OS NOVOS LUSÍADAS (...)
Por Joaquim A. Rocha
// continuação de 10/11/2023.
Terceira
Parte
(1910 a 1926)
1
O
republicanismo em Portugal
Nasce,
diz-se, com Henriques Nogueira;
Escreveu
o evangelho principal,
O
texto que terá honra cimeira…
Foi
construído de pedra e cal,
Para
ter vida longa e verdadeira.
Nele
constam as ideias, princípios,
Que
mudarão as leis, os municípios.
2
Defendia-a
descentralizada,
Autêntica,
quase socialista;
Honesta,
culta, democratizada,
Popular,
generosa, altruísta…
De
gente simples, não empertigada,
Não
utópica, viva, realista…
Aceitou
ideias de Herculano,
Historiador
culto e humano.
3
A
República triunfara em França,
Anos
depois na vizinha Espanha,
Dava
novo alento, esperança…
Quem
sabe se a aliada Bretanha!...
Não há tempestade sem a bonança,
Não
haverá teia sem a aranha.
Sonho
transformado em realidade,
A
monarquia não deixará saudade.
4
O
são espírito republicano
Germina
por todo este planeta,
Levado
por milhafre, pelicano,
Pelos
longos ares, veloz cometa;
Vai
aumentando ano após ano,
Tal
como no jardim linda roseta.
As
monarquias vão enfim morrendo,
Num
estertor ruidoso, vil, horrendo.
5
O
socialismo foi abandonado
Pelos
ideólogos republicanos;
O
luso não estava preparado,
Seria
preciso esperar anos…
E
tudo ficaria esgotado:
Ideias,
modelos, até humanos…
Escolheram
outras prioridades:
Desenvolver
as vilas e cidades.
6
O
analfabetismo era uma praga
Neste
país quase todo rural;
Fosse
em Lisboa, Porto ou Braga,
Poucos
sabiam ler em Portugal.
«Limpar este velho mal nem com draga»
Sentenciava,
cru, Gomes Leal.
Faltava
ao Estado condições,
Seus
cofres apenas tinham tostões.
7
João
Deus com Cartilha Maternal
Ajudou
a melhorar o ensino;
Mas
naquele mundo pobre, rural,
Cuidavam
mais do gado asinino!
O
saber aí não era principal,
Rende
mais o trabalho do menino.
«Ser analfabeto não é vergonha,
É
bem pior ser ladrão ou langonha.»
8
Outubro
de mil novecentos dez
Vê
a débil monarquia cair;
Para
a defender, um ou outro maltês,
E
Couceiro, sempre a resistir...
Herói
de África, vero português,
Da
realeza jamais quer desistir.
Levantou
a monarquia no norte,
Condenada
logo depois à morte.
9
Criou-se
um governo provisório,
Presidido
por Teófilo Braga,
O
qual, sem vistoso foguetório,
E
com a carteira bastante magra,
Sorridente,
sem cara de velório,
Tenta
trepar a gigantesca fraga.
A
seguir nasce a constituição,
Que
dará outro rumo à nação.
10
Arriaga
é eleito presidente,
Desta
República recém nascida;
Ficará
quatro anos à sua frente,
A
sua obra não será esquecida.
Reformar
era crucial, premente:
O
ensino, «bela adormecida»…
A
sensível lei do inquilinato
Vestira
o seu domingueiro fato.
11
Nasce
novo hino «A Portuguesa»,
Tinha
letra de Lopes de Mendonça,
Música
é guerreira, sem beleza;
Luta
contra a «amiga da onça»…
Invoca-se
um roubo, sem certeza,
De
terra selvagem, talvez esconsa.
Alguém
lhe chamou mapa cor de rosa
Àquela
zona árida, não formosa.
12
Mandaram
costurar outra bandeira,
Onde
vermelho e verde predomina,
Contudo
o amarelo não se esgueira,
A
linda cor azul também combina.
O
escudo pátrio serve de esteira
À
esfera armilar, doce menina.
O escudo contém as cinco quinas,
Que
lembram as batalhas afonsinas.
13
Os
sete castelos, em amarelo,
Sobre
a parte vermelha do escudo,
Simbolizam
Cacela, por «Castelo»…
E
outros, mas fico por ora mudo.
Com
o tempo tornaram-se em farelo,
Mas
nossa bandeira realça tudo.
Nas
casas, barcos, aviões, flutua,
E
um dia flutuará na lua.
