quinta-feira, 1 de setembro de 2022

OS NOVOS LUSÍADAS (...)

Por Joaquim A. Rocha


// continuação de 31.05.2022...

 

                                   70

 

«Os Lusíadas», obra monumental,

São apresentados ao jovem rei,

Que os lê como se fora missal;

Ele não sabia, e nem eu sei,

Se a leitura lhe fez bem ou mal,

Se o engrandeceu perante a grei.

Meteram-lhe bichinhos na cabeça,

Louvores que eu duvido que mereça.

 

71

 

Foi crescendo assim o jovem monarca,

No meio de santinhos e padrecos,

Lendo Santo Agostinho e Petrarca;

Ouvindo sermões de sacerdotes recos.

Sonhando imprimir a sua marca,

Criando um exército de tarecos.

Ansioso por seus dotes exibir

Cai na batalha de Alcácer-Quibir.

 

72

 

Era inda uma alegre criança,

Solteiro, sem prole ou descendente;

Um pobre seguidor, um Sancho Pança,

Deixando este país dependente.

Da Espanha um Filipe avança,

A fim de substituir o rei ausente.

E pra que se cumpra o seu desejo

Manda as suas tropas num lampejo.

 

73

 

Dom Sebastião não é o desejado,

Não voltará jamais da sua cova;

Pelo povo será sempre desprezado,

Pela terrível, monumental sova.

Do seu exemplo, outrora glorificado,

Pouco resta, ou nada sobra.

Descanse em paz onde quer que esteja,

 Pois a sua obra ninguém a inveja. 

 

74

 

Sucedeu ao rei, o seu velho tio,

Cheio de achaques, nervoso, doente;

Em pleno verão tremia de frio,

No inverno andava nu e fervente.

O padre não tem réstias de cio,

Um ser amorfo, amostra de gente.

Pra não duvidar da sua fraqueza

A morte o levou na correnteza.

 

75

 

Convocou as cortes de Almeirim

No ano de mil quinhentos e oitenta.

Cristóvão de Moura, português ruim,

Mais porco do que uma suja sebenta,

Traiu o país, em troca de marfim;

E numa triste atitude nojenta

Pôs-se ao lado do rei espanhol

Como se fora trapo, vil lençol.

 

76

 

Porém, o velho cardeal Henrique,

Não cedeu a truques, mil corrupções,

Não quis beber do belo alambique,

As lindas frases, pérfidas canções.

Assistiu calmo ao forte despique,

Sem ceder a enganosas ilusões.

Morreu sem coisa alguma decidir,

Antes que alguém lho viesse exigir.

 

77

 

Logo apareceram candidatos

Ao rendoso lugar deixado vago.

São Catarinas, Filipes, os Cratos,

E até, do oriente, um rei mago!

Mas, entre lobos, camelos e gatos,

E com a ajuda do Santo Iago,

Veio de terras de Espanha o “Prudente”,

Para enganar a nossa incauta gente.

 

78

 

Da Ilha Terceira há oposição,

Mas tão fraca, sem qualquer consistência,

Que uma esquadra, só com um canhão,

Destruiu toda aquela resistência.

Prior do Crato, já sem ilusão,

Rende-se à óbvia evidência.

E com ele levou toda a esperança

Ao retirar-se vencido para França.

 

79

 

E os três Filipes que por má sorte

Foram reis deste malo Portugal,

Destruindo o sul e todo o norte,

Fazendo pouco bem e muito mal...

Causando a tantos a vil morte,

Ferindo a honra do luso leal.

A eles dar-lhes-ei como sentença

O esquecimento e a fraca tença.

 

80

 

Filipe primeiro para se vingar

Dos ingleses, seus grandes inimigos,

Manda uma armada avançar

- Apesar dos numerosos perigos -

   Por esse imenso, bravíssimo mar,

Dando aos tubarões gulosos presigos.

Pois a tal, que diziam invencível,

Tornou-se, em segundos, perecível!

 

81

 

Seguiu-se o segundo e o terceiro,

Filipes de seu nome de batismo.

E para que o último fosse o derradeiro,

- Seguindo a lógica do atavismo –

João, o quarto, luso verdadeiro,

Numa alta onda de portuguesismo,

Escorraça do solo lusitano

O vero inimigo, o vil tirano.

 

82

 

O rei foi alvo de conspiração,

Gerada pela duquesa de Mântua,

Julgando-se com direito à ração,

Mais comilona do que um gargântua;

Porém, foi expulsa desta nação,

Cúmplices transformados em tarântulas.

Os duques de Armamar e de Caminha

Tiveram a morte como convinha.

 

83

 

Outra conspiração aconteceu,

Era Corpo de Deus, um feriado;

Domingos Leite, um pobre plebeu,

Por dinheiro imundo, conspurcado,

Renegando a fé, o doce céu,

Foi o braço desse vil atentado.

Tudo lhe correu mal, não teve sorte,

Por isso o desfecho foi a morte.

 

84

 

Adveio a guerra da Restauração,

Que terminou trinta anos mais tarde.

Lutou-se com cabeça, coração,

Durante longo tempo o fogo arde;

Houve mil vitórias, ilusão,

Milhares de mortos, que Zeus guarde.

Assinam por fim tratado de paz,

Que a espanhóis e lusos satisfaz.

 

85

 

Reconquistou-se Tânger, São Tomé,

Inda mais longe a rica Angola,

Que Holanda houvera de má-fé,

Sem tiros de espingarda, ou pistola.

Pernambuco, e Maranhão até,

Voltaram ao país não por esmola.

E a linda Baía, a desejada,

Quis ser portuguesa, muito amada.


// continua...










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