quinta-feira, 20 de abril de 2023

FERREIRA DA SILVA

(Bracarense por nascimento, melgacense por paixão) 




     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1503, de 1/3/1964: «ATIVIDADES PRIMÁRIAS. // Ainda se mantêm vivas as boas impressões deixadas na visita a este concelho pelo engenheiro Arantes e Oliveira, ilustre Ministro das Obras Públicas que, seguindo o seu louvável e inteligente hábito de verificar in loco as aspirações locais e de estudar com as autoridades administrativas responsáveis a viabilidade dos respetivos projetos, deixou na sua passagem um rasto de entusiasmo e de concretizações do escopo a atingir, rapidamente, dentro de uma escala racional de prioridades e de possibilidades financeiras. No entender esclarecido de Sua Ex.ª as atividades iniciais do nosso município deverão começar pelo abastecimento de água potável e do saneamento da nossa vila. Estas atividades primárias sobrelevam as demais e delas ficam a depender outras realizações de importância vital e de execução imediata quanto ao arranjo e às necessidades reais do nosso burgo. Para a realização inicial destas atividades S. Ex.ª destinou quatrocentos contos, sendo cento e cinquenta para o abastecimento das águas e duzentos e cinquenta para o início da rede dos esgotos, devendo a Câmara contrair na CGDCP o empréstimo para o seguimento e conclusão destes melhoramentos de importância vital o qual, será comparticipado pelo Estado nas condições normais. Nestes termos, deverá começar-se pela prospeção de maiores caudais de água das atuais nascentes e de outras e do assentamento simultâneo das redes de canalizações e condutas das águas e dos esgotos da Vila. Desta forma, evitar-se-ia o levantamento dos pavimentos das ruas mais do que uma vez, o qual deverá fazer-se em ordem a permitir, simultaneamente, o assentamento das canalizações de água e das condutas subterrâneas da rede de esgotos. Isto porque, como já dissemos, as condições da rede do abastecimento das águas terá de ser totalmente substituída por novas canalizações devidamente ensaiadas à pressão e à compressão, de modo a assegurar a distribuição da água com as necessárias condições de segurança e a evitar a triste realidade do rebentamento anormal das atuais; por outro lado, não se compreende nem está certo que se faça o levantamento dos pavimentos das ruas mais de uma vez para o assentamento e enterramento das condutas das redes de distribuição das águas e dos esgotos visto que, umas e outras se destinam à ligação das habitações, por meio de ramais de conduções saídos de cada uma das referidas redes. Com a contribuição inicial generosamente oferecida por Sua Excelência o Ministro, a Câmara deverá promover, desde já, o princípio dos respetivos trabalhos, os quais seriam continuados, sem interrupção, de harmonia com os projetos aprovados e os meios resultantes das importâncias do empréstimo e da comparticipação estabelecida. É preciso que se tenha em atenção que os preliminares do estabelecimento das redes de abastecimento de água e dos esgotos são operações demoradas, que exigem a elaboração de projetos de caráter geral e esquemas parciais das ligações individuais e respetivo custo, a pagar pelos utentes, operações estas que devem ser estudadas previamente em ordem a evitar improvisações, sempre nocivas, e demoras escusadas. Em nosso entender a Câmara deveria proceder ao estudo imediato do assunto e encarregar pessoa competente de elaborar os respetivos projetos e esquemas e distribuição e ligação das respetivas redes. De posse das estimativas dos custos das obras a realizar, solicitar das entidades competentes o empréstimo e as comparticipações devidas e adjudicar os trabalhos a quem der garantias de seriedade e perfeita execução, fazendo tudo quanto possível seja para que não haja demoras e as obras se executem, rápida e fracionadas (fracionamento), em ordem a causar os menores incómodos e prejuízos à vida normal da população. Não deverá deixar-se nada ao acaso; tudo deve ser ponderado e considerado, tanto no que respeita à execução dos trabalhos como à qualidade, resistência e garantia dos materiais, não esquecendo a caução de pelo menos 10% dos custos parciais, que será depositada à ordem da Câmara adjudicatária e mantida por um período de tempo a fixar. É tempo de começar. // F.S.      

