sábado, 1 de julho de 2023

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QUADRAS AO DEUS DARÁ

Por Joaquim A. Rocha 



// continuação de 29/04/2023.


254

 

Eu vivo numa prisão,

Entre paredes fechado;

Comigo está a ilusão,

Em forma de cadeado.

 

255

 

Meu avô é homem rico,

Nada em rios de dinheiro;

Tem ovelhas, um burrico,

Uma cabra e um carneiro.

 

256

 

Sucateiro, sucateiro,

Não me queiras sucatar;

Eu valho muito dinheiro,

Mais do que podes pagar.

 

257

 

Sou da Vila de Melgaço,

Tenho muito orgulho nisso;

Daqui lhe mando um abraço,

Pra se livrar do enguiço.

 

258

 

Fui à Vila de Melgaço,

Cumprir o meu compromisso;

Beber vinho… e bagaço,

Comer presunto e chouriço.

 

259

 

Fiquei preso na garagem,

Apanhei um grande susto;

Perdi a minha imagem,

Transformei-me num arbusto.

 

260

 

Este governo é lambão,

Lambe descaradamente;

Anda de decreto em mão,

A iludir muita gente.

 

261

 

Atirei perlas a porcos,

Comeram como glutões;

São piratas de emborcos,

Têm boca de tubarões.

 

262

 

Atirei perlas a porcos,

Comeram sem mastigar;

Seus cérebros são amorfos,

Não servem para pensar.

 

263

 

Os anões tornam-se grandes,

Gigantes ficam pequenos;

Naquela África escaldante

Os brancos ficam morenos.

 

264

 

Eu nasci na primavera,

A beijar quase o verão;

Tinha uma vida à espera,

Carregada de ilusão!

 

265

 

Sonhei um dia ser rei

Dum país imaginário;

Ser senhor de toda a grei,

Libertá-los do calvário.

 

266

 

Cangaram-me certo dia,

Vergaram-me o cachaço;

Virei mastro em maresia,

De borracha tornei-me aço.

 

267

 

Ó meu rico São João

Mandai-me muito dinheiro;

Pra te comprar um balão

Que percorra o mundo inteiro.

 

268

 

Ó meu rico São João

Dai-me a força da baleia;

Pra melhorar o país,

Sobretudo minha aldeia.

 

269

 

Ó meu rico São João

Dai-me um estupor perfeito;

Que tenha um corpo gingão,

Uma carteira de jeito.

 

270

 

Ó meu rico São João

Só na paródia te vejo;

Não sei donde vem teu pão,

Eu para o ganhar mourejo.

 

271

 

Ó meu rico São João

Dai-me uma mulher sem jeito;

Que tenha pernas de cão,

Um furúnculo no peito.

 

272

 

Ó meu rico São João

Dai-me uma mulher mansinha;

Que tenha bom coração,

Uma perna bonitinha.

 

273

 

O São Pedro lá do céu

Faz da terra um inferno;

Envia frio no verão,

Muito calor no inverno!

 

274

 

O São Pedro lá de riba

Faz da terra um inferno:

Manda chuva de verão,

Muita seca no inverno.

 

275

 

Tenho a mulher agulhada,

Por todo o corpo agulhas;

Vou com ela à caçada,

Para matar os mil pulhas.

 

276

 

A Isabel, encantada,

Tem no corpo mil agulhas,

Está toda metalizada,

Se lhe toco faz faúlhas.

 

277

 

Quando o amor é perfeito

Não se pode ocultar;

Guarda-se junto ao peito

Para o trair num olhar!

 

278

 

Se olho para ti deliro

Se não olho eu desmaio;

Não sei o que eu prefiro,

Ser o senhor ou ser aio.

 

279

 

Amor é como a videira,

Dá fruto no fim do verão;

Na primavera, asneira,

No inverno, ilusão.

 

280

 

Um dia botei figura

Com o meu fatinho novo;

Era outra criatura,

O orgulho deste povo!

 

281

 

Dizem-me que eu sou tanso,

Mais calmo do que um guru;

Que tenho penas de ganso,

A ternura de um peru!

 

282

 

Nas asas de um condor

Atravessei o oceano;

À procura do amor

Que perdera por engano.

 

283

 

Quem me dera, quem me dera,

Ter a sageza e o jeito

De trepar como a hera

Dos teus pés até ao peito.

 

284

 

Vivo num mundo encantado,

Não olho à minha volta;

Vejo tudo embelezado,

Ouço paz onde há revolta.

 

285

 

Nesta terra de pategos

Quem tem um olho é rei;

São sábios os morcegos

E são tolos os da grei.

 

286

 

Procurei-a muito longe,

Em terreno duro, incerto;

Afinal estava aqui,

Tão perto de mim, tão perto!

 

287

 

Julgas-te muito importante,

Talvez mais do que um deus;

Na marinha, um almirante,

Na ciência… Galileu!

 

288

 

Eu sou simples e humilde,

Vivo tão modestamente;

Podes crer, cara Matilde:

Sou filho de boa gente.




// continua...


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