quarta-feira, 12 de novembro de 2025

SONETOS DO SOL E DA LUA 

Por Joaquim A. Rocha





O VÍRUS

 

Sou a praga enviada por Jeová,

Rei dos deuses, senhor do universo,

Não nascido em cama nem em berço,

Irmão de Zeus, Júpiter, de Alá.

 

Minha índole é boa e má,

É a medalha e o seu reverso…

Nunca tenho sonhos, nem adormeço,

Quando aqui estou também estou lá.

 

Sou o senhor dos mundos ancestrais,

Todos me obedecem: bravos, serenos;

Padres, cónegos, bispos, cardeais…

 

Gigantes, anões, grandes e pequenos, 

Plantas, pedras, todos os animais,

Mar agitado, mil oásis amenos.

 

 *

  

UM NOVO DIA

  

Nasce o sol, vai-se a noite, vem o dia,

No cosmos os corpos se esconderam;

Esperanças e luzes se acenderam,

Mas no meu peito a dor permanecia.

 

Meu coração, febril, forte batia,

Velas de um navio que romperam,

Ilusões que jamais se recuperam…

Marinheiro que no mar alto morria.

 

Não há luta, nem resiliência,

Tudo ferve no caldeirão da morte;

Eu, no reino calmo da paciência,

 

Liberto pra sempre das leis da sorte,

Choro em silêncio a minha ausência,

Meu pobre destino, o meu desnorte.

 

 

O ALFERES

 

Revi nas densas matas africanas

Um vilão com a patente de alferes;

Chamava-se João Maria Peres,

Mais gingão do que chicas sevilhanas.

 

Descendia de fêmeas arianas,

De uma tribo de estranhíssimos seres;

Comiam com as mãos, não com colheres,

Liam nossa sina, como as ciganas.

 

Era esbelto, como uma pantera,

Mas seus dentes eram de javali;

Tinha os olhos de autêntica fera…

 

A pistola, da cor do colibri,

Brilhava como luzidia esfera

Nas terríveis florestas do Mali.


 *

 

TRANSFORMAÇÕES

 

Jesus transformou a água em vinho,

Tasqueiro converte vinho em água;

Dalila transforma alegria em mágoa,

O valente Sansão em cordeirinho.

 

E até um regato ou o rio Minho,

No verão autêntica frágua,

Deslizando como uma frágil tábua,

Afoga em seu leito um rapazinho.

 

E eu, sonhando sonhos maus, ruins,

Cavalgando estrela escaldante,

Montado em dragões, anjos, serafins,

 

Percorro, no colo da vil amante,

Ao som de concertinas, cornetins,

O mundo de Júpiter, deus tonante. 


// continua...


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