 

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     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1504, de 8/3/1964: «FESTAS DO CONCELHO. // Ensina a História Religiosa que quarenta dias após a ressurreição apareceu Jesus aos seus discípulos em Jerusalém e levou-os ao Monte das Oliveiras. Depois de lhes ter reservado as promessas do Espírito Santo e declarado que seriam suas testemunhas em Jerusalém, na Judeia e na Samaria e até aos fins da terra, ergueu as mãos aos céus e abençoou-os. Nesse mesmo instante começou a elevar-se no espaço e não tardou que uma nuvem o ocultasse aos olhos dos assistentes. Jesus tinha predito a sua ascensão e dois anjos anunciaram que Ele voltaria do mesmo modo que os discípulos O viram do mesmo modo que os discípulos O viram subir. O Monte das Oliveiras fica a 812 metros de altitude acima do mar Mediterrâneo e a cerca de um quilómetro de Jerusalém onde se ergue o templo muçulmano chamado mesquita da Ascensão. A festa litúrgica da Ascensão que originariamente se celebrava no mesmo dia que a de Pentecostes (quinquagésimo dia depois da Páscoa) passou a ser celebrada separadamente a partir do Quadragésimo dia depois da Páscoa. O objeto desta solenidade é honrar o termo da missão do Redentor na Terra e a sua entrada na glória do céu. A Ascensão é uma das festas de preceito da Igreja: celebra-se à quinta-feira com rito dúplice de 1.ª classe, é precedida por três dias de Rogações e tem oitava privilegiada da 3.ª ordem (ver Grande Enciclopédia, volume 3.º). Foi escolhido pelo município melgacense este dia santificado – quinta-feira da Ascensão – para feriado municipal e dia das festas do concelho. Como se trata de uma data móvel – dia da Ascensão de Jesus, no quadragésimo dia depois da Páscoa, no ano corrente coincide com o dia sete de Maio, quinta-feira, e as festas do concelho celebram-se no dia 6, 7 e 8 do dito mês. Ao que parece, e nos informam, neste ano de graça de 1964 as festas concelhias prometem deslumbrar a nossa antiquíssima Vila, povoada e reedificada em 1170 pelo 1.º rei de Portugal, com a sua torre de menagem, a sua igreja matriz, templo românico do século XII, e a capela de Nossa Senhora da Orada, de grande beleza e puríssimo estilo românico, autêntica joia arquitetónica e monumento nacional, ligadas indissoluvelmente ao extraordinário e inconfundível quadro natural onde predomina a louçania verde do Alto Minho, em escadarias monumentais de socalcos que se estendem pelas encostas até se afogarem no rio, sob o olhar severo das montanhas de arrojo ciclópico, viverão três dias de euforia, de movimento e de veneração panorâmica. // Foi-nos dado conhecimento do programa provisório elaborado pela Comissão Promotora das Festas e, desde a procissão de velas e condução de Nossa Senhora da capela da Orada até à igreja matriz, no dia 6, à imponente procissão do dia 7, ilustrada com grande número de figurantes, da Missa Festiva a grande instrumental, da feira franca e do concurso pecuário no dia 8, com o patrocínio do Grémio da Lavoura, não faltarão grandes atrações no profano com concertos de afamadas bandas de música, iluminações, feérico fogo-de-artifício e arraial minhoto, abrilhantado por uma excelente orquestra espanhola. // Outros números estão em estudo pela Comissão, constituída por pessoas de grande dinamismo e amor pelas tradições melgacenses, que serão anunciados no respetivo programa definitivo. Espera-se que o comércio local não se limite a colher os benefícios do impulso dos bons negócios derivados dos festejos e contribua generosamente para que as Festas do Concelho passem a ter uma projeção digna da nossa terra e atraiam elevado número de romeiros e de forasteiros, tanto mais quanto é certo que, as autoridades fronteiriças facultarão a passagem da raia sem formalidades nos dias dos festejos e possibilitarão aos espanhóis vir aqui deixar o seu dinheiro, transformando muitos estabelecimentos em autêntica feira de São Miguel. Lembramos à Comissão que deveria esforçar-se pela organização dos inéditos “clamores”, que tanta vida davam a esta festa, ou sejam, as procissões de penitência vindas das freguesias do concelho e de fora – à cabeça Riba de Mouro – até à capela da Orada, onde rezavam as suas orações e entregavam as suas oferendas. A Câmara não deverá ficar indiferente a tudo isto, antes intervindo e facilitando a missão da Comissão Promotora, quer com um óbolo substancial, quer pondo ao seu dispor a influência que resulta de ser a entidade oficial mais importante da administração local, com especial autoridade para patrocinar e promover o pedido de facilidades de passagem fronteiriça e velar por intermédio da G.N.R. por tudo quanto interesse aos trabalhos da Comissão e à manutenção da ordem pública.» // F.S.

