terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

OS NOVOS LUSÍADAS
 



 

 16

O tabaco passou a dar dinheiro,

Luís Goes trouxe até nós a planta;

Foi ele aqui de facto o primeiro,

Mas em Espanha já ninguém se espanta.

Espalhou-se pelo mundo inteiro,

A todos agrada, muitos encanta.

Em Lisboa, a Farmácia Real,

Cultivava-o pra nosso bem e mal.

 

17

 

Tornou-se numa coisa milagrosa,

Curava tudo, até enxaquecas;

Não se dava conta quão perigosa

Era a planta dos maias e astecas…

O cheiro, o fumo, pose vistosa,

Criaram templos, crentes, novas mecas.

Desenvolveu-se a praga, o vício,

Atingindo o próprio deus Lício.

18

 

Fuma pobre, rico, remediado,

O dono das terras e seu caseiro;

Fuma patrão, esposa, e criado,

O alfaiate e o sapateiro…

Na tasca, loja, em todo o lado,

Sorvo fumo como tripa em fumeiro.

Cachimbo, rapé, ou o vil cigarro,

Provocam o aflitivo catarro.

 

19

 

Pelo sertão entraram garimpeiros,

Famintos de vis metais preciosos;

Malta sem trabalho, aventureiros,

Todos eles rudes, gananciosos.

Vendiam a alma por trinta dinheiros,

Terríveis mentes, olhos capciosos.

Ai que corja aquela, tão matreira,

Mais feroz do que a fera verdadeira!

 

20

 

E para que serviu tanto metal,

Tanto ódio, tanta vil matança?

Riqueza sem controlo é letal,

Rói em todos nós a doce esperança.

O bem sucumbe perante o mal,

A justiça falece na balança.

E não há céu que tal obra suporte,

Por isso, por sentença dá a morte.

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