OS MEUS SONETOS E OS DO FRADE
Por Joaquim A. Rocha
// continuação de 18/12/2021.
SÍNTESE
DA MORAL MELGACENSE
(impressões dum
frade)
I
No cu de Portugal, nariz de Espanha,
Lá onde o Minho a cobra imita,
Onde até às nuvens se arrebita
Dum e outro lado áspera montanha.
Jaz um feio curral, que à vista acanha;
É vila. O povo – que dentro habita –
Diz: «noutros tempos era bem bonita».
Mas quem pode engolir essa patranha?!
Aqui, de gente boa pouca resta.
Quase toda a que pisa este espaço
É vil, maldizente, e desonesta!
Leitor, pela pintura que aqui faço,
Não saberás tu que terra é esta?
É a terra das putas… É Melgaço!!!
No jornal “Notícias de Melgaço” número 787, de 18/8/1946, alguém escreveu: «feito isto e mais alguma coisa que deixamos de registar por descargo de consciência, voltaremos a ter foros de terra civilizada e a poder dizer que o célebre frade foi um caluniador.»
Tu, das terras do Minho a mais danada,
Oh! esfarrapada, vil, torpe Melgaço;
Inda tens mais putas do que bagaço,
E todas ao deus Baco consagradas!
De marotos, albergas tal manada,
Tamanho mandrião, tanto madraço,
Que a conta por barato que lhes faço
São tantos como o milho a não ser nada!
E que línguas, que pérfida gentalha,
Em todos morde, em todos ferra o dente,
Esta futragem, esta vil canalha!
Quase tudo o que diz é maldizente,
Aqui por génio se murmura e ralha.
Maldita condição, maldita gente!
RESPOSTA
AO FRADE
Frade ilustre, primaz dos fradalhões,
De São Bernardo o filho mais prestante;
Tonsurado cambrone, astro brilhante,
Trovador de sotaina, frei Camões!
Tu, ó frade, que enchendo os teus pulmões,
Cantar soubeste, em verso altissonante:
- Melgaço
é uma corte radiante
De
asnos, futres, patifes e ladrões.
Que novo redentor tu foste, ó frade!
Tu, que disseste aos tristes que aqui
vêm:
- Isto
é Melgaço, um brado à sociedade.
Tal brado, um evangelho em si contém…
Sem o qual estaria a humanidade
Sem honra, sem camisa e sem vintém.
Frade: exprimiste-te com razão.
De putas, malandros, viste o efeito:
Para baixo é porta sim, porta não;
E para cima… é quase tudo a eito!
Dr. Cândido Furtado
Dantas
(juiz – 1798)
NOVA
RESPOSTA AOS
SONETOS
DO FRADE
Frade egrégio, que em mil e setecentos,
Tomaste a lira para a posteridade,
Com mentiras mil, algo de verdade,
Legaste e difundiste aos quatro ventos.
Que ser provaste, em palavrões nojentos,
Mais qu’em latim, um ás na obscenidade;
A ti rendo meu preito, ó bravo frade,
E louvo os elevados pensamentos…
E… mais: admiro a douta borracheira,
Aonde germinou, à hora da sesta,
Tão rica confissão de ódio e de
asneira!
É que em Melgaço, a «vila desonesta»,
Ama a franqueza, mesmo a da videira…
E o silêncio traidor, e vil, detesta!
Elmano Minhoto
*
NOVÍSSIMA RESPOSTA
AO FRADE
(101)
Ó
frade tanso, as belezas não viste,
Desta
vila entre montanhas erguida,
Que
é em si mesma santa e perdida,
Lugar
dos mil deuses e deles chiste!
Ao
dizeres tão mal, por mal, mentiste.
Não
soubeste distinguir morte e vida,
O
dia alegre e a noite atrevida…
Ao
dizer mal, por mal, não resististe!
Vivas
tu, ó frade, no vil inferno,
Lá
onde te devorem loucas chamas,
As
pontas aguçadas te penetrem;
Vivas…
sem primavera, nem inverno,
Enterrado
em porcas, sujas lamas…
Que
os cornos do demo em ti vegetem!
Joaquim A. Rocha
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