 

 

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     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1505, de 15/3/1964: «Proteção do Edifício Escolar. – Não é a primeira nem a segunda vez que atacamos neste semanário a triste e indefensável ideia da construção do futuro mercado municipal no terreno adjacente ao recreio do edifício das novas escolas da vila. Não nos inspirou nem inspira qualquer pensamento reservado ou ideia preconcebida, qualquer interesse oculto ou simples teimosia e vontade de discordar ou de dizer mal. Não! Quando tratamos de qualquer assunto neste jornal ou oralmente, fazemo-lo sempre com inteira boa-fé e ânimo de acertar, num espírito de cooperação e crítica construtiva em ordem a dar uma achega às entidades responsáveis para que optem pela melhor solução. Se algumas vezes apresentamos o nosso modo de ver com certa vivacidade não significa que pretendamos impor a solução preconizada e que esta seja filha de arrebatamento impensado ou do azedume incontido. Pretendemos, sim, evitar o crescimento dos erros verificados em tantos dos melhoramentos locais já realizados, que, além de pessoalmente nos arrepiar, se revelam em gritantes amostras de pouca ponderação, de falta de gosto e de atento estudo das soluções adotadas e concretizadas. Manifestamente aberta e francamente a nossa modesta opinião sobre a errada escolha do local em que se pensou construir o mercado municipal. Entendemos que deveríamos tratar do assunto com bastante antecedência a fim de abrir um período suficiente ao início do diálogo da discussão que se impõe. Segundo o Presidente Johnson dos E.U.A. qualquer cidadão tem algo a dizer e, pelo sistema democrático, o direito de ser ouvido; e há sempre uma solução local para cada problema local. Pois porque tínhamos algo a dizer, não hesitamos em afirmar que a construção do mercado municipal no terreno pegado ao recreio do edifício das escolas é de todo o ponto de vista inconveniente, errado e indefensável. Porquê? Porque é antipedagógico, anti-higiénico, e anti-humano. Na realidade um mercado é sempre um depósito de restos putrefactos de alimentos e outros que formam um habitat excelente à proliferação de insetos incómodos e perigosos para a saúde pública: moscas, mosquitos, e outros transmissores de infeções e doenças graves a que ficaria sujeita a população escolar. Junte-se a isto as escorrências e os cheiros de toda a ordem que constituiriam um duplo perigo para as crianças e professores e a formação de uma academia de linguagem reles e de convivência imoral, na qual a mocidade escolar não iria colher nenhum benefício, antes assimilaria a poluição dos fundamentos educativos e a negação da decência do ensino bem orientado e de salutar merecimento pedagógico. // Os nossos reparos indignados e a rejeição “in limine” da monstruosa solução teve, afinal, justa e flagrante confirmação no Parecer publicado no jornal O Primeiro de Janeiro n.º 66, ano 96, de 8 do corrente mês, que a seguir se transcreve: “Parecer da Procuradoria-Geral da República acerca da zona de proteção dos edifícios escolares. A propósito da construção em curso, de moradias a menos de oito metros do recreio do edifício escolar do núcleo de Alfândega da Fé, a Direção Escolar do respetivo distrito pretende embargar a obra, ao que se opôs a Direção-Geral de Urbanização, pelo que foi solicitado um parecer da Procuradoria-Geral da República. Esse parecer, ontem publicado no Diário do Governo, é do seguinte teor: “Em caso algum a lei consente se ergam construções a menos de doze metros de distância de um edifício escolar, ou de qualquer das suas dependências urbanas ou rurais. O artigo 2.º do decreto-lei n.º 37.575, de 8/10/1949, apenas ressalva a necessidade de, por razões urbanísticas ou arquitetónicas, ser necessária uma mais profunda zona de proteção aos edifícios escolares, a estabelecer segundo as legislações respetivas.” // Este Parecer, emitido acerca do núcleo escolar de Alfândega da Fé, adapta-se perfeitamente ao caso de Melgaço. Quando não se olhe, com olhos de ver, aos inconvenientes e aos perigos morais e físicos da construção do mercado municipal paredes meias com o recreio escolar, a lei (decreto 37.575, de 8/10/1949) melhor avisada e mais previdente do que os Serviços de Urbanização, não consentiria no inconveniente atentado à saúde e à educação da nossa mocidade. Ainda bem que o assunto fica, agora, completamente esclarecido e o pretendido local em via de ser escolhido para a construção do mercado, inteiramente rejeitado por clara e insofismável disposição legal. Com se vê tínhamos razão e se a Câmara ainda não lançou as suas vistas sobre outro local, lembramos-lhe o terreno onde se pensou fazer a feira do gado, oferecido pelo proprietário Gaspar Magno Pereira de Castro, por baixo da muralha da Avenida que, nos parece, reunir as indispensáveis condições de adaptação à construção em referência.» // F.S.

