QUADRAS AO DEUS DARÁ
Por Joaquim A Rocha
180
Oh! Minha ninfa
peixeira,
Mãos rudes, corpo
bonito;
Se não fosse essa
sujeira,
Levava-te em meu carrito.
181
Subi à torre do
castelo,
Atirei-me: -
trambolhão.
Diz-me um anjo ao
ouvido:
«Vem conhecer pai Adão.»
182
No tempo de meus
avós
Namorar era
engraçado:
A rapariga lá em
cima,
Em baixo, o
namorado.
183
Agora o namorar
É só de lábios
colados;
É um longo
abraçar,
São beijos nunca
acabados.
184
Quando andava na
escola
Nada tinha pra
calçar;
Camisa toda
rotinha,
As calças por
remendar.
185
Pra ganhar algum
dinheiro
Engraxei muitos
sapatos;
Fui moço de
sapateiro,
Consertei cem mil
chanatos.
186
Um rapaz da minha
terra
Foi para o rio
nadar.
Aflita, sua mãe
berra:
Ai filho, vais-te
afogar!
187
Podia ter sido
alguém,
Se não fosse tão
bacoco;
Se usasse gravata
fina,
E belo chapéu de
coco.
188
Sofremos de uma
doença
A que chamam
cupidez;
É doença nacional,
Orgulho do
português.
189
Passei fome,
passei frio,
Mas sede só por
olvido;
Tinha a água do
rio,
A rica fonte do
Vido.
190
Tens perninhas de
primeira,
Um rostinho de
segunda;
Cabecinha de
terceira,
E de quarta tens
a tunda.
191
A geada queima a
flor,
A raiz não
queima, não;
Teus olhos
queimam, amor,
O meu frágil
coração.
192
O general
Bonaparte
Coitado, até dá
pena;
Homem de engenho
e arte
Foi morrer em
Santa Helena.
193
O general
Bonaparte
Tinha uma sorte
pequena;
Dominou em toda a
parte,
Sucumbiu em Santa
Helena.
194
O pequeno
Bonaparte
Foi um grande
general;
Inspirado por
deus Marte
Mandou invadir
Portugal.
195
O terrível
Bonaparte
Foi grande
cabo-de-guerra;
Guerreou por toda
a parte,
Conquistando mar
e terra.
196
Napoleão
Bonaparte
Foi militar
genial;
Ganhou em
Júpiter, Marte,
Mas perdeu em
Portugal.
197
Bonaparte,
inimigo,
Eu te condeno,
afinal;
Cavaste o teu
jazigo
Ao invadir
Portugal.
198
Há anos, no rio
Minho,
Vi um homem
afogado;
A pele da cor do
vinho,
O rosto
desfigurado.
199
Nobre Centro
Cultural,
De Belém, por lá
morares;
Orgulho de
Portugal,
Caravela de
outros mares.
200
Tinha eu vinte e
um anos,
Fui prà guerra
combater;
Vi a morte com
sopranos,
Convidando-me a
morrer.
201
Fui um soldado
sem brio,
Não tive orgulho
na farda;
Detestava o atavio,
A pistola e a
espingarda.
202
Fui para a tropa
forçado,
Tal condenado à
morte;
Podia ter
emigrado,
Fugido dessa má
sorte.
203
Pobre soldado
recruta,
És tratado tal
rafeiro;
Chamam-te filho
da puta,
Pontapeiam-te o
traseiro.
204
Mendigar não é
pobreza,
Pedinte já ganha
bem;
Tem rica cama e
mesa,
Apartamento em
Belém.
205
Dizem-me que sou
racista.
Senhores: juro
que não.
Só não gosto do
fascista,
Do canalha, do
vilão.
206
Não olho prà cor
da pele,
Se é loira ou
castanha;
O vulcão, quando
expele,
Enche de cor a
montanha.
207
Chamaste-me feio
anão,
Por não ter o teu
tamanho;
Mais pequeno é o
cão,
E confiam-lhe o
rebanho.
208
Veste calças de
palhaço,
Usa brincos de
mulher,
Bebe copos de
bagaço,
Toma droga quanta
quer.
209
Ando no mundo,
sarcástico,
Passeando os
olhos pios;
Só vejo sujo
plástico
Poluindo belos rios.
210
Quem me dera ter
dez anos,
Saber o que hoje
sei;
Evitaria os
enganos,
Os reles
fora-da-lei.
211
Eu não quero ter
dez anos,
Pra que tu os
possas ter;
Que nos importam
enganos
Se se ganha um
lindo ser?
212
Se eu tivesse
vinte anos,
Soubesse o que
hoje sei,
Não conheceria
enganos,
Nem chorava o que
chorei.
213
Não quero o que
desejei:
Diamantes,
diademas;
Só a ti junto de
mim,
Embalada em mil poemas.
214
És poeta, bem o
sei,
Encontro-me entre
iguais;
Não és rainha,
nem rei,
Q’ importa se ainda
és mais.
215
Tens um ar de
donzelinha,
Herdado da
meninice;
Uma pele
moreninha,
Coração d’oiro,
Alice.
// continua...
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