PROVÁVEL ORIGEM DO TOPÓNIMO PADERNE
Por Joaquim A. Rocha
Quanto
a mim, Paderne, em questão de nome, tem menos uns anos do que Melgaço. Vou
tentar explicar porquê. Tal como fiz para o primeiro caso, também vou
transcrever alguns documentos, a fim de conseguir o meu objectivo, que é
veicular uma explicação aceitável para estes topónimos. Comecemos então por
Aldomar Rodrigues Soares “Mário de Prado” (1913-1962):
[«Muito se tem dito e escrito sobre o
famoso cipo funerário (outros chamam-lhe estela de Paderne), chegando mesmo
alguns autores de antiguidades a tomar alhos por bugalhos e a confundi-lo com o
túmulo da abadessa D. Paterna e de seu marido, quem quer que este tenha sido:
conde ou plebeu, Hermenegildo ou não… / Ora eu, que estou devida e
iconograficamente documentado, e sei do paradeiro de todos eles, posso já
garantir que são coisas muito diferentes. E quem não quiser acreditar que vá
ver o tal cipo no Museu Etnológico de Belém e as duas tampas tumulares no Museu
Nacional Soares dos Reis, do Porto, para onde estas foram levadas do Museu
Arqueológico do Carmo, e onde figuram com os números 28 e 29 na respectiva
Secção Lapidar. / De resto, podia também dizer agora de como e quando as três
peças foram desenterradas na sacristia do velho Convento; de como e quando o
Dr. José Leite de Vasconcelos, fundador e director do Museu Etnológico de Belém
veio a Paderne, as viu no adro do dito Convento, as cobiçou, e diligenciou para
removê-las para aquele Museu; dos óbices e peias que o solicitador Manuel José
Nóvoas, do Outeiro, então vogal da Junta de Freguesia de Paderne,
bairristicamente teceu e forjou para que as faladas peças não saíssem dali,
etc., etc., pois tudo isso anda escrito em letra de forma. Hoje, porém, apenas
desejo arquivar nestas colunas a gravura do tal cipo funerário, na esperança de
que surja algum estudioso que, com olhos de lince e sólidos conhecimentos
nestes assuntos, consiga reconstituir a sua inscrição e dela dar-nos uma versão
convincente, pois o que sobre a mesma corre… não convence. Mas até lá nada me
impede de fazer o seu estudo e consignar aqui as minhas conclusões. / Ora esta
pedra, que é de forma irregular e mede aproximadamente 1,60 metros, 0,15 metros e
0,50 metros, respectivamente, de altura,
espessura e largura, pode dividir-se em quatro segmentos, no segundo dos quais,
num nicho superiormente recurvado, vemos duas figuras em pé que, a julgar pelas
feições e pelo vestuário, são homem e mulher. Cada uma delas segura um vaso na
mão direita e dá a esquerda à outra; e, porque a figura mutilada do primeiro
segmento é provavelmente um sacerdote* que também segura um vaso…, é de
admitir, pois, que esta cena nos represente a cerimónia dum casamento pagão,
estando, ou preparando-se, assim, sacerdote e nubentes, para fazer as libações
do ritual. / No terceiro segmento, transbordando para o quarto, vê-se a
famigerada inscrição que tantas dores de cabeça tem causado a todos quantos
dela se têm ocupado, cuja leitura, apesar dos meus conhecimentos de latim irem
pouco mais além do que os que tenho de chinês, desdobradas as respectivas
abreviaturas e depois do começo usual destes epitáfios, que geralmente abriam
com um «Diis manibus sacrum», ou com
outra fórmula semelhante, quero vê-la assim: / …Ennjus Filius Annorum C et
Compar Valerivs Compar Ard/e Annorum L Hic Situs Sunt Pentvs Compar Fecit
Caelamem (?). / Isto para vernáculo talvez se pudesse verter deste modo: «… (fulano), filho de Énio, de cem anos, e seu companheiro
Valério, esposo de Arda, de cinquenta anos, estão aqui sepultados; seu
companheiro Pento fez (ou cinzelou) esta
obra». / Será assim…? Não será…? Discutam os cabos o assunto e digam da sua
justiça, que eu, nisto, como aliás em tudo, continuo a ser praça rasa, e não
vejo jeitos de vir a ser promovido a… entendido.»]