 

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     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1506, de 22/3/1964: «PROBLEMAS ATUAIS. // O Diário do Norte de 26 de Fevereiro último publica uma local do senhor Valentim Brandão na qual se afirma que não é de considerar a construção de uma ponte internacional no lugar do Peso, deste concelho, defronte a Arbo, melhoramento que foi lembrado e anotado por Sua Excelência o Sr. Ministro das Obras Públicas na sua visita ao Alto Minho. O articulista alude a que Melgaço possui já uma dessas pontes no lugar de São Gregório, a oito quilómetros da sede do concelho e a doze do referido lugar do Peso, e conclui que o local indicado para a construção de uma ponte internacional é, sem dúvida, junto da Vila de Monção, tanto mais que o Ayuntamiento de Salvatierra del Miño se propõe contribuir com 50% do custo da obra. Parece que a ponte de ligação do Peso com Arbo, para a construção da qual o Ayuntamiento daquela vila galega também se propõe contribuir com 50% do custo da respetiva obra, não prejudica a justa pretensão dos monçanenses, de obter idêntica ligação com Salvatierra del Miño. Uma e outra ponte teriam caraterísticas bem definidas e destinar-se-iam a servir a ambos os concelhos, dotando-os com uma via de comunicação cuja projeção se refletiria na comodidade, no intercâmbio populacional e nas condições turísticas de cada uma das respetivas regiões. A ideia da ponte internacional do Peso é velha: há muitos anos apresentada e estudada pelos dois municípios, encontrou defesa e decisivo apoio num alto espírito e ilustre expoente do professorado universitário português, ligado por laços de casamento com uma considerada família galega, a quem se deve a promessa de comparticipação oferecida pelo Ayuntamiento de Arbo. Supomos e convictos estamos de que a aludida ponte não prejudica a construção de outra ponte em Monção, uma e outra inteiramente viáveis e necessárias ao crescimento turístico e económico dos dois concelhos vizinhos. Pela nossa parte estamos dispostos a apoiar essa e outras reivindicações dos monçanenses e a contribuir com o nosso esforço e simpatia para o progressivo desenvolvimento e embelezamento da linda vila de Deu-la-Deu Martins. Não criemos situações embaraçosas e de interesses opostos, antes conjuguemos os nossos esforços e influências numa ação de utilidade comum. // No jornal O Primeiro de Janeiro de 14 deste mês lemos com justificado alvoroço e alegria a notícia de que vai ser celebrado contrato com o arquiteto Fernando da Cunha Guimarães para a elaboração do projeto do novo edifício da CGDCP em Melgaço. Este projeto custaria setenta contos. É uma notícia positiva, uma informação concreta, que nos enche de satisfação, pela qual temos trabalhado sem desfalecimento. Finalmente vão desaparecer da nossa sala de visitas - a Praça da República – as paredes esventradas do edifício onde outrora funcionaram as escolas primárias – Conde de Ferreira – e que ali se erguem num estado de conservação miserável, a clamar camartelo e urgente demolição. E não só a nossa vila vai ter um edifício condigno, mas também uma equipa de novos funcionários virá valorizar a sua vida económica e superintender nos serviços de uma grande organização nacional. // Para concluirmos, no dito jornal de 17 do corrente, em Diário de Viana, lemos o seguinte: “GOVERNO CIVIL. O senhor Dr. Alfredo Pinto, chefe do distrito, acompanhado das entidades oficiais de Caminha, Arcos e Ponte de Lima, esteve em Lisboa a tratar de assuntos do maior interesse para a região. O senhor Governador Civil contactou nos seguintes Ministérios: Obras Públicas, onde tratou de assuntos da urbanização da vila dos Arcos e da visita do titular desta pasta a Caminha; no das Corporações, onde ventilou assuntos referentes à Colónia Balnear Infantil em Vila Praia de Âncora e Festas da Cidade (!); no das Comunicações, abordando o problema dos transportes interurbanos; no da Economia, assuntos referentes à aquisição de uma ambulância para os Bombeiros Voluntários de Viana; Ultramar, onde solicitou a vinda de dois agrupamentos folclóricos ultramarinos para atuarem no Festival Internacional de Santa Marta de Portuzelo a favor do Movimento Nacional Feminino; Interior, onde pediu a reabertura da fronteira do Lindoso. Com o subsecretário de Estado da Presidência do Conselho tratou de vários assuntos, abordando principalmente o problema do “ferry boat” na foz do Minho.” // Como se vê, razão tínhamos nós quando recomendamos, no artigo ATIVIDADES PRIMÁRIAS, o estudo imediato das redes de distribuição da água potável e dos esgotos e o contrato de técnicos competentes para elaborar os respetivos projetos e esquemas, bem como as estimativas dos custos das obras a realizar. A execução de obra de tal monta exige planos minuciosos e diligências demoradas junto das entidades oficiais a quem cabe possibilitar a sua realização, concessão de empréstimos, comparticipações, obrigatoriedade das ligações, fixação de taxas, prazos de início e de conclusão, garantias, etc., de modo a que tudo seja previsto, ponderado e bem delineado. É evidente que estas diligências terão de ser efetuadas em Lisboa, junto dos Ministérios, da CGD e outras repartições centrais, patrocinadas pelo Excelentíssimo Governador Civil do distrito e utilizando todas as influências existentes. As Câmaras indicadas na notícia transcrita deram um exemplo que deveríamos imitar visto que mais do que um exemplo, a sua atuação constitui um paradigma a seguir.» // F.S.         