14
O
concílio de Trento vingou
Neste
pequeno reino europeu,
Seu
estilo, método, imperou
Como
o amor em Julieta e Romeu;
Mas
o republicanismo frustrou
Os
desígnios do pai de Morfeu.
Leis
justas, liberdade, são ora aves
Com
asas mais potentes do que naves.
15
Impuseram
o Registo Civil
A
todos os cidadãos portugueses;
As
Conservatórias eram mil,
E
não chegavam a todos por vezes.
Tudo
que havia era senil,
Cheirava
quase tudo a fezes.
Igreja
separa-se do Estado,
E
o clero passa um mau bocado.
16
O
divórcio passa a ser possível,
Deixam
de ter títulos os fidalgos;
A
reação dos lesados é terrível,
Reagem
como cães, velozes galgos.
Dizem
que o governo é falível,
Tem
os olhos brancos como os salgos.
«Igreja católica é geral,
Deve
permanecer em Portugal.»
17
Por
fim vingaram os tais argumentos,
O
catolicismo tornou-se forte,
Ergueram
centenas de monumentos,
Espalharam-se
pelo sul e norte.
Vieram
jesuítas com unguentos,
Doroteias
com ervas de má sorte.
Reviu-se
a Lei da Separação,
A
fé domina de novo a nação.
18
O
velho Instituto Industrial
Pula
a Instituto Superior;
Trepa
Instituto Comercial,
E
nada disto era por favor...
Tudo
se faz a bem de Portugal,
Por
brio, dignidade, pundonor.
Escola
Veterinária sobe,
A de Agronomia também se move.
19
Estar
no patamar da rica Europa,
A
mais moderna, mais desenvolvida…
Comer
presigo, não somente sopa;
Dar
à nossa cultura guarida...
Beber,
como eles, em bela copa,
Termos,
como europeus, digna vida.
Mas
para tal é preciso produzir,
Empresas
e Estado bem gerir.
20
O
conflito armado, Grande Guerra,
Começou
mil novecentos catorze;
Fez
tremer o mundo, toda a Terra,
Deu
mui trabalho ao código «Morse».
Portugal
não entrou logo na berra,
Talvez
com receio da entorse…
A
forte Alemanha e a Turquia
Têm
ao lado Bulgária e Hungria.
21
A
enorme Rússia e a França
Têm
por parceiros Sérvia, Itália;
Ingleses
entram na macabra dança,
Corre
muito sangue na antiga Gália.
Acabar
com ela não há esperança,
Nem
com ajuda do Zeus da Tessália.
Vai
durar quatro longuíssimos anos,
Com
muitas mortes, torturas e danos…
22
Nosso
governo quer entrar na guerra,
Para
proteger solos ultramarinos,
E
ajudar a aliada Inglaterra…
Mas
os ingleses, falsos e cretinos,
Dizem que a nossa pobre terra,
Não
tem guerreiros, só «boys», libertinos.
Costa
provoca alemães num rompante,
Retém-lhe
barcos da frota mercante.
23
Esses
barcos estavam ancorados
Nos
portos das ilhas e ultramar;
E
os ingleses, necessitados,
Pediram
para os requisitar.
Os
germanos ficaram mui pasmados,
Nem
queriam sequer acreditar.
«Como é que gente insignificante
Se
mete com um colosso, gigante?!»
24
Os
alemães, altivos, furiosos,
Declaram
guerra ao nosso torrão;
Os
portugueses, coitados, curiosos,
Embarcam
numa louca ilusão.
A
guerra não era para medrosos,
Os
«boches» irão ver quem tem razão.
Nasce
assim a «União Sagrada»
Entre
partidos da vida airada.
25
Unionistas
apoiam governo,
Dão
o seu ámen os “socialistas”;
O
povo, esse não está sereno,
Uma
guerra é para especialistas,
Não
para gente a comer só feno,
Pão
de milho, fruta e pataniscas.
Soldados
estavam mal preparados,
Serviriam
pouco aos aliados.
26
O
futuro breve daria razão
Àqueles
que nunca acreditaram;
«Tropa lusa é carne para canhão,
Morrerão
em terras que não amaram.»
Gente
jovem, na idade da ilusão…
Deviam
ir lutar os que os chamaram.
Políticos…
esses ficam de fora,
A
olhar para a triste mãe que chora.
27
E
com estapafúrdios discursos
Lograram
o seu ousado intento…
Contaram
armas, cavalos e ursos,
Convocaram
Éolo, deus do vento;
Desviaram
águas dos seus cursos,
Mergulharam
lares em vil lamento.
