//continuação de 1/09/2022
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Neste
reinado de Dom João Quarto
Viveu
o padre António Vieira;
Já
do velhinho continente farto,
Partiu
num navio, classe de terceira,
A
fim de pregar a José, a Marto,
A
bondosa doutrina verdadeira.
Andou
pelos Brasis e outras terras,
Evitando
sempre lutas e guerras.
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Foi
um notável orador sagrado,
Grandíssimo
escritor de sermões;
Num
português correto, refinado,
Conquistou
muitíssimos corações.
Foi
por vários povos respeitado,
Foram
louvadas suas orações.
Acusado
pela Santa Inquisição
Sentiu
na pele a fome, a prisão!
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Tentou
para os índios a liberdade,
Apoiando-se
num decreto real;
Mas
era ainda cedo na verdade,
Estava
muito verde o nosso Portugal.
«Mas antes seja cedo do que tarde»,
Pensava
o missionário genial.
Apesar
de preso e perseguido,
Jamais
Vieira se deu por vencido.
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Sonhou
com um certo quinto império,
Com
um mundo para todos melhor;
Ainda
hoje pra nós é um mistério
Aceitar
a ideia sem ter horror;
Cada
qual defende o seu critério,
Ousa
ir além até do amor.
Mas
para que nada soe a falso
É
preciso fugir do cadafalso.
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Ao
rei Dom João sucedeu Afonso,
Seu
filho segundo, o «Vitorioso»;
Sem
barba na cara, cabelo tonso,
Corpo
grande, magro, rosto vistoso…
Olhos
vivos, espertos, nada alonso;
Diziam-no
esmoler, generoso...
Na
morte do pai era inda botão,
Governando
assim Luísa de Gusmão.
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Quando
se sentou no dourado trono
Quis
para ministro Castelo Melhor,
Estadista
famoso, nada mono,
Tornando
o real exército maior;
Desprezando
a cama, doce sono,
Lutou
com o conde de Vila Flor.
Finda
a guerra da restauração,
Logo
vem outra: a da sucessão.
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O
rei Afonso, acusado de inapto,
É
deposto a favor de seu irmão;
Foi
preso, banido, sujeito a rapto,
Como
se ele fora vil ladrão!
Nada
a dizer, lamentar, pois de facto,
Poder
corrompe, ninguém tem razão.
Foi
para uma ilha dos Açores,
Para
ali sofrer vexames e dores.
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Logo
outra guerra surgiu no horizonte,
A
chamada Guerra da Sucessão.
Percorreu-se
montanha, alto monte,
Pediu-se
ajuda a Marte e Sansão;
Bebeu-se
sangue da maldita fonte...
Ganha a guerra, eis a desilusão,
Foge
a tropa de Espanha por atalhos,
Senão
seriam feitos em retalhos!
94
Um
vil tratado deu à Inglaterra
Milhões
de libras, imenso dinheiro.
Levaram
o vinho para a sua terra
Em
troca mandam tecido foleiro.
A
alma lusa não grita, não berra,
Guarda
pra depois o chocalheiro.
O
povo está cansado da luta,
Já
não discorda, e nada disputa.
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João
quinto, a rogo da Santidade,
Manda
para Itália uma esquadra.
Junta
com outras, forma quantidade,
A
fim de lutar contra a fé malvada.
Pois
acima de tudo a cristandade,
A
religião mais prestigiada…
Em
Matapan morre o turco infiel,
Eis
segura a cruz de Emanuel.
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Nessa
altura vem ouro do Brasil,
Constrói-se
em Mafra um convento.
Nascem
cem capelas, igrejas mil,
O
aqueduto é acontecimento!
Artes,
belas letras, ganham perfil,
A
História ganha asas ao vento.
Não
digam que o dinheiro foi mal gasto
Pois
ainda sobrou lauto repasto.
97
A
Sé de Lisboa passou a patriarcal,
Os
bispos ganharam novo estatuto.