 

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     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1507, de 5/4/1964: «SIT TIBI TERRA LEVIS. // Morreu Augusto Esteves! Silêncio! Deixou de bater um grande e generoso coração; paralisou para sempre um cérebro em constante evolução; uma inteligência penetrante e esclarecida, em plena pujança, ansiosa de perfeição. Ao recordá-lo vivemos uma hora de amargo abatimento, de emoção e profunda concentração. Melgacense fiel e companheiro de lutas dedicado, passou entre nós como um raio de sol quente, acolhedor, leal, acariciador e benfazejo. O seu olhar franco e amigo espelhava o fogo interior dos seus nobres sentimentos, do seu entusiasmo e desejo de servir a sua terra, que tanto amou e para a qual viveu. Servir Melgaço sem limitações; servir com ânimo firme e de coração aberto a todas as causas justas; servir por devoção e por idealismo a sagrada causa da democracia e os grandes problemas em que se debate a humanidade. Disse um dos grandes do pensamento de todos os tempos, Gabriel d´Annunzio (1863-1938), referindo-se à morte de Wagner: “o mundo perdendo Wagner ficou menor…” E se é verdade que só os homens de sensibilidade rara se podem aperceber da perda que o mundo sofre com a morte de um dos seus elementos mais representativos, também os melgacenses devem sentir, amargamente, o que para Melgaço representa a morte de Augusto Esteves, como político, como bairrista até à loucura, como funcionário, como jornalista distinto, como polígrafo e historiador notável. Na visita que lhe fizemos há poucos dias, aparentemente o seu estado de saúde e a sua boa disposição na animada conversa que entretivemos, não nos revelou nada de grave que fizesse recear e prever o inesperado e chocante acontecimento da sua morte! Porém, a vida é um estágio efémero dentro da transformação da matéria, e o vendaval da morte não poupa ninguém; atinge os fracos e os fortes. // De compleição débil no conspecto físico, a sua vida interior revelava-se por verdadeiros clarões de entusiasmo e de acrisolado amor a tudo quanto de longe ou de perto está ligado a Melgaço e para ele, o distrito, o país, o seu único mundo, confinava-se nos limites estreitos desta terra melgacense. Existir e transitar no plano terreno é comum a todos os seres. Porém, viver e conviver é mais transcendente; é próprio dos seres humanos. Augusto Esteves não compreendia um homem só no seu mundo melgacense, alheado de tudo e de todos. E sim um mundo só, um único mundo, de todos os melgacenses. No seu admirável espírito iconológico o bairrismo cegava-o, ampliava desmesuradamente o valor e a beleza dos monumentos e da história dos sucessos a eles ligada. Para ele tudo era incomensuravelmente grande, enorme, ímpar, desde que tivesse existido, em qualquer época, nesta sua amada terra. A origem nativa era tudo e só isso contava; o resto estava fora de um mundo que não era o seu… Amigo de há quase meio século, o nosso coração veste de crepes nesta hora emocional e triste e os nossos lábios ciciam, baixinho, a oração que espontânea e amarguradamente a alma reza e a saudade dita. Morreu Augusto Esteves! Morreu para a vida mas a sua memória viverá na nossa recordação para todo o sempre. Desapareceu um companheiro de lutas, um correligionário, e um amigo lealíssimo que criou no nosso coração fundas raízes de amizade e de estima; que se impôs pelo espírito, pela austeridade, pela força e brilho do seu pensamento. Melgacenses: curvemo-nos respeitosamente perante o seu cadáver e elevemos a nossa alma em sentida prece para QUE A TERRA LHE SEJA LEVE! // F.S.    