(Este artigo, publicado
primeiramente em “A Voz de Melgaço” foi inserido no livro “Padre Júlio Vaz apresenta
Mário”, de 1996, páginas 61 e 62).
A. Freixinho diz que se
trata de um guerreiro. A ser Júpiter, de facto era apresentado por vezes como
um deus guerreiro, a grande potência tutelar do Império, em Roma como no
estrangeiro.
E
em “Religiões da Lusitânia”, volume III, páginas 567 e 568, citando São
Martinho de Dume (século VI): «E levou os rústicos a erigirem-lhe templos
com estátuas e aras, onde se derrama sangue, não só de animais mas [também] de
seres humanos.» E prossegue: «… até
deram aos dias da semana denominações diabólicas – Marte, Mercúrio, Jove (Júpiter), Vénus, Saturno».
Os monges e freiras cristãos não ousaram
destruir todos esses vestígios ou testemunhos do passado longínquo, mas
encobriram-nos, para que ninguém soubesse, além deles, que antes do
cristianismo existiram outras religiões, outros deuses, venerados por imensa
gente. A ignorância passou a ser um factor de dominação.
O nome do sítio já era muito antigo e
ninguém conseguiu modificá-lo; no entanto, pouco a pouco, a sua origem foi
sendo apagada, e em nossos dias não passa pela cabeça de nenhuma pessoa
relacionar Paderne com o deus Júpiter, a quem chamavam Paterni (pai dos deuses).
Com o advento da nacionalidade, no século XII,
houve necessidade de administrar o território, sobretudo militarmente, pois os
riscos de invasão por parte do inimigo eram muitos. Assim, Afonso Henriques,
transformou, em 1141, o território de Paderne num couto, anexando-lhe Cousso e
Cubalhão, e excluindo São Paio, que inseriu no recém-criado concelho de
Melgaço, e talvez Alvaredo, que passou para o concelho de Valadares.
O couto tinha a obrigação de defender
parte da fronteira, que se tornou perigosa (talvez seja essa a razão principal
das freiras terem saído de Paderne), conjugando esforços com outras forças, daí
os seus habitantes estarem isentos de cumprir o fossado e outros deveres,
aparentemente na forma de privilégios.
Se queremos então relacionar Paderne com
Júpiter, precisamos saber o que esse deus representava no panteão romano:
«Pai
e soberano dos deuses, deus do céu, do raio e do trovão, que reinava no
Capitólio (cidadela e templo no monte Capitolino, uma das sete colinas da
Antiga Roma), onde os triunfadores eram coroados. / Era filho de Saturno
(equivalente ao Cronos grego), primitivo soberano dos deuses, e de Reia, mãe
dos deuses, do céu e da terra. / Nasceu numa gruta em Creta, tendo sido
confiado a duas ninfas, que o alimentaram com o leite da cabra Amalteia e o mel
do monte Ida. Da pele dessa cabra fez Júpiter o broquel que usava sobre os
ombros. / A sua consorte era Juno, a mãe dos deuses.»
Sobre o Monte do Capitólio, num planalto
junto da cidadela, os etruscos projectaram e construíram em pedra o maior
templo da Itália, dedicado a Júpiter, que eles consideravam «o melhor e o maior». (Tudo isto, e muito
mais, se pode ler em “Os Romanos”, de Michael Grant e Don Pottinger, Moraes
Editores).
Existem várias abordagens para explicar o
nome Paderne. Vejamos:
1.ª
- {«Paderne era nome comum a toda a
região, incluindo a actual freguesia, e as de São Paio e Alvaredo. Parece que o
topónimo quer significar Saturno (da
palavra celta Padern). É tradição que na Cividade houve um templo pagão
dedicado a esse deus, protector da vinha e ligado à agricultura; em abono desta
tradição temos o facto de naquela povoação terem aparecido alguns capitéis e
outros ornatos, e uma estela funerária que depois de ter sido levada para o
adro do convento, onde esteve como lájea, o Dr. José Leite de Vasconcelos
levou-a em 1903 para o Museu Etnológico de Belém; esta estela apresenta num
nicho recurvado duas figuras, homem e mulher, e é rematada por um busto
decapitado segurando um vaso e a inscrição:…» (Ver mais acima o texto de
“Mário de Prado”; o autor deste naco de prosa é-me, para já, estranho).
