terça-feira, 31 de maio de 2022

 OS NOVOS LUSÍADAS (...) 

Por Joaquim A. Rocha


// continuação de 8/03/2022...


55

 

Voltemos a esses reis prepotentes,

Beis do mundo, senhores absolutos,

Donos de mil burgos, das suas gentes,

Ágeis, cruéis, velhacos e astutos;

Sempre irritadiços, descontentes,

Horríveis, sanguinários, brutos.

Deram-lhes bons cognomes os cronistas

A fim de iludir o povo, suas vistas.

 

56

 

Dom João, inspirado, genial,

Olhando as mil riquezas da terra,

Subido tesouro, manancial,

Abandona o mar, deixa a guerra,

Torna o casto Brasil colossal,

Uma fase da história encerra.

Divide tudo  em capitanias,

Tomé Sousa foi David e Golias.

 

57

 

Distribuiu as terras por colonos,

Todos eles de origem portuguesa,

Tornando-se assim verdadeiros donos,

Descobrindo ouro, criando riqueza;

Vendo belos pássaros, feios monos,

Esquecendo os mares da incerteza.

Ganhando à terra terno amor,

Cultivando-a com ganas e suor.

 

58

 

Pagavam à coroa certos direitos,

Dinheiro que enchia cofres do Estado,

Fazendo crescer os fortes peitos

De fidalgos e do rei endeusado;

Erros crassos e enganos desfeitos,

Tudo pertencia agora ao passado.

Fundou-se a cidade São Salvador

Em honra do Santíssimo Senhor.

 

59

 

O Brasil cresceu como um gigante,

Transformando-se quase continente;

E se para o rei era inconstante,

 Era querido de imensa gente.

Por isso, de repente, num instante,

Criou asas, tornou-se independente.

Pulmão do mundo, mil rios, floresta,

Alimenta todo um povo em festa.

 

60

 

Vai para Coimbra a Universidade,

Contrataram distintos professores,

Pois o saber não tem tempo, idade,

Apenas curiosos e cultores...

Nascem por mercê novas faculdades,

Estatutos novos, muitos doutores.

Para que nas urbes não surja inveja

Prometem-se outras para  Faro e Beja.

 

61

 

Vêm do estrangeiro sábios mestres,

Ensinar aos lusos novas ciências;

Não vêm doutro planeta, são terrestres,

Mas no lauto saber são excelências,

E no comportamento são pedestres,

As vaidades neles são excrescências.

Ensinam também novas técnicas e artes

Para que aqui conste e noutras partes.

 

62

 

E pra que nada falte a este país

Vem de Roma a Companhia de Jesus;

Trazem na bagagem projetos de raiz,

O ensino gratuito, muita cruz;

Pregam na capela, igreja matriz,

Onde haja pouca ou muita luz.

Destaca-se São Francisco Xavier,

Divulga o seu credo a quem quiser.

 

63

 

Nóbrega e Anchieta vão para o Brasil,

A fim de divulgar a sua fé;

Convertem índios, cem ou mil,

Brancos, que por ali andam a pé;

Nos seus bolsos apenas um ceitil,

Caminham a favor, contra a maré.

Outro grande herói, Leonardo Nunes,

Nunca deixou os hereges impunes!

 

64

 

Dom João, para manter o império,

Devido às gigantescas despesas,

Lançando aos céus duro vitupério,

Prometendo mundos, novas proezas,

Deixa em África cair fortalezas,

E tudo o mais que é pra nós mistério.

Ganha-se na China a bela Macau,

Em São Tomé produz-se o cacau.

 

65

 

Por essa altura, um matemático,

Pedro Nunes, assim era chamado,

Investigador, mestre catedrático,

Em Alcácer do Sal (Setúbal) nado,

Com seu espírito calmo, fleumático

Inventa o nónio, mui gabado…

Interessa-lhe também medicina,

E outras ciências que ensina.

 

66

 

Deste reino, foi cosmógrafo-mor,

Sabia lógica e metafísica;

Em tudo ele era o maior,

Curava males, a terrível tísica...

Conhecia os mil astros de cor,

Estudava a química e física.

Na cidade de Coimbra morreu,

Até hoje ninguém o esqueceu.


 67

 

O rei João gerara nove filhos,

Mas nenhum deles lhe sobreviveu;

Isso provocou guerras e sarilhos,

O neto não era inda corifeu;

Surgiram imensos cadilhos,

Invocou-se a virgem, o santo céu.

Sebastião tinha apenas três anos,

Era inda na idade dos enganos.

 

68

 

Regeu em seu nome Dona Catarina,

Viúva do rei Dom João Terceiro,

Que já não era nenhuma menina,

Nem sabia como governar o reino.

Portou-se como uma frágil bonina,

Sem qualquer saber, sem mínimo treino.

E pra que tudo não caísse a pique

Subiu ao poder seu tio Henrique.

 

69

 

Neste reinado tomou-se Damão

À velha Índia, cheia de mistérios;

 Rio de Janeiro nasceu da paixão,

Desse povo de honestos e galdérios;

Cresceu como a espiga no verão,

Tornou-se capital do novo império.

De longe Camões trouxe um tesouro,

Mais valioso do que prata ou ouro.

 

// continua...

Sem comentários:

Enviar um comentário