 

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     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1508, de 12/4/1964: «GRÉMIO DA LAVOURA. A Direção do nosso Grémio da Lavoura acaba de publicar o Relatório, Balanço e Contas respeitantes à gerência do ano findo de 1963. Trata-se de um documento muito bem elaborado, ilustrado com numerosos mapas e elementos estatísticos, que revela com a maior clareza a afanosa atividade exercida naquela gerência e traduz os excelentes resultados obtidos. A despeito das incompreensões e até da hostilidade de muitos, a força de vontade e o amor que o digno e dinâmico Presidente da Direção demonstra, confirma o pensamento de Tremblay de que, “uma grande vontade gera um grande valor” e de Aristóteles: “ama mais o que se conquistou com mais trabalho”. A devoção absorvente, as qualidades de administrador e a capacidade de realização, do professor Ascensão Afonso estão patentes no elucidativo documento e a Lavoura de Melgaço muito deve ao seu enorme esforço e esgotante labor. Razão tínhamos nós em acompanhar o ilustre Presidente no seu propósito de abandono do cargo, num momento de desfalecimento, felizmente passageiro, resultante de aborrecimentos, deslealdades e falta de apoio em determinados casos, da parte de pessoas e entidades que tinham o dever e mais do que dever, a obrigação de auxiliar a resolver os graves problemas suscitados e as dificuldades enfrentadas, com a maior decisão e felicidade, na administração de um organismo que se mantém mercê da vontade firme e dos sacrifícios morais e materiais do seu mais direto responsável. Tenha-se em vista o estranho e lamentável caso da “Queima” que aqui tratamos larga e demoradamente, a incompreensível e espantosa atitude da Comissão de Viticultura e dos seus fiscais e, a pretensão de se elevar as taxas dos manifestos do vinho!... Quem olhar para trás, a muito pequena distância, verá o que foi a luta travada para vencer ou gorar tantas incompreensões, tantas faltas de cuidado e de zelo, tantas indelicadezas e desconsiderações, vindas daquele lado de que não deveriam vir, e atenção aos princípios em que se funda e se sustenta o regime corporativo. Adiante… Temos a satisfação de registar que valeu a pena lutar e que, contra a razão, não há argumentos válidos nem atitudes estáveis. Para cá de Monção, algumas vezes, mandam os que cá estão, e mais vezes poderiam afirmar a sua forte personalidade se, da parte dos melgacenses, houvesse mais amor pelas suas liberdades e pelos seus direitos. Em defesa dos problemas e interesses da lavoura melgacense o nosso grémio fez-se ouvir pela voz autorizada do seu Presidente, nas reuniões ordinárias e extraordinárias da Federação dos Grémios da Lavoura, Jornadas Cerealíferas e leiteiras e outras, nas quais aquele organismo e a nossa terra conquistaram larga nomeada. No relatório a que fazemos referência encontram-se elementos estatísticos quanto ao milho inscrito para entrega à F.N.P. Trigo, à distribuição de batata de semente, ao manifesto do vinho e taxas cobradas, aos vinhos estranhos entrados no concelho, preços médios de venda para consumo e para a queima, quotizações, mercadorias distribuídas e seu valor pecuniário, fornecimentos a crédito, situação financeira do Grémio, considerações sobre o estabelecimento da Adega Corporativa (!), assistência técnica, serviços do trator, nova sede do Grémio, e ainda elucidativos mapas, balancetes das contas do exercício, balanço de produtos armazenados por espécies e com grande desenvolvimento e clareza tudo quanto respeita às boas normas contabilísticas do útil organismo. // Limita-nos, nestas rápidas referências a anotar o que nos pareceu mais interessante e substancial no Relatório, Balanço e Contas da Direção do nosso Grémio da Lavoura no exercício de 1963 e entendemos que, aos melgacenses, não deve ser indiferente a boa administração e atividades de um organismo que honra a sua terra e que, indiscutivelmente, é o melhor e mais útil instrumento regulador das qualidades e dos preços dos produtos de que a Lavoura tem necessidade de comprar. Ou não será assim? // F.S.       