2.ª
- «A origem do nome Paderne tem sido objecto de atenção da parte de alguns
escritores, atribuindo a sua origem a Dona Paterna, fundadora do mosteiro do
Salvador de Paderne. / Como o nome de Paderne seja mais antigo do que o
mosteiro do Salvador, alguns (…) – para fazerem prevalecer esta etimologia –
têm chegado a negar a existência de Dona Paterna, dando ao mesmo tempo como
hipótese sua filha Dona Elvira, atribuindo então a sua origem a qualquer homem
poderoso, de nome Paterno, e de preferência uma Paterna. / Esta etimologia
torna-se um tanto forçada e ao mesmo tempo repugnante. Existem em Portugal – pelo
menos – mais três terras com o nome de Paderne, e então seríamos obrigados a
dar para cada uma delas um homem poderoso com o nome de Paterno – ou, de
preferência, uma Paterna – a fim de encontrarmos a sua origem. / O nosso
“Notícias” (…) julga-se com todo o direito de reagir, apresentando a sua
opinião aos seus estimados leitores, quanto à origem do nome Paderne – nome
comum às duas freguesias de São Paio e Salvador, do concelho de Melgaço. / Os
principais lugares de habitação das tribus proto-históricas no nosso país eram
nos altos das montanhas, das quais nos restam ainda muitos vestígios que hoje
se chamam Castros, Crastos, Castrelos (…), cuja origem é pré-romana e puramente
lusitana. (Consultar “Religiões da Lusitânia”, volume II, página 79). / Perto
destes Crastos passam ordinariamente correntes de água, mais ou menos
caudalosas. Depois de percorrer todo o território pelas duas freguesias de
Paderne – examinando os seus outeiros cónicos, onde não faltam todas as
características de castros pré-romanos – ninguém pode duvidar que estes se
tornassem invencíveis por grande espaço de tempo, e que deles tirassem o nome
de Paderne. / Paderne – que
devia ser Paderna – é palavra antiga; vem do
antigo lusitano; significa lugar alto, rude, duro e invencível. / Esta
etimologia torna-se mais associável e portanto mais digna de crédito. Frei
Agostinho de Santa Maria, descrevendo a freguesia de Paderne no concelho de
Albufeira, Algarve, diz o seguinte: «Para
a parte do ocidente, em distância de duas léguas, se vê o lugar de Paderna, a
que outros erradamente chamam Paderne, por outro título semelhante que tem um
lugar entre Douro e Minho, no arcebispado de Braga.» / Tornando à origem do
nome Paderne, concluímos que este era comum ao território ocupado pelas duas
freguesias, e portanto muitíssimo anterior aos seus mosteiros – ainda mesmo ao
de São Paio – e que estes tomavam o seu nome da terra onde foram construídos. /
Quanto à existência de Dona Paterna e sua filha Dona Elvira, fundadoras do
mosteiro do Salvador de Paderne – [tese] impugnada por alguns – torna-se um
facto acreditável, pois tudo quanto nos dizem as histórias do mundo nos vem
pela boa-fé que lhes damos. / (…) / As pedras do venerando mosteiro (…) são
outras tantas páginas que nos falam da sua nobre fundadora. / Pinho Leal fala
das pedras da sepultura dos dois cônjuges – o conde Hermenegildo e sua esposa
Dona Paterna – mencionando duas sepulturas com tampa de pedra, uma com uma
estátua de um guerreiro em baixo relevo e outra com a figura de uma mulher,
também em baixo relevo, cujos restos arqueológicos desapareceram do mosteiro de
Paderne para irem figurar nos museus de Lisboa. / Ainda alguns escritores,
ingratos para com o paladino de Tui – negando a sua existência – chegaram a
confundir este com outro conde Hermenegildo (*), vencedor do conde Witiza, no
tempo de Afonso III, o Magno «sic transit gloria mundi».} / (A.