«Todos para a guerra, combater,
Com
pujança, lutar até morrer!»
28
Criaram
força expedicionária,
Para
brigar em África e França;
Criatura
boa, não alimária,
Ia
para longe, sem esperança…
Deixavam
filhos: José e Rosária,
À
espera da futura bonança.
E
morreram tantos, tantos milhões!
E
fizeram chorar tantos corações.
29
Norton
de Matos foi herói e “santo”,
Realizou
o «milagre de Tancos»;
De
mangas arregaçadas, sem manto,
Com
rapazes calçados de tamancos,
Provocou
nos descrentes mui espanto,
Ao
aprumar aqueles corpos mancos.
Souberam
defender sua bandeira,
Nas
letais lutas fora da trincheira.
30
Muitos
deles ficaram prisioneiros
Em
campos, em terreno alemão,
Deitados
sobre colchões piolheiros,
Alimentados
de água e pão...
Foram
torturados por carniceiros,
Gente
má e bruta, sem coração.
Adolfo
Hitler combateu em França,
Contra
os soldados da Aliança.
31
Dessa
guerra tão cruel, tão sangrenta,
Ninguém
regressou como antes era;
Qual
é o ser humano que aguenta
O
silêncio letal, longa espera?
Seu
cérebro cansado afugenta
Lembranças
da noiva, da primavera…
Vive
permanentemente em terror,
Mal suportando fadiga e dor.
32
Perguntou-se
ontem, ainda hoje,
O
que ganhou o país com a guerra?
Ninguém
decide falar, tudo foge,
Vou
perguntar à montanha, à serra…
Não
há coisa que a mim mais enoje
Do
que o vil silêncio encerra.
Esse
erro gigante, colossal,
Fez
sumir o tesouro nacional.
33
Muitos
perdem com o cruel conflito:
Feridos,
mortos, muitos gaseados…
Uma
bomba perto cai, forte grito,
Veem-se
mil corpos estropiados…
Ambulâncias
passam com seu apito,
Tentam
salvar os pobres desgraçados.
Mas,
recebem medalhas os chefões,
Empresas
enchem cofres com milhões.
34
Em
Fátima, no lugar de Aljustrel,
Concelho
de Vila Nova de Ourém,
Onde
nem abelhas produzem mel,
Cujas
casas não chegavam a cem,
Nasceu
Lúcia, forte como corcel,
Devota
do bom Jesus de Belém.
Aí
brotaram Jacinta e Francisco,
Que
de letras, coitados, nem rabisco!
35
Os
três eram primos e coirmãos,
Desde
muito pequenitos pastores,
Pastavam
ovelhas nos duros chãos,
Colhiam
lindas, silvestres flores…
Por
vezes picavam as suas mãos,
Mas
o sangue não lhes causava dores.
Eram
crianças rudes, muito crentes,
Mal
vestidas, grosseiras, fracas mentes.
36
Não
perdiam catequese, doutrina,
Sabem
de cor imensas orações;
E a Lúcia, bronca, mas ladina,
Aproveita
quaisquer ocasiões
Para
mostrar ao homem da batina
Que
aprendera suas lições.
O
sacerdote fica admirado
Como
ela tinha tal decorado.
37
Em
mil novecentos e dezasseis,
Com
apenas oito anos de idade,
Na
boca sorrisos e doces méis,
Cai-lhe
do céu um anjo da trindade:
-
«Eu sou enviado do rei dos reis,
O
deus bondoso, pai da caridade...
Não
temais. Sou um anjo verdadeiro,
Vim
do paraíso, sou recadeiro.»
38
Ensinou
aos jovens a oração:
-
«Meu Deus eu creio, adoro, espero...»
À
Lúcia tremeu o coração,
Ficando
em suave desespero,
Aumentando
em si a ilusão,
Tal
como a sacerdotisa Hero.
Mas
nem o tal anjo era Leandro,
Nem
havia a tocha prò malandro.
39
Na
esteira dessa aparição,
No
ano seguinte, na primavera,
Surge
a Senhora da Conceição,
Mais
linda do que a bela pantera,
Com
um rosário na sua mão,
Deslizando
suave como hera.
Tudo
sucedeu na Cova da Iria,
Em
treze de Maio, ao meio dia.