 

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     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1509, de 19/4/1964: «VALORIZAÇÃO DA VILA. // Conforme noticiamos no n.º 1506, de 22 de Março último, vai ser celebrado contrato com o arquiteto Fernando da Cunha Guimarães para a elaboração do projeto do novo edifício da CGDCP, a construir no terreno que foi ocupado outrora pelo edifício das escolas primárias de ambos os sexos, mandado erguer de conta do legado deixado para o efeito pelo benemérito e grande capitalista Conde de Ferreira. O projeto que custará setenta contos deve abranger os terrenos da antiga escola e dos respetivos recreios. A área aproveitável é suficiente para nela se implantar um edifício espaçoso e modelar, destinado ao funcionamento dos serviços da Caixa Económica Portuguesa, transferências, depósitos a prazo, voluntários e obrigatórios, e ainda às habitações do chefe da respetiva agência e possivelmente do tesoureiro da importante organização. A construção deste edifício e o funcionamento dos serviços que lhe ficam adstritos virão valorizar grandemente a nossa vila, não só porque frente à Praça da República e Rua Nova de Melo será erguido um prédio digno do local mas ainda porque Melgaço será dotado com pelo menos mais quatro unidades de funcionários que aqui estacionarão permanentemente, e contribuirão com os seus vencimentos para o enriquecimento do concelho. O problema tem pelo menos três aspetos: o embelezamento da vila com um edifício amplo, de linhas modernas, o estabelecimento de serviços públicos que muito beneficiarão o povo melgacense e um fator de riqueza económica, pelo aumento de novos e solventes consumidores, com os quais o comércio muito terá a lucrar, bem como a nossa atual vida de relação. Uma vez elaborado o projeto, supomos que imediatamente, se lhe seguirá a respetiva construção e, antes de se fixarem as linhas definitivas, parece que o senhor Presidente da Câmara deveria insistir na ideia do mesmo ser dotado com uma torre relógio em ordem a substituir o nosso velho relógio da torre de menagem, a ordenar os movimentos da população e para que esta saiba, ao certo, a quantas anda. Outro problema que supomos relacionado diretamente com a construção do novo edifício é o da remoção para outro local, do formoso chafariz que ali existe, nas traseiras do qual se estende uma parte do logradouro das velhas escolas.

 

Antigo jardim do Cardoso

 

     Salvo o devido respeito por outra opinião em contrário, o chafariz ficaria bem colocado no chamado Jardim do Cardoso, não só porque aformosearia aquele local como varreria de uma vez para sempre a indecência do sanitário que ali foi implantado, do qual o rapazio utiliza apenas as escadas… Seria uma boa ocasião para soterrar aquela tristíssima obra que parece ter sido concebida por um cérebro pouco esclarecido, salvo se o seu inspirador tinha alguma má vontade contra o falecido autor do Jardim e pretendesse desfeiteá-lo de modo tão contundente. Dir-se-á que sendo a Praça da República o local mais central da vila e junto à qual se realizam as feiras semanais, se torna útil a existência ali de um sanitário suscetível de ser utilizado pelos barraqueiros e feirantes. Pois bem, não é preciso enterrar o novo sanitário, tornando-o em abrigo subterrâneo, ao jeito de prevenir a hipótese de um bombardeamento aéreo: um pouco mais abaixo, servindo-se da parede do caminho da Fonte da Vila, poder-se-iam aplicar os materiais desmontados daquele abrigo subterrâneo, num tipo de sanitário parecido ou igual ao que se encontra implantado junto do Domus Municipalis. Não sendo onde indicamos, abundam por ali perto outros locais que se adaptariam perfeitamente ao fim em vista. Ali, no Jardim do Cardoso, não! É indecente, fétido e prejudica, irremediavelmente, uma das melhores panorâmicas da nossa vila. O chafariz faceando o passeio daquele ângulo da Praça, tendo à retaguarda, e lateralmente, artísticos canteiros de flores, parece-me bem. O tanque não é preciso, até porque passaram de moda as bestas que o utilizavam como bebedouro… // F.S.     

