OS NOVOS LUSÍADAS (...)
Por Joaquim A. Rocha
// continuação de 27/03/2023.
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Pedro
restaura a Carta de novo,
Proclama
rainha sua filha Maria,
Torna-se popular, dá-se ao povo,
Mas
ao elogio não resistia;
Enquanto
sua filha está no ovo,
Mantem-se
ao leme, na chefia.
Joaquim
António de Aguiar
Assina
lei para as Ordens acabar.
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Em
mil oitocentos e trinta e quatro
O
regente deixa este ingrato mundo;
«Rei Soldado», herói que eu idolatro,
Lutou
com garra, como antes Edmundo.
Vencer
o mano foi lúgubre, atro,
Um
penar doloroso e profundo.
A
sua morte deixou mil saudades
Aos
povos dos campos e das cidades.
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O
sábio Mouzinho da Silveira
Começou
reformas fundamentais:
Acabar
com morgadios, primeira,
Extinguir
dízimos, velhos forais;
A
sisa, a falsa e verdadeira,
E
sobretudo direitos reais.
Criou
a divisão judiciária,
Para
combater a fera alimária.
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Nascem
as províncias no país,
Comarcas
e muito concelho;
Lembram-se
os tempos de Dom Dinis,
Mas
ali povo não mete bedelho…
O
rei fez tudo o que ele quis,
Não
aceitava ideia… conselho.
Agora
regime é liberal,
Embrião
de um novo Portugal.
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Extinguiram-se
as corporações
Chamadas
de ofícios e artes;
Eram
mil centros de complicações,
Dos
absolutistas seu estandarte.
Faziam
secretas reuniões
Colocando
liberais sempre à parte.
Era
gente muito antiquada…
Com
inovações não queria nada.
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Extinguiram
ordens religiosas,
Fecharam-se
mosteiros e conventos;
Os
frades e freiras, almas sanhosas,
Foram
levados pelos fortes ventos…
Esteio
das reais cabeças rosas,
Causadoras
de fraudes e tormentos.
Em
nome de um deus crucificado,
Sugavam
o «Zé» mal alimentado.
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Os
mosteiros de Fiães e Paderne
Foram
centros de enorme riqueza;
Vejam
o seu âmago, o seu cerne…
Tinham
de tudo: roupa, boa mesa;
Lampreia,
sável, bom salmão e cherne…
Campos,
pesqueiras, lareira acesa.
Os
abades foram grandes senhores,
Eram,
de reis e nobres, os mentores.
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Vencedores
decretam amnistia
Para
os crimes chamados políticos;
Para
«malhados» não é alegria,
Tornam-se
coléricos, assaz críticos.
Não
descansarão de noite nem dia
Até
destruírem os maus levíticos.
Dom
Pedro Quatro é apedrejado,
Morre
meses depois, o desgraçado.
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«Maria
do Brasil», «Educadora»,
Governou com prudência e saber,
Mas
a terrível ira redentora
Quase
tudo deitaria a perder…
Movimentos,
revolta sedutora,
O
ódio na forja a derreter.
Os
duques da Terceira e Saldanha
Usaram
de muita ronha e manha.
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Neste
tempo de Maria Segunda
Havia
banditismo e guerrilhas;
Matavam,
roubavam, e davam tunda,
Formavam
grupos, enormes quadrilhas…
Circulavam
às voltas, em rotunda,
Como
cães agrupados em matilhas.
O
“Remexido” e “Zé do Telhado”
Eram
chefes de um grau elevado.
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Tomás
das Quingostas, no Alto Minho,
Com
o seu pequeno ou médio bando,
Roubava
presunto, milho e vinho,
Tudo
que pudesse ia furtando…
Consta
que respeitava o povinho,
Que
até dinheiro lhe ia dando.
Nas
lojas vendiam-lhe tudo a fiado
Para
se verem livre do malvado.
38
Aceitava
serviços de matança,
Em
todo o Minho ou na Galiza;
Não
temia forças de segurança,
Não
receia fronteira ou baliza…
Ao
condenado não dá esperança,
Pois
a sua morte na mente giza.
Serviu
políticos, gente graúda,
Dá
vivas à rainha, juiz saúda!
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Depois
duma longa perseguição,
É
caçado como perdiz ou coelho;
Tentou
a sua fuga, mas em vão,
Porque
sofria há muito dum joelho…
A
tropa deu-lhe ordem de prisão,
Usou-o
como se fora trabelho.
Foi
conduzido por doze soldados,
Preso
a tronco com sete cadeados.