40
Pastora
Lúcia e seus parentes
Guardavam
zelosos seus rebanhos,
Despreocupados,
mas diligentes…
Pais
e irmãos andavam nos amanhos,
Lançando
à terra fracas sementes,
Rostos
secos, olhos rudes, tacanhos…
A
senhora diz do seu pedestal:
-
«Não tenhas medo, não te faço mal.»
41
-
«Que lugar é o de vossemecê?»
Pergunta
a catraia curiosa…
-
«Sou do céu, do lugar que não se vê,
E
onde só há gente amorosa…
Ali
meu filho tudo antevê,
Se
haverá crimes, coisa danosa...»
-
«O que vem fazer a este vil mundo?»
-
«Não to digo», clama em tom profundo.
42
Depois,
já com a voz muito mais calma,
Fala
à assustada pastorinha:
-
«Venho salvar a tua pobre alma,
(A tua e a da tua priminha)…
Pois
o demo, que a todos desalma,
Aproxima-se
com sua foucinha.»
Nada
disse da alma de Francisco,
Talvez
por ser demente e arisco.
43
A
moça perguntou-lhe pela guerra,
Se
acabaria logo, ou breve,
Mas
a visão, alta como a serra,
Mais
branca do que cera, pura neve,
Diz,
numa voz que a todos aterra:
-
«Há-de morrer gente fina e leve…»
E
continuou numa lengalenga,
Parecendo
até da tribo senga.
44
A
imagem depressa se sumiu,
Prometendo
voltar mais vezes;
Um
papa, o sucesso assumiu,
Isso
era bom para os portugueses.
Uma
simples capela lá surgiu,
Fátima esqueceu os maus reveses.
Ergue-se
perto uma catedral,
Onde
outrora reinava milheiral.
45
Francisco
e Jacinta morrem novos,
Com
terríveis, atrozes, sofrimentos…
Choram
as gentes, do mundo os povos;
Escutam-se
longe gritos, lamentos...
Ouvem-se
piar as aves nos covos,
Monges
e freiras choram nos conventos.
Os
dois irmãos sobem ao doce céu,
Onde
a Virgem Maria os recebeu.
46
A
Lúcia morou imensos anos,
Em
conventos lusos e espanhóis;
Conheceu
os galegos, castelhanos,
Dormiu
em limpos e brancos lençóis…
Aprendeu
muitos truques, mil enganos,
Comeu
mil sapos, ratos, caracóis...
Mas
não se arrependeu nenhum dia
De
ter gerado Cova da Iria.
47
Os
três pastorinhos são santos,
Fizeram
curas, milagres imensos;
Estão
no céu, vestidos com seus mantos,
Acenando
com seus níveos lenços…
Ouvindo
dos castos anjos mil cantos,
Sarando
feridas com divinos pensos.
Raras
vezes vêm ao mundo sem siso
Levar
as almas para o paraíso.
48
Fátima
agora é altar do mundo,
Sede
do universo católico;
Esqueceu
o Rodrigo, o Edmundo,
O
velho «Abóbora» alcoólico.
Ali
o sentimento é profundo,
O
cheiro é romano apostólico.
Recebe
uns milhões de peregrinos:
Espanhóis,
franceses e marroquinos…
49
Novecentos
dezassete, Dezembro,
A
revolução nacionalista,
Cujo
chefe, Pais, se eu bem me lembro,
Milita
no partido Unionista…
Morre
três meses depois de Setembro,
Por
ser ditador, exibicionista.
Fundou
a dita «República Nova»,
A
qual deu na «Velha» grande sova.
50
O
severo regime sidonista,
Prendeu,
escorraçou imensa gente,
Deteve
políticos, um grevista,
Tornou-se
deste país presidente…
Podemos
chamar-lhe nazi, fascista,
Um
radical, humano dissidente…
Foi
morto na estação do Rossio,
Num
dia chuvoso e muito frio.
51
Depois
da morte de Sidónio Pais
Subiu
a presidente Canto e Castro,
Almirante
de mares, rios, cais…
Idoso,
reformado, um emplastro.
Descendente
de nobres, marechais,
Sempre
no topo do vetusto mastro.
Estala
no Porto a revolução
Que
traz a monarquia à nação.
52
Republicanos
organizam forças
Para
lutar contra os revoltosos;
Do
monte vieram cabras e corças,
Do
inferno vieram os tinhosos;
Dos
mares polares vieram morsas,
Todos
eles com garra, corajosos.
Os
tais monárquicos foram vencidos,
Numa
guerra civil de atrevidos.