Freixinho, in “Notícias de Melgaço” n.º 894, de 3/4/1949).
(*) O
vencedor de Witiza chamava-se Ruderico (Roderico, Rodrigo) e não Hermenegildo
(ver “História da Civilização Ibérica”, de Oliveira Martins, página 111).
3.ª - «Chama-se de Paderne conforme um manuscrito
antigo de Dona Paterna, mulher de Dom Ramiro, rei de Leão, primeira Senhora
desta terra, ou conforme alguns de Dona Paterna, mulher de Dom Hermenegildo,
conde de Tui; antigamente se chamava Paterna esta terra e agora com alguma
corrupção do nome se chama Paderne.»
Nota: Quem isto escreveu foi o pároco da
freguesia, em 1758, em resposta a um inquérito nacional, que tinha por
objectivo elaborar um dicionário geográfico do país. (Ver “As Freguesias do Concelho de Melgaço Nas Memórias
Paroquiais de 1758”, página 166).
4.ª - «Houve
aqui um mosteiro de cónegos regrantes de Santo Agostinho, fundado pela condessa
Dona Paterna, viúva de Dom Hermenegildo, conde de Tui, numa sua grandiosa
quinta, que possuía nestes sítios, com outras propriedades e aldeias. Fundou o
mosteiro para nele se recolher com suas quatro filhas, e outras nobres senhoras
de Tui, que as quiseram acompanhar. / Em 6/8/1130, estando as obras concluídas,
foi sagrada a igreja do mosteiro pelo bispo de Tui, Dom Paio, que também nesse
dia o dedicou ao Salvador, e lançou à condessa, suas filhas e mais
companheiras, o hábito das cónegas de Santo Agostinho. Mandou para confessores
e capelães sete clérigos que em 1138 se fizeram regulares da mesma ordem,
vivendo em comunidade. A condessa lhes mandou fazer claustros, dormitórios,
celas e mais oficinas, do lado do sul da igreja, que os dividia das freiras,
que ficavam ao norte. (*) A fundadora foi a primeira prioreza das freiras, e
Dom Ramiro Pais o primeiro prior dos religiosos. / A povoação tomou o nome de Paterna, que depois se corrompeu em Paderne,
porque ao mosteiro se dava o nome de mosteiro
de Paterna. Não se sabe quando deixaram de existir aqui freiras, mas
sabe-se que em 1248 só havia frades, tendo por prior Dom João Pires, grande
partidário de Dom Afonso III, pelo que este monarca fez grandes doações ao
mosteiro, concedendo-lhe muitos privilégios. O mesmo prior, sendo a igreja
muito pequena e antiga, a mandou demolir em 1264, construindo-se outra, que foi
sagrada em 6 de Agosto deste ano, pelo bispo de Tui Dom Emígdio.» (“Dicionário
Histórico, Biográfico, Bibliográfico, Heráldico, Corográfico, Numismático e
Artístico.” / João Romano Torres – Editor. 1903).
(*) {«… A
nostalgia devia ser, porém, natural em anos tão verdes e por isso o bispo
mandou logo para confessores e capelães, do piedoso redil das cónegas, sete
clérigos, que a crónica diz serem de boa vida; e tanto de boa vida ali se deram
que oito anos depois se faziam regulares sob a mesma regra de Santo Agostinho,
vivendo em santa comunidade – entre si, entenda-se – que não vá a malícia do
leitor supor que era em comunidade com as cónegas gentis. // (…) Em 1140
faleceu a prioreza e foi sepultada numa capela-mor, ao lado do Evangelho, tendo
em meio relevo a sua figura sobre a tampa do sarcófago. Junto a ela, em meio
relevo também, está a figura dum guerreiro, que se supõe ser o conde Dom
Hermenegildo. A inscrição deste túmulo está ilegível, por muito gasta. / No
priorado sucedeu-lhe sua filha, Dona Elvira, à qual Dom Afonso Henriques doou o
couto de Paderne em 1141, dizendo nessa doação: «lh’a fazia pelos bons serviços
que lhe fizera quando ele estava sobre o castelo de Castro Laboreiro, a quem
tinha cercado, mandando-lhe mantimentos e alguns cavalos, entre eles um muito
formoso e jaezado ricamente para a sua pessoa.»} (ver “O Minho
Pitoresco”, páginas 33 e 34).
