas!
Só me resta a saudade
daqueles tempos de outrora;
vivendo em meu coração,
lembrando-a hora a hora.
Não estou arrependido,
de contigo ter vivido,
de ter sonhado tão
alto;
foi uma lição cruel,
ficando o sabor a fel,
a vida cor do basalto!
1969
Os teus lábios caprichosos…
foram beijados pelos meus;
beijos sãos, mui amorosos,
mas não aceitos pelos teus.
Não fiquei arrependido
dos beijos que te roubei;
fiquei sim muito sentido
porque dei e não levei!
Esses teus lábios tão frios
lembram correntes de rios
no inverno; lembram, dançando,
figuras de cera em salão,
canções de gelo cantando!
Esses beijos que eu te dei
não foram uma mentira;
foram beijos de amor,
daqueles que causam dor,
e duram toda uma vida.
Que representam para ti
esses beijos que eu te dei?
Lembra-te que eu não menti
quando teus lábios beijei.
Talvez nos meus olhos leias
o grande amor que te dedico;
peço-te que nele creias…
por ele a sofrer eu fico.
1969
FUTURO HERÓI
Por sobre as nuvens voando
por sobre mares navegando
a terra dura pisando
heróis d’outrora memorando
e heróis d’agora chorando
Batem-se na doentia Guiné,
Angola e Moçambique
batem-se com bravura e fé
para a frente arma em riste
o medo por vezes sua alma invade
pede-se a um deus para que seu
corpo ali não fique
mescla de medo e de bravura
tanta água e que secura
seus lábios pedem uma gota d’água
sua família com saudades chora
estes serão os heróis d’agora
Voluntário, obrigado
para a guerra vai afinal
vai ser sacrificado
o mundo dele se esquece
o nosso respeito merece
soldado de Portugal
Morena, doce morena…
flor que veio do campo,
lembrar-te faz-me pena,
vivo em eterno pranto.
Vieste, andorinha doirada,
em meu beiral fazer ninho;
mas chegado o inverno, coitada,
tiveste de deixar teu cantinho.
Deixaste só e a sofrer
um coração destroçado;
mais me valera morrer
ao te enganar, enganado!
Todas as manhãs, à janela,
olho ao longe o horizonte;
não te vejo, Cinderela,
meus olhos são uma fonte.
Tinha dois grandes amores,
qual deles o maior;
perdendo os teus favores
fiquei com a maior dor!
Se antes soubesse o que sei,
mais atenção te daria;
pois amor que não te dei
eu tinha-o em demasia!
Não mais haverá verão
em minha vida sombria;
viverei, como irmão,
na foz da melancolia!
A vida deixou de ter
para mim qualquer razão;
viverei para sofrer,
para a dor do coração.
Passo noites sem dormir,
revendo a tua imagem;
de manhã, o sol a abrir,
vejo a sombra da miragem!
Vivo na pura ilusão
do teu amor possuir;
mentiroso coração,
passas a vida a mentir!
Amor de sal como o meu
não voltarás a encontrar;
sabe-se lá, o amor teu
a quem o irás entregar!
Dá-o a uma alma nobre,
que o saiba merecer;
não interessa rico ou pobre,
interessa sim puro ser.
Dá-o a quem o mereça,
a quem te faça feliz;
quem não compare nem meça
o grande amor qu’eu não quis!
Eu sofrerei em silêncio
este amor que rejeitei;
troquei-o por outro amor,
ou um sonho que acalentei,
muito maior do que esta dor!
Os beijos que eu te dei
foram beijos de amor;
mas tarde o soube, eu sei,
agora resta-me a dor.
Mataste a débil criança,
deste vida a outro ser;
também mataste a esperança
que em mim estava a nascer!
Adeus, querida morena,
sonho não realizado;
se lembro já tenho pena,
o presente é meu passado!
Se alguma vez te lembrares
deste pobre enamorado,
faz por duas
lágrimas chorares:
- o amor nunca é culpado!
1969
// continua...
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