53
Da
Alemanha volta o prisioneiro,
Magro,
somente com pele e osso,
Com
fato sujo, roto, piolheiro,
Com
marcas dolorosas no seu dorso...
Dirige-se
ao lar, ao seu palheiro,
Na
tentativa vã de ficar moço.
Mas
os efeitos da maldita guerra
Não
os curará os ares da terra.
54
Na
cama, lembrava-lhe a trincheira,
O
estrondo dos malditos canhões,
Os
ratos correndo à sua beira,
Em
busca de carne e de feijões...
A
cara bonita da enfermeira,
O
renascer das velhas ilusões…
Ah!
Meu pobre soldado lusitano,
Sofreste
dia, noite, todo o ano.
55
Mas
voltemos à República Velha,
Agora
no período pós guerra;
Do
frágil telhado restou a telha,
De
rubro barro trazido da serra;
De
dinheiro, nem uma só centelha…
Tal
situação nossa alma aterra.
Ai,
pobre governo, pobre Estado,
Quem
te tornou assim tão decepado?
56
Em
mil novecentos e dezanove,
No
quente e lindo mês de Agosto,
Longe
o xaile e o grosso robe,
Esquecendo
o azar e o desgosto,
José
de Almeida ao poder sobe,
Com
transcendente sorriso no rosto.
Aguentou
o lugar quatro anos
Apesar
das perfídias e enganos.
57
Seguiu-se
Manuel Teixeira Gomes,
Equilibrando
o barco dois anos;
Escritor de personagens disformes,
Inimigo
de reis e de tiranos,
Dos
militares e seus uniformes,
Amigo
de morenos africanos.
Não
terminou curso superior,
Por
falta de disciplina, rigor.
58
Eis
de novo Bernardino Machado,
Ao
leme dum navio à deriva;
Um
pouco velho, calvo, corcovado,
Mas
a esta luta não se esquiva.
Sábio,
em Coimbra doutorado,
Um
pensador profundo, alma viva.
Tenta
levar barco ao seu destino,
Com
a ajuda do seu deus bambino.
59
Sorte
reserva-lhe cruel surpresa,
O
demo está sempre à espreita;
Embora
deus tenha farta a mesa
Surge
de repente a vil maleita…
Do
Baixo Minho vem uma surpresa,
Uma
revolta militar perfeita!
Gomes
da Costa, velho general,
Destrói
a República, é letal.
60
O
pobre homem, velho, tão cansado,
Desiste,
pede sua demissão;
Leva
com ele capote, cajado,
Um
sonho truncado, desilusão...
Ficou
com o seu peito coalhado,
Na
sua boca uma oração.
Dedicar-se-á
à filosofia,
Até
à morte, derradeiro dia.
61
A
pátria, sua democracia,
Acabam
agora e tristemente;
Será
que ressuscitarão um dia,
Neste
Portugal frágil e doente?!
Quem
vai à forte luta, quem porfia,
Defenderá
ilhas e continente?
É
preciso calcar a ditadura,
Mandá-la
para a funda sepultura.
62
Venham
do Olimpo os seus titãs,
Da
Bíblia venha David, Sansão…
Venham
dos lagos e poços as rãs…
Tragam
fisgas, setas, lanças na mão,
Untados
com óleo de avelãs,
Couraças
a proteger coração.
Ajudem-nos
nesta tarefa nobre,
Limpar
a dor, o luto que nos cobre.
63
Esquecia-me
de Gago Coutinho…
Do
amigo Sacadura Cabral;
Ambos
amantes do mundo marinho,
O
primeiro inventor genial.
Navegando
em navios de pinho
Percorreram
mares e areal.
O
aparelho chamado sextante
Tornou
nossos voos menos errantes.
64
Gago
Coutinho chegou a almirante,
Cabral
era tenente da marinha;
Sobre
o Atlântico, feito gigante,
Voaram
até ao Rio, asinha...
E
ajudados pelo deus «tronante»,
Subiram
ao Olimpo de escadinha.
Heróis
deste mundo, do universo,
Cantá-los-ei
em prosa e em verso.
65
Estes
homens ficaram na História
Pelos
bons feitos que realizaram;
Jamais
serão apagados da memória
Deste
povo que eles sublimaram…
Venceram,
vitória a vitória,
Todas
as tentativas que encetaram.
Bem
merecem uma bela estátua,
Mesmo que seja leve, oca, fátua.
// continua...
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