5.ª - {«Assim,
deixou claro (o padre Bernardo Pintor)
que o nome de Paderne deriva do patronímico Paterni e que a origem deste mosteiro nada tem a ver com Dona
Paterna, viúva do conde de Tui, Dom Hermenegildo, por alguns considerado também
conde do Porto, e que a identificação da abadessa, Dona Elvira Sarrazins, como
filha de Dom Hermenegildo e de Dona Paterna não passa de uma confusão e
transferência abusiva, que a própria distância cronológica não consente, com os
dois nobres fundadores do mosteiro do Sobrado, da diocese de Iria, próximo de
Santiago de Compostela, nos meados do século X ou, mais concretamente, em 952.
Vejamos as suas próprias palavras (do padre Bernardo Pintor): «De também o mosteiro de Paderne ser dúplice
[freiras e monges] nos seus
princípios, ser dedicado ao Divino Salvador e ter à sua frente em 1141 a
abadessa Dona Elvira, deveu surgir, em época posterior, a confusão de fazer
esta dita abadessa filha de Dom Hermenegildo e de Dona Paterna.»} (Ver Professor Dr. José Marques, “O Cartório
e a Livraria do Mosteiro de Paderne em 1770”, Boletim Cultural da Câmara
Municipal de Melgaço, número 1, páginas 11, 13 e 19).
6. ª - {«Parece tratar-se de topónimo do norte, pois (…) encontra-se com muita
frequência na Galiza: Corunha, Lugo (vários casos), Ourense, Pontevedra. Também
está na província de Oviedo, aqui, ao lado de Paderni; na Corunha também temos
Paderno; Padierno em Salamanca; nesta e em Ávila há Padiernos; Paderna na
Galiza (Lugo) e Paterna
na província de Valência; Trespaderne, em Burgos; o carácter setentrional do
topónimo algarvio talvez se possa também verificar pela presença de p-; este é
Paterna em 1267 (Portel, p. 40); no Algarve aparece sempre Paderna (II,
3; VII, 2, 3, 11), mas Paderne no «De Itinere Navali», etc., na
Relação da Derrota Naval, façanhas, e sucessos dos cruzados que partiram do
Escalda… (Lisboa, 1844), página 43. Em Clarimundo está Paderne (III, p.
97).
Notar agora o (casal de) Paderni em texto de 1258 (Inquirições, página 361).
Notar em 1125: «ecclesiam Sancti Pelagij de Paterni integram in ripa Minei…»
(D.M.P., I, p. 89). Tratar-se-á de Paterni (villa), genitivo
do antropónimo masculino Paternu-; no caso de Albufeira podemos ter uma
transplantação toponímica ou mais um exemplo do e, final, devido à articulação
meridional. O antropónimo Paterno tinha algum uso, devido talvez ao célebre
santo do mesmo nome (séculos IV e V), o mesmo que, por ser orago de templo, deu origem ao santo Paderno, em Melgaço.
Como se verifica, na toponímia também há vestígios do respectivo feminino, como
o próprio nominativo Paternus.»} (José
Pedro Machado, “Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa”,
páginas 1114 e 1115).
O mesmo autor lembra, no dito Dicionário, página 1114, o Monte da
Paderna, sito em Odemira. Acha que é uma adaptação de Paderne «tratando-se, como parece, de alusão a mulher
do local, oriunda de Paderne…»
No “Dicionário de Santos”, de Jorge Campos
Tavares, fala-se do santo Paderno, o qual terá nascido cerca de 480 e foi bispo
de Avranches, cidade da Normandia; fez apostolado no Cotentin e fundou, perto
de Granville, o mosteiro de Saint-Pair-sur-Mer. / Como as mordeduras de
serpente não o afectavam, é evocado quando alguém é atacado por cobras.
