terça-feira, 30 de junho de 2020

QUADRAS AO DEUS DARÁ
 
Por Joaquim A. Rocha











«Penso, logo sobrevivo»,

Dizia o grão pensador.

Eu digo ao tal senhor:

Penso, logo estou f’rido.

 

O burro da minha terra

Não pensa, mas existe;

O que ele quer é comer,

À boa palha não resiste.

 

O abade esfomeado

Diz à criada e amante:

Traz-me presunto fumado

E garrafa de espumante.
 

O bruto do marinheiro

Diz à sua namorada:

Traz linguiça do fumeiro,

Espumante da Bairrada.
 

 O Aníbal lá da serra,
  
Pede à sua cozinheira:

Traz-me presunto da terra,

E bom vinho da Madeira.

 

O Serafim de Fiães

Só trata do seu umbigo:

Gosta de gatos e de cães

Mas não lhes dá o presigo.

 

A tia Maria Farruca

Era amiga desta gente:

Da chirela e da cuca,

E até do ladro tenente!

 

O Antoninho, coitado,

Tinha corpo de anão;

Bebia que nem soldado,

Comia que nem leão! 

 

Eu não quero dizer mal,

Daqueles que conheci;

É a grei de Portugal,

Com sangue de javali.

  
Eu não quero dizer mal

Da gente da minha terra;

Eu sou como eles, tal qual,

Lobo-do-mar e da serra.

 

Eu não posso dizer mal

Da malta da minha estirpe;

Não há outro povo igual,

Mas temo que me extirpe.
 
 
 
 
 

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