terça-feira, 13 de setembro de 2022

MELGACENSES ILUSTRES 

Por Joaquim A. Rocha



      Há pouco tempo a Câmara Municipal de Melgaço atribuiu o nome de uma rua ao Prof. Dr. José Marques, natural da freguesia de Rouças. Essa atribuição foi justíssima porque o Professor José Marques era um grande melgacense. Todos devemos ter orgulho nele, na sua excelente obra de historiador. Existem também alguns nossos conterrâneos cuja obra e prestígio merecem alguma reflexão por parte da Câmara, sobretudo pelo seu presidente, homem culto, detentor do pelouro da cultura. Apresento aqui como exemplo o escritor Barros Ferreira, nascido na vila de Melgaço, Óscar Augusto Marinho (pai), nascido também na vila de Melgaço, Manuel Félix Igrejas, igualmente nascido na vila de Melgaço, Eurico Crispim, nascido em Paços em 1898, etc. Quanto a mim, nas ruas da vila, sede do concelho, devem figurar os nomes destas pessoas ilustres, melgacenses, e não nomes como Afonso Costa, antigo ministro republicano, e de outras pessoas que - embora tenham nascido em Melgaço - nada ou pouco fizeram pelo prestígio da nossa terra. // Segue uma pequena biografia de Mestre Morais, ingloriamente esquecido.      


MORAIS, Manuel (Maestro). Filho de João Lúcio Rodrigues de Morais, sapateiro, e de Maria Besteiro, doméstica, moradores no lugar da Portela de Paderne. Neto paterno de Francisco António Rodrigues de Morais e de Mariana Rodrigues; neto materno de Manuel José Besteiro e de Maria Joana de Castro. Nasceu em Paderne a 4/4/1890 e foi batizado no dia seguinte. Padrinhos: os seus avós maternos, rurais. // Ainda criança, partiu para a Casa Pia, em Lisboa, onde aprendeu música e tirou o Curso Comercial. // Ingressou no exército, e depois na marinha de guerra, onde chegou a 1.º sargento músico. // Em 1921 foi reformado, talvez por motivos de saúde. Veio então para Melgaço, onde dirigiu várias bandas musicais com enorme êxito. Soube transmitir a sua arte a muitos melgacenses e deu enorme prestígio ao concelho. Quer na Galiza, quer no norte de Portugal, toda a gente gabava a banda de Mestre Morais. A imprensa nunca lhe regateou elogios, e bem merecidos que eles eram. Por falta de dinheiro, e de iniciativa, não se gravaram as suas maravilhosas interpretações, pelo que à medida que aqueles que o conheceram vão morrendo a sua memória vai-se esfumando, e daqui a algum tempo, não longínquo, ninguém saberá que o extraordinário Mestre Morais existiu. É pena que se torne efémero, até mesquinho, aquilo que um dia foi grandioso e agradável. // Casara na 6.ª Conservatória do Registo Civil de Lisboa, a 12/10/1919, com Dina dos Santos Lima, divorciando-se por sentença de 20/7/1924, transitada em julgado no 2.º juízo de Direito da 2.ª Vara Cível de Lisboa, Cartório do 1.º ofício, com fundamento no n.º 42 do art.º 4.º do decreto de 3/11/1910. // Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 26, de 18/8/1929, acerca da festa de Santa Ana, realizada em Paços a 11/8/1929, domingo: «… os festeiros, e toda a freguesia, receberam um desgosto por o Sr. Morais abandonar a banda dos B.V.M. neste dia e, como alguns diziam, a festa não foi honrada com a afamada banda, mas sim com a antiga Música Nova.» // Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 165, de 18/9/1932: «Banda dos BVM. Consta-nos que se estão entabulando démarches para voltar a reger esta banda o senhor Manuel Rodrigues de Morais que há tempos deixara a sua direção e regência artística. Muito folgamos que o senhor Morais, que é um excelente profissional, volte a exercer as suas antigas funções, pois que a ele se deve o grau de prosperidade que a banda teve, visto que com elementos dispersos soube coordená-los, fazendo-lhe granjear os melhores créditos, tendo tido enormes aplausos fora desta terra onde concorreu. Oxalá que cedendo todos um passo para o fim de o senhor Morais voltar à regência da banda, se apaguem ressentimentos para que Melgaço continue a ter um belo ornamento musical.» // Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 174, de 27/11/1932: «Causou uma bela impressão a nova entrada para a regência da banda dos BVM do senhor Morais, digno 1.º sargento músico da Marinha de Guerra

