QUADRAS AO DEUS DARÁ
Por Joaquim A. Rocha
356
São
João visitou Braga,
Dizem
que anda por aí;
Percorreu
toda a plaga,
A
tasca do velho Gi.
357
São
João gosta das moças,
Namora
aqui e acolá;
Vai
com elas para as roças
Como
se fora Rajá!
358
São
João não tem cabeça,
Gasta
todo o dinheirinho;
Não
larga a tasca do Beça,
Empanturra-se
com vinho.
359
São
João visitou Braga
Nas
asas de um condor;
No
regresso rogou praga
Por
esquecer seu amor.
360
São
João, no mês de Junho,
Vemo-lo
sempre por cá;
Vem
comprar botões de punho
À
loja do senhor Sá.
361
São
João anda cansado,
Já
não dança, nem sorri;
Mas
mesmo assim esgotado
Vai
visitar a Lili.
362
São
João nunca se cansa,
Brinca,
brinca, sem parar;
Mesmo
sem música, dança,
Sozinho
ou com seu par.
363
Trepa,
trepa, trepadeira,
Por
essa árvore arriba;
Assim
trepa a saudade
Pela
minha alma dorida.
364
Sou
um poeta menor,
Da
segunda divisão;
Não
sei falar de amor,
Das
coisas do coração.
365
Ai
quem me dera saber
Tudo
da vida, do fado;
Ir no tempo, aprender,
Mergulhar
no teu passado.
366
Ai
quem me dera, me dera,
Ser
judeu, cristão, e mouro,
Ter
a força de uma fera,
Do
elefante, do touro.
367
Ai
quem me dera, me dera,
Ser
padre, frade, ou monge;
Viver
com a primavera,
Ter
sempre o inverno longe.
368
Fui
visitar o Alentejo
Em
meados deste ano;
Só
estrangeiros eu vejo,
No
torrão alentejano!
369
Fui
a Fátima a pé,
Pra
cumprir uma promessa;
Vim
de lá sem alma e fé,
Sem
energia e sem peça!
370
Uma
gaivota voava,
Em
Janeiro, ao luar;
Como
ela, também eu voo,
Abraçado
ao meu par.
371
São
João serviu à mesa
Num
restaurante de Nisa;
Um
cozido à portuguesa
E
bacalhau à narcisa.
372
Liberdade,
liberdade,
Quem
a tem chama-lhe sua;
Eu
só tenho liberdade
De
escrever versos à lua.
373
Não
pensava no destino
Até
ao dia em que o vi;
Tem
feições de um menino,
Mas
dentes de javali.
374
O
destino ignorou-me
Durante
anos e anos;
Mas
um dia encontrou-me,
Paguei
com juros enganos.
375
Ninguém
foge ao destino,
Poucos
o podem fintar;
Ora
se mostra benigno,
Ora
uma fera do mar!
376
Quando
eu era pequenino
Pensava
ser muito esperto;
Mas
o raio do destino
Tornou-me
um pobre roberto!
377
Eu
nunca vou a concursos
Para
evitar as maleitas;
Quem
concorre são os ursos
Com
mil quadras mal feitas.
378
Eu
já sei que São João
Não
gosta do que eu escrevo;
São
versos sem emoção,
A
muito mais não me atrevo.
379
As
ondas do mar vão altas,
Rugem
como o leão;
Mostram-se
à luz da ribalta,
Têm
a força de Sansão!
380
As
ondas do mar vão calmas,
Dormem
um sono profundo;
Apaziguam
as almas,
Os
tormentos deste mundo.
381
O
Adão comeu maçã,
O
Cavaco bolo-rei;
Levanto-me
de manhã
O
que comer eu não sei!
382
O
Adão sonhou com Eva,
O
Aníbal com Maria;
Eu
sonho com a Minerva
Em
uma noite de folia.
383
Já
me chamaram Mesquita,
Senhor
Costa e Abreu;
Fui
padrinho de Ana Rita,
Mas
continuo a ser eu.
384
No
hospital fui urgente,
No
mar alto navegante;
Na
vida fui paciente,
Na
guerra fui um mutante.
385
Olho
a vida de frente,
Como
o forcado o touro;
Mas
destino, de repente,
Rouba-me
a paz e o ouro.
386
São
João veio ao Minho
Em
busca do bom presunto;
Bebeu
tigelas de vinho,
E
batizou um defunto.
387
São
João chamou-me tolo
Por
não ter religião;
Dei-lhe
vinho, comeu bolo,
Chamou-me
logo irmão.
388
Eu
não sou enciclopédia,
Não
tenho todo o saber;
Tudo
em mim é comédia,
O
que faço é por lazer.
// continua...
Sem comentários:
Enviar um comentário