40
Nunca
mais se soube nada da besta,
O
seu grupo partiu para a montanha;
Acabou-se
para a corja a festa,
Diz-se
que fugiram para Espanha,
Passando
dias na densa floresta,
Alimentando
a raiva, a sanha...
A
rainha pediu aos generais
Que
acabassem com esses animais.
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A
vida do Tomás é hoje lenda: …
Anos
depois, montado num cavalo,
Com
seu cabelo loiro, numa senda,
Como
no fútil fenómeno de halo,
Falando
língua que ninguém entenda,
Provocando
ao passar ruidoso estalo,
Surge
como alma vinda do espaço,
Alta
pose, baixo estardalhaço.
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Roubava
aos ricos, dava aos pobres,
Impunha
a sua força física;
Tinha
sempre nos bolsos uns cobres
Para
dar ao leproso e à tísica…
Tirava
aos padres, doutores, nobres,
Numa
tendência voraz, narcísica…
E
a lenda cresce como a erva,
Transformando
em princesa a serva.
43
A
dita revolução de Setembro
Restaura
a velha constituição;
Finais
de estio, se bem me lembro,
Com
os agasalhos ali à mão.
Manuel
Silva Passos passa a membro
De
um governo de coligação.
O
nobre visconde Sá da Bandeira
Encontrava-se
na fila primeira.
44
Estranha
revolta dos marechais,
Dois
duques, grandes senhores,
Querem
de novo a Carta, nada mais;
Lutam
com ganas, causam dores,
Mas
a sua causa tomba no cais;
Desta
vez nenhum deles têm louvores.
Nasce
uma nova constituição,
Quase
ninguém sabe por que razão.
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A
revolução da Maria da Fonte
Pôs
o país todo em polvorosa;
Destruiu-se
tudo: barca e ponte,
A
loba fera ficou mui raivosa.
E
antes que o sol ao longe desponte,
A
chama rompeu solene, airosa.
Isso
por causa dos enterramentos,
Que
queriam na igreja, não aos ventos.
46
Outra
causa, que dizem verdadeira,
Tem
a ver com impostos agravados;
O
Costa Cabral, como a toupeira,
Tinha
os seus grandes olhos tapados.
Graças
a essa estranha cegueira
Houve
muitos documentos queimados.
Devido
à Convenção de Gramido,
O
revoltoso deu-se por vencido.
47
Até
parece que o português
Não
aprende nada com o passado;
Derrama
o sangue uma, outra vez,
Como
se esse fosse o nosso fado.
Seja
em Beja, Arcos de Valdevez,
Guimarães,
Lisboa, ou rio Sado.
Que
bom acabar com a violência,
Semear
só paz na sua ausência.
48
Na
famosa guerra da Patuleia
Lutaram
cartistas e setembristas;
Ambos
ouviram o canto da sereia,
Ambos
eram tolos e masoquistas…
Ninguém
lutava por sua aldeia,
Embora
fossem nacionalistas.
Tudo
por causa da Carta de Pedro,
Inspirada
nas fábulas de Fedro.
49
A
Carta, dita Constitucional,
Que
Dom Pedro trouxera do Brasil,
Prenda
que outorgara a Portugal,
-
Ou apenas um sublime ardil -,
Traz
dentro de si o bem e o mal,
Como
pólvora dentro dum barril.
Como
a aranha constrói a teia,
Ele
impusera a sua ideia.
50
Saldanha,
um homem irritadiço,
Provocando
uma nova revolta,
Intolerante, homem metediço,
Agindo
bravo, com sua escolta;
Corpo
grande, mas cérebro postiço,
Em
tudo quer mexer, dar-lhe a volta.
Derruba
ministério de Cabral,
Assume
o governo, para nosso mal.
51
E
assim, à pacífica rainha,
Que
tudo fazia pela santa paz,
Meteram
no seu corpo a morrinha,
A
alma pérfida de Satanás.
Rezou
à Santíssima, a São Braz,
Foi
ao bruxo de Lugo, da Porrinha.
Por
fim, numa serena cama cai,
Ali,
dormindo, o sonho se esvai.
52
No
seu reinado algo de bom se fez,
Boas
Escolas Médicas surgiram,
Abriram
liceus (aulas de francês),
Escolas
primárias emergiram,
Acabou-se
o incerto, o talvez;
E
novas rosas nos jardins floriram.
A
música teve Conservatório,
Onde
nasceu pauta e reportório.
53
O
Instituto Agrícola surgiu,
Academia
Politécnica do norte;
A
rainha prometera, não mentiu,
Tudo
queria fazer, não teve sorte;
Escola
Politécnica sorriu…
Mais
fizera se não fosse a morte.
Sua memória merece respeito,
A
nossa homenagem, nosso preito.
// continua...
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