SONETOS DO SOL E DA LUA
Por Joaquim A. Rocha
MORTE NO CAMPO
(152)
Numa
tarde de ténue nevoeiro,
Caim,
roído de ódio e inveja,
Leva
ao reino do pardal, da narceja,
O
pastor Abel, seu irmão inteiro.
Mata-o,
como quem mata carneiro,
Sem
dó, nem piedade que se veja,
Um
suspiro de dor, leve que seja,
Com
a crueldade de carniceiro.
A
essa hora está Javé dormindo,
Num
sono profícuo e profundo,
A
sua santa mente divertindo…
Quando
acorda vê o moribundo.
A
seu lado, o assassino rindo,
Achando-se
vingado neste mundo.
APENAS UM SONHO
(153)
Ontem à noite sonhei com Jesus,
Carregando às costas pesado fardo,
Na cabeça coroa feita de cardo,
Caminhando para a maldita cruz.
Seus olhos faiscavam ódio e pus,
Por se sentir como um vil petardo,
Lançado por um imundo bernardo
Às ordens dos infernais belzebus.
Pesava toneladas, o madeiro,
O sangue escorria pelas veias,
Sofre em prol da perenidade…
Nesse dia, pra ele o derradeiro,
Ouviam-se ao longe as sereias,
E eu cantei hinos à eternidade.
ABREM
OS TEMPOS…
(154)
Abrem
os tempos brechas nos castelos,
Põe
verdete nas faces dos metais,
Derrubam
as árvores colossais,
Devoram
tinta de painéis tão belos!
Mas
os deuses usaram tais desvelos,
Prendas,
atrativos, dons naturais,
Em
rostos femininos, que jamais,
Tempo
há de sumi-los, esquece-los!
Apenas
a morte vai um dia desfazer,
O
trabalho das divinas criaturas,
Obra-prima
do viril universo.
Vai
exibir seu infindo poder…
Restarão
os ossos, frágeis esculturas,
Para
o vate cantar num frugal verso.
Este soneto foi inspirado num outro de
Ribeiro da Silva
(ver
Notícias de Melgaço n.º 369, de 26/9/1937).
// continua...
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