É
grande o nosso belo Portugal,
O
que era novo é hoje vetusto.
É
muito bom o que antes era mal,
O
português fica fino e arguto.
No
país a riqueza virou moda,
E
na casa das freiras gira a Roda.
98
A
seguir vem o tal «Reformador»
Cheio
de prosápia, mil projetos.
Sai-lhe na rifa o grande tremor,
Que
arrasa duras paredes e tetos.
Depressa
o ministro, pleno de ardor,
Convoca
engenheiros e arquitetos.
E
para que Lisboa logo renasça
Erguem-se
mil prédios doutra traça.
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Grão
ministro, Sebastião José,
Chamou
a si Eugénio dos Santos.
Este
sábio arquiteto pôs de pé,
Sem
quaisquer medos nem altos prantos,
Um
plano grandioso e com fé.
Rasgou
mil ruas, praças, sem quebrantos.
Transformou
Lisboa na flor mais bela,
Mais
vistosa que a rica Compostela.
100
O
marquês de Pombal ficou zangado
Ao
ver cair ferido o seu amado rei.
Logo
acusou do vil atentado
Alguns
nobres não tementes à lei.
E
assim, em Belém, foram executados
Os
inimigos da corte e da grei.
E
logo depois, em concorrida ágora,
Foram
mostrados os corpos dos Távora.
101
Também
tombaram, depois do primeiro,
Os
filhos do casal, José e Luís…
O
conde de Atouguia, duque de Aveiro.
Mas
não digam que só fidalgos quis,
Pois
abateram, com tiro certeiro,
Quatro
plebeus e uma meretriz.
Pra
se verem livres dos parasitas
Correram
do país os jesuítas.
102
Livres
dos maus, das feias alimárias,
O
marquês à grande obra meteu mãos.
Criou
imensas escolas primárias,
Para
que houvesse espíritos sãos.
Além
daquelas eram necessárias
Escolas
para nobres e artesãos.
E
para que a tudo desse remédio
Criou
o ensino maior e médio.
103
Logo
que morre el-rei, é corrido
Pela
rainha Dona Maria Primeira;
Não
sei se o castigo foi merecido
Por
tanta culpa, tanta asneira...
Parte,
humilhado, ofendido,
Para
o norte, para a Beira.
Em
Pombal morre, olvidado,
Pelas
rodas do poder é trucidado.
104
Graças
a Pombal surgiu a Imprensa,
Dita
Imprensa Nacional de Lisboa,
Serviu
o país, de Faro a Valença,
Salvou
manuscritos de Diu ou Goa;
Reinou
no seu espírito forte crença,
Tudo
valia a pena, nada era à toa.
Cresce
o comércio, agricultura,
Torna
a vida dos povos menos dura.
105
Melhora
o exército, a marinha,
Traz
um especialista da Alemanha;
Cresce
exponencialmente a vinha,
O
milho… de Cabinda vem a sanha.
De
África vem gente de carapinha…
E
o camponês sua terra amanha.
Para
evitar confrontos com Paris,
Sujeita-se
à invasão do país.
106
Acaba
com a vil escravatura,
Somente
no continente, é verdade;
Serão
poucos passos por porventura…
No
Brasil índios ganham liberdade;
Aqui
cresce a arte, iluminura,
Dos
vetustos tempos não há saudade.
Acabam
os velhos, novos cristãos,
Em
Jesus Cristo são todos irmãos.
107
Levantou-se
no Terreiro do Paço
A
estátua de Dom José Primeiro;
É
uma homenagem, um abraço,
A
um monarca de corpo inteiro…
O
qual - apesar de seu olhar baço -
Distinguiu
o falso do verdadeiro.
Machado
de Castro, o escultor,
Lavrou
o metal com arte e rigor.
108
A
Dom José sucedeu a «Piedosa»,
Deferindo
o pedido de Pombal;
Não
quis colaborar com a tinhosa,
Ela
não queria este Portugal.
Instaurou-lhe
um processo, a ranhosa,
Expulsou-o
como se fosse animal.