*
Depois do que ficou acima escrito, muitos leitores perguntarão: «Mas como é que os romanos, ou pessoas
romanizadas, vieram parar ao território do nosso Alto Minho?» A explicação
é relativamente simples e tem a ver com a história do Império Romano. Os
fenícios vieram até aqui por motivos comerciais; os legionários vieram para a
Península Ibérica a fim de lutar contra os cartagineses que ameaçavam Roma. Os
soldados, depois de anos de lutas intensas e desgastantes, passavam à situação
de reformados e era-lhes oferecido pelos generais terras que iam conquistando
no seu percurso. Os romanos, segundo nos ensina a História, sempre gostaram da
agricultura. A guerra era somente um episódio nas suas vidas. Como tinham as
armas, a força, podiam escolher para si as melhores quintas. E de facto
escolheram: os terrenos perto do rio Minho, férteis e adubados pela natureza,
com temperaturas amenas, com chuvas abundantes. Em Cristóval, Paços, Chaviães,
vila de Melgaço, Prado, Remoães, Alvaredo, Penso, São Paio e Paderne, tudo lhes
pertenceu em determinada altura. Quanto às terras mais altas: Fiães, Castro
Laboreiro, Lamas de Mouro, Gave, Parada do Monte, etc., não sei, julgo que não
lhes deve ter interessado por aí além.
Quanto a mim, alguns desses antigos
legionários fixaram-se no sítio que é hoje Paderne e aí construíram as suas
casas e quintas, as famosas «villa». Com eles trouxeram a sua religião, como
todos os emigrantes fazem. O culto ao deus Júpiter estava generalizado, era
quase como os cristãos em relação a Jesus Cristo. Rapidamente lhe devem ter
construído um templo e esse local, e arredores, ficou a ser conhecido por Paterni, em homenagem ao pai dos
deuses, tal como acontecera com Melgaço séculos atrás. Tinham trazido também a
sua língua, o latim, que se espalhou por toda a península, salvo raras
excepções, apagando do mapa quase todos os outros idiomas. Dialectos com mais
de oitenta mil anos pura e simplesmente desapareceram! Restou o vasconço,
língua ainda hoje falada.
Depois, no século V, chegaram à Península
Ibérica os chamados povos bárbaros: vândalos, do norte da Jutlândia; suevos,
também germanos, da bacia do Elba, os quais fundaram o reino da Galécia, que
durou até 585, cuja capital era Braga, tendo-se convertido à fé católica;
alanos, vindos do Cáucaso e do nordeste da Rússia; visigodos, ramo ocidental
dos godos, vindos das planícies do Dniepre, rio da Rússia, Bielorrússia e Ucrânia,
de religião ariana, aceitando o catolicismo no século VI, os quais foram
derrotados pelos muçulmanos no ano de 711, na famosa batalha de Guadalete,
todos eles se espalhando por toda a parte, misturando-se alguns deles com os
autóctones, e a religião dos romanos, e não só, pouco a pouco, sumiu-se! Deles,
romanos, ficou a língua, as suas leis, os seus métodos administrativos, as suas
técnicas agrícolas. O nome Paderne conservou-se, felizmente, até nossos dias.
Ali perto os cristãos criaram a freguesia de São Paio, em homenagem ao santo
Pelágio, e construíram imensas igrejas e capelas, esquecendo-se tudo que para
trás ficara. Só graças à arqueologia é que se vai descobrindo, aqui e ali,
vestígios, as ruínas do passado.
E por falar nisso, agora, que
se fala tanto em turismo cultural, por que é que não se investe mais em
escavações, Governo e Câmaras Municipais, a fim de se trazer à luz do dia esses
legados de civilizações antigas? Quase todo o velho concelho de Melgaço
esconde, disso tenho a certeza, imensas riquezas arqueológicas. Quem se
esqueceu já do que se encontrou, por mero acaso, quando se construía, há uns
anos atrás, a estrada nova? Praticamente está tudo por fazer neste pedacinho de
Portugal. Na minha perspectiva, um povo que ignora o seu verdadeiro passado é
um povo inculto. É necessário dar à lenda o que é da lenda; e à História o que
lhe pertence por direito.
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