 

Praça da República

 

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     No Notícias de Melgaço n.º 1510, de 3/5/1964, páginas 1 e 4, foi publicado um artigo da sua autoria, com o título “Empréstimo Municipal”; esse artigo tem imenso interesse, pois lembra as carências do concelho em termos de distribuição da água potável, rede de esgotos, higiene das ruas, das pessoas, etc. // Leia-se: «Na última reunião do Conselho Municipal foi votado o pedido de um empréstimo camarário, no total de quatrocentos e cinquenta contos, destinado: duzentos e cinquenta contos à rede dos esgotos; cento e cinquenta contos à substituição da rede de canalização das águas potáveis; e cinquenta contos à prospeção das mesmas águas com vista ao aumento do respetivo caudal. O montante deste empréstimo, que já foi solicitado às entidades oficiais competentes, corresponde ao total da oferta que à vila, com o mesmo fim, foi feita por S. Ex.ª o Sr. Ministro das Obras Públicas na sua visita oficial de 15 de Fevereiro do ano corrente. Teremos assim a verba inicial de cerca de mil contos para dar começo aos importantíssimos melhoramentos do saneamento e da distribuição de água potável à vila, em quantidade suficiente. É evidente que esta verba é demasiadamente reduzida e insuficiente para custear os vultuosos melhoramentos a que se destina. Porém, há que contar com a comparticipação do Estado e com um complemento de generosidade de S. Ex.ª o Sr. Ministro. Para começar esta grandiosa e utilíssima obra, à qual ficará ligado para todo o sempre o nome do Presidente da Câmara que a levar a cabo, consideramos bastante esta verba inicial e maior ela se tornará se o nosso município conseguir das repartições oficiais um técnico que gratuitamente proceda ao estudo e elabore o respetivo projeto da rede dos esgotos. Ao serviço do Estado temos felizmente técnicos consagrados, de grande valor e experimentados, que podem dar à nossa Câmara não só assistência e, ainda, o plano minucioso e atento da execução de uma obra indispensável e necessária que, não interessa apenas à nossa vila, mas também à higiene, à saúde pública, e aos foros de civilização que o turismo reclama e justamente exige. É preciso não esquecer que Melgaço, pelas suas belezas naturais e monumentos históricos, pela situação especial e única que virá a usufruir com fáceis ligações ao país vizinho, e uma rede de comunicações excelente, após a inauguração das rodovias em construção, é uma terra com panorâmicas excecionais e magníficas condições de atração turística. Ora a verdade é que não há turismo sem saneamento e água em quantidade, sem uma rede de esgotos que elimine as náuseas e os vómitos provocados pela atual fedorentina das ruas e sem uma linfa, fresca e leve, captada nas nascentes rochosas das montanhas que nos cercam. Há muito tempo que vimos pugnando por estes melhoramentos fundamentais que, com o prolongamento da rede ferroviária, consideramos fatores primários do desenvolvimento e da urbanização da nossa terra. Como noutro lugar dissemos, esta obra momentosa do saneamento não é propriamente uma obra de fachada de que se tire o efeito das obras de superfície, mas é uma obra indispensável à saúde pública e higiene da povoação que nos acreditará como povo civilizado e limpo. Quanto à água potável em quantidade é uma obra essencial à higiene e limpeza dos habitantes da vila e possivelmente aos do seu termo no dia de amanhã. Em alguns países a distribuição e consumo de água potável é gratuito em algumas cidades e, sem não estamos em erro, isto verificava-se em Madrid há uns bons vinte anos. O nosso concelho é farto de águas; é fácil encontrar boas e fartas nascentes de água leve e puríssima que faz a delícia dos sequiosos, a despeito de existirem mais apreciadores do vinho do que de água… Uma parte do empréstimo, como dissemos, destina-se à substituição das canalizações atuais que fazem suar as estopinhas e põe a cabeça à roda do zelador Alberto, sempre à procura da rolha, a levantar e a refazer as calçadas e suportar as impaciências daqueles a quem (…) para as necessidades diárias das suas casas… Desta vez confiamos em que se proceda com todas as cautelas quanto à experiência e escolha das canalizações, submetendo-as a ensaios rigorosos de (…) e dos mais que assegurem a qualidade e a perfeição do fabrico e dos materiais, bem como a exigência das garantias aos fornecedores. É preciso descansar o Carriço; sem ele há muito tempo que não teríamos água…» // F.S. // continua...     

 

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