     A 2/2/1933 já dirigia a banda de música dos Bombeiros Voluntários de Melgaço; nesse dia animaram a festa da Senhora das Candeias, em Remoães; no dia seguinte abrilhantaram a festa da Senhora da Orada, na Vila (Notícias de Melgaço n.º 182, de 5/2/1933). // A 30/5/1937, morador no lugar de Bacelo, Paderne, é exequente num processo em que são executados o seu cunhado, António Pereira, e sua mulher, Júlia Rodrigues de Morais, irmã do maestro, lavradores, residentes no mesmo lugar; nesse dito dia iriam à praça alguns bens do casal citado «para pagamento da quantia de 3.200$00.» (*) Matrimoniou-se em segundas núpcias, na igreja de Paderne, a 19/3/1947, com a sua sobrinha, Emília Alves de Castro, de quem teve geração. // Em Junho de 1947 deixou, por motivos de saúde, de reger a banda de música dos BVM (NM 820, de 15/6/1947). // Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 911, de 18/9/1949: «Por ter sido convidado a dirigir por algum tempo uma banda de música em Abreiro, distrito de Bragança, seguiu para aquela localidade o senhor Manuel Rodrigues de Morais que, por muitos anos, com reconhecida competência profissional, foi regente da afamada banda dos BVM.» // Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1427, de 25/2/1962: «Local publicada na última Terra Minhota deu a saber aos melgacenses encontrar-se desde há dias à frente da banda municipal de Monção o hábil regente, senhor Manuel Rodrigues de Morais, que tantos anos ajudou a engrandecer Melgaço regendo a nossa banda. Desprezaram-lhe a habilidade artística e a capacidade musical os seus concidadãos e cavaram-lhe o desprestígio os que da música apenas quiseram saber quando eles próprios a transformaram numa serva e como serva submissa a fizeram servir às suas tolas vaidades ou dela se utilizaram pelo preço da chuva nas suas festas, que o povo do concelho ou das freguesias tinha obrigação de pagar. Foi por isso que há muito afogaram a banda num charco letal os que tinham obrigação de a amparar como o melhor e mais barato elemento de propaganda da terra e como um grande fator de cultura popular. Não souberam então o que fizeram e o mesmo sucedeu agora com quem ultimamente a ressuscitou, pois em vez de imporem uma disciplina de ferro a esse núcleo de pequenos artistas, fizeram logo do regente um criado dos músicos. E como o carro se pôs à frente dos bois, o resultado foi este e a que por estar à vista de toda a gente, mais nenhum comentário fazemos. Que infeliz terra esta onde a prosápia tanto medra e tão grande mal faz! Ao que nos levou a inveja!» // Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1433, de 29/4/1962: «A batuta do passado no auge do presente. Psicologicamente ainda não consegui por-me ao corrente da demissão do consagrado e excelente mestre Morais. É que este melgacense que dentro da lógica, da disciplina, e da compreensão geral, isto é, dos homens bem-intencionados, sempre soube defender com alma e dedicação os interesses da banda de música da nossa terra e sem desfalecimentos agiu de forma tal a fazer-lhe arrancar excelentes aplausos, quer no burgo quer nas vizinhas terras da amiga Espanha. É certo e compreende-se até o haver tido o mestre Morais muitos dissabores quando se lançou ao empreendimento de fazer da sua banda algo de novo na terra e ninguém se pode admirar de não remodelar aquilo que ele tanto queria por não poder andar pelas escolas a procurar rapazes a fim de fazer deles futuros pupilos. Isto passou-se em 1944 e eu era então aluno da escola Conde de Ferreira, a cuja frente estavam o senhor Abílio Domingues e a saudosa professora D. Ana de Magalhães Barros, e se então eu não sabia raciocinar posso hoje ao recordar os factos de então, e os posteriores, afirmar que o mestre Morais nunca enterrou vivos nem desenterrou mortos e apenas se consagrou à sua arte, que aos olhos de todos brilhou com a disciplina e o aprumo que soube emprestar-lhe. E por isso faço votos para que todos hoje o compreendam e o acarinhem, pois na minha opinião sempre foi um homem justo, correto e cumpridor de seus deveres, e tudo merece. Pelo menos estou certo de que os monçanenses o saberão compreender. // Joaquim Baleixo // Morreu na freguesia de Paderne a 3/5/1971. /// (*) Sobre este assunto ver Notícias de Melgaço n.º 417, de 16/10/1938.

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