quarta-feira, 25 de março de 2015

AO SABOR DO VENTO


Deambulei por Melgaço,
tudo o que vi registei;
percorri, passo a passo,
o paraíso de Tasso,
o berço da nossa grei.

Olhei para Espanha e vi
incêndios e mais incêndios;
as chamas, tal colibri,
brilhavam, como quem ri,
num festival de dispêndios.

As nossas serras, peitadas,
criminosas, Barrabás…
vestiram roupas aladas,
subiram céus, encantadas,
bailaram c’ as fadas más.

Vi a Fonte do Jordão
abandonada, sozinha;
por que lhe chamam, então,
a Fonte de São João,
assim tão desprezadinha?!

A Rua Nova de Melo
desapareceu por magia;
houvera nome singelo,
e por isso, o camartelo,
não a poupou na razia.

E o Largo da Calçada
mudou de nome também;
é agora a Praça Fina
da senhora e da menina,
do “fidalgo” sem vintém.

A pedra do velho abade
nas Carvalhiças dormece;
de que nos vale ser padre,
arcipreste, ou mesmo frade,
se, na morte, o povo esquece?

E as aldeias, tristinhas,
dormem sono repousante;
tendo silvas por vizinhas,
na primavera andorinhas,
e no verão o emigrante.

Vi a morte arrebatar
um homem novo ainda;
estava o sol a brilhar,
e na janela a cantar
uma jovem muito linda.

Fiquei triste, porque não,
por vê-lo partir tão cedo;
homem de bom coração,
mas frágil como a ilusão,
e leve como um segredo.

Vi a Casa da Cultura
cheia de livros e quadros;
vi sorrisos com fartura,
cortesia e mesura,
mas os ditos bem fechados.

As belas Termas do Peso
num silêncio sepulcral;
como menino indefeso,
no meio de lume aceso,
esperando o pai natal.

O comércio moribundo,
os balcões sem clientes;
ao rio não vi o fundo,
porque está sujo, imundo,
com suas águas doentes.

Vi tudo isso e vi mais,
que não interessa narrar;
o Convento de Fiães,
as muralhas medievais,
as velhas a namorar.

Novos vícios verdejando,
num chão tingido de lodo;
almas simples rastejando,
já tossindo e rouquejando,
alvos fáceis do engodo.

Mas esqueçam, por favor,
tudo o que acima escrevi;
foi num impulso criador,
num frenesim estupor,
pois nada disso eu vi!

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