QUADRAS AO DEUS DARÁ
Por Joaquim A. Rocha
Cangaram-me
no país,
Atrelaram-me
à carroça;
Não
consegui o que quis,
Dormi
no mato, na choça.
713
Não
sei se serei feliz
Nesta
terra sem bom rumo;
Sou
senhor do meu nariz,
Mas
não há fogo sem fumo!
714
Fui
bom aluno nas aulas,
Aprendi
algumas coisas;
As
escolas eram jaulas,
Cadernos,
mesas e loisas!
715
Ai
quem dera regressar
Àquelas
aulas de latim;
Aprender
o verbo amar,
Por
ela gostar de mim!
716
Nasci
pobre, e doente,
Filho
de mãe imatura;
Fraco
de corpo, de mente,
De
fome, muita fartura!
717
Comi
côdeas de pão,
Ainda
não tinha dentes;
Eram
sobras de um cão,
E
de velhos já sofrentes.
718
Cresci
como fera, lobo,
Na rua, abandonado;
Filho
do nada, do povo,
Da
aventura, do vil fado!
719
Aos
onze anos de idade
Era
hábil engraxador;
Matei
a fome, vaidade,
O
sonho de ser condor!
720
Nada
devo às finanças,
Paguei
sempre meus impostos;
Outros
enchem bolsa, panças,
Eu
sou rico em desgostos!
721
Quando regressei da guerra
Não
sabia o que fazer:
Se
voltar prà minha terra
Para
no seixo bater!...
722
Decidi-me
por Lisboa,
A
capital do país;
Comendo
caldo, e broa,
Feita
do pobre maís.
723
Trabalhei
durante o dia,
Ia
prà escola à noite;
Corpo
e mente resistia,
Mas
era forte o açoite!
724
Restaram-me os diplomas,
Bem
guardados em canudos;
Aos
setenta, as reformas,
Tornam-nos
surdos e mudos!
725
Já
fui pobre, remediado,
Rico
não consegui ser;
Fui
poeta não amado,
Por
quem não gosta de ler!
726
Põe
máscara protetora,
No
teu rosto esquisito;
Torna-te
dona, senhora,
Dum
sorriso sem atrito!
727
Não
tenho ideologias,
Sentimentos
altruístas;
Vivo
em sonhos, fantasias,
No
mundo dos egoístas!
728
Não
tenho a força do vento,
Das
fortes ondas do mar;
Mas
tenho no pensamento
Mil
forças por resgatar!
729
Quem
me dera ter morrido
Mesmo
antes de nascer;
Não
fora eu um vencido,
Por
mil anos a sofrer!
730
Nem
só dramas e tragédias
Existem
nas minhas vidas;
Já
vivi festas, comédias,
Verdadeiras
e fingidas!
731
“Descansa
em paz”, disse amigo,
Quando
eu já estava morto;
Mais
que ele disse não digo,
Ia
em viagem, absorto!
732
Tenho
amigos carecas,
Outros
com muito cabelo;
São
as chuvas, são as secas,
Ou
a falta de desvelo.
733
Toda
a gente come potas,
Sejam
novas ou mui velhas;
Sejam
ateias, mui devotas,
Sejam
duras como telhas.
734
Dizem
que sou um cow-boy,
Bandoleiro
do oeste;
As
coisas são como sói,
Conforme
a roupa que veste.
735
Ao
longe ouvi um grito,
Quem
estaria a gritar?
Talvez
o Tó, o Negrito,
Uma
fera a despertar!
// continua...
Sem comentários:
Enviar um comentário