Foi
para longe mais de vinte léguas,
Tratar
de porcos, cavalos e éguas.
109
Pôs
em liberdade os prisioneiros,
Aos
Távora a todos inocentou;
Tanta
piedade para os primeiros,
Os
supostos crimes lhes perdoou.
Com sentimentos nobres e porreiros
Da
má fama a todos libertou.
Reforçou
laços com a Inglaterra,
Que
mais tarde foi dona desta terra.
110
Perdeu
para espanhóis Olivença,
Que
Dinis rijamente conquistara;
Para
recuperá-la há descrença,
A
esperança é-nos bem amara...
Há
que reivindicá-la sem detença,
Pois
o tempo já é e nunca para.
Lembremos
o Tratado de Paris,
Levante-se
da cova Dom Dinis.
111
Dizem
que protegeu as Letras Belas,
Fundando
a Biblioteca Nacional;
Deixou
os fundos mares, caravelas,
Ciência
teve Academia Real;
Iniciativas
puras, singelas,
Que
honraram este Portugal...
Criou
em Lisboa a Casa Pia,
Para
as crianças sem pais nem tia.
112
Mandou
erguer Basílica da Estrela,
Na
cidade de Lisboa, capital;
Obra
perfeita, gigante, mui bela,
Que
orgulha o peito nacional;
Apesar
de pouco, tanto fez ela,
Pelo
reino chamado Portugal.
E
imensas coisas ficam por dizer,
Pois
a tanto não chega o meu saber.
113
Maldita
campanha do Rossilhão,
Que
trouxe a este país só desgraça;
Agiu-se
sem tino, só coração,
Trazendo
a Portugal fome e traça;
Perdeu-se
Olivença sem razão,
E
a independência da raça.
Vieram
os espanhóis e franceses,
A
fim de dominar os portugueses.
114
Devido
ao bloqueio continental
O
território foi invadido;
A
realeza fugiu de Portugal,
O
pobre povinho ficou perdido.
Napoleão
quis o nosso mal,
Impôs
o seu génio enfurecido.
Vieram
ajudar-nos os ingleses,
Tornando-se
mais tarde fracas reses.
115
Soube-se
depois que a velha rainha
Ficara
enferma, louca, demente;
Dizia-se
linguado ou tainha,
Lagartixa,
sapo, rã, ou serpente...
Ninguém
sabia o que ela tinha,
O
seu olhar assustava a gente;
Morreu no Brasil, nos braços do filho,
Buscando nos céus pacífico trilho.
116
Três
invasões sofreu este país…
Os
generais Junot, Soult, Massena,
Derrubaram
árvores, a raiz,
Mataram
mais do que uma centena;
O
inglês comeu-nos lebre, perdiz,
De
nós o bretão jamais sentiu pena.
Ficou
este território sem graça,
Pois
tamanha foi a nossa desgraça.
117
Dom
João Sexto, bondoso, clemente,
Ergueu
a coroa estava no Brasil;
Isso
descontentou imensa gente,
Não
vir prà metrópole era ato vil;
O
seu rei estava longe, ausente,
A
muitos quilómetros, mais de mil.
Devido
à guerra peninsular,
O
país ficou de pernas para o ar.
118
Beresford
governava a bel-prazer,
Tinha
os portugueses em sua mão;
Gozava,
pés cruzados, o lazer,
Criava
esperança, ilusão…
Ria-se
dos parvos com prazer,
Comia
nosso peixe, nosso pão.
Gomes
d’Andrade quis fazer-lhe frente,
Mas
foi abatido como serpente.
119
O
general e seus compatriotas
Foram
garrotados tais criminosos;
Riram-se
os malandros e as potas,
Choraram
os rapazes tão mimosos.
Em
Sant’Ana fecharam-se as portas
Àqueles
mártires tão orgulhosos.
Por
fim surgiu uma revolução,
Pondo
na rua o déspota bretão.
Fim da 1.ª parte
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