quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

PROFESSOR DOUTOR JOSÉ MARQUES  


// continuação...


«Melgaço perdeu no dia 29 de Janeiro um farol com a morte do Professor Doutor José Marques, Cónego da Sé Catedral de Braga e figura notável da cultura e historiografia portuguesa, que se destacou no estudo e valorização dos fundos arquivísticos do Arquivo Distrital de Braga. José Marques nasceu a 12/08/1937 em Rouças, Melgaço. Fez a instrução primária na terra natal, seguindo os estudos no Seminário da Arquidiocese, em Braga, onde se ordena em 1961, sendo logo chamado a exercer no Seminário Conciliar (1961-1970) as tarefas de professor e prefeito. Entre 1969-1974 faz a licenciatura em História na Faculdade de Letras da Universidade do Porto e de imediato conclui o curso de bibliotecário-arquivista na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (1976) e especializa-se como bibliotecário arquivista. Realiza provas de doutoramento com o trabalho intitulado “A Arquidiocese de Braga no século XV”, em 1982, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, onde ascende a professor catedrático (depois das provas de agregação de 1989-1990) com a lição de síntese sobre a “Assistência aos peregrinos no norte de Portugal durante a Idade Média”, tendo-se aposentado em 2003. Colaborou com as universidades portuguesas de Coimbra, Açores, Universidade Católica de Braga (Faculdade de Filosofia e Teologia), com a Fluminense de Niteroi, Rio de Janeiro, Brasil, e com a Universidade de Louvain-la Neuve. Foi diretor da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (1982-1985) e coordenador, entre 1984 até 1998, da Revista da Faculdade de Letras, nas séries de História, Filosofia e Línguas e Literaturas Modernas. Membro do Centro de História da Faculdade de Letras do Porto (cofundador em 1982 da Academia Portuguesa da História, do Instituto Galaico Minhoto (também cofundador em 1982), da Real Academia de la Historia de Madrid (sócio correspondente), das Sociedades de Estudos Medievais, portuguesa (de que é sócio fundador, 1985, e espanhola, do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (sócio correspondente), da Comission Internationalle de Diplomatique (membro desde outubro de 1986, seu vice-presidente em 2008) e do Comité International de Paléographie Latine (desde 1989). Os seus estudos históricos fixam-se, no período da história medieval portuguesa, a montante e a jusante do século XV. Tem como quadro geográfico de principal concentração e referência a arquidiocese de Braga, que é o Minho e Trás-os-Montes, e que por ele, em estudos extensivos e comparativos se alarga a outros territórios diocesanos. Historiador medievalista, com créditos firmados, e internacionalmente reconhecidos, O Professor Doutor José Marques frequentou o antigo curso de bibliotecário arquivista (…), sediado na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e o único existente em Portugal até à criação e multiplicação dos CECD. Este detalhe biográfico permite, em certa medida, compreender a atenção que sempre manisfestou à formação BAD (de bibliotecários, de arquivistas e de documentalistas), o papel decisivo que teve na criação do CECD da Faculdade de Letras da Universidade do Porto e a forma atenta e aberta como acompanhou o desenrolar desse curso. Em 2000-2001 manifestou uma extraordinária abertura e um ativo envolvimento na conceção e concretização da licenciatura em ciência da informação (LCI), resultante da parceria inédita e inovadora entre as Faculdades de Letras e de Engenharia da Universidade do Porto, com vista à preparação de um profissional capaz de integrar, de potenciar e de aplicar diversas valências complementares que ainda andam dispersas e erroneamente separadas. Ele não desapareceu, porque nos deixa dezenas de livros e centenas de artigos sobre a história da igreja e das suas instituições nos últimos dez séculos. Se Melgaço e Portugal perdem um farol, eu perdi um grande amigo. (Costa Guimarães)»

 

     «Recebi neste dia de inverno um telefonema do padre Carlos Vaz comunicando o falecimento do Cónego, Doutor e Professor Catedrático, José Marques. Com sentida comoção, e recordando grandes memórias e uma amizade elevada no período do seminário conciliar de Braga, passando pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, transmitiu-nos sabedoria no âmbito da História e valores éticos. O professor catedrático e membro da Academia de História, para além de ser uma personalidade de grande saber e perito na investigação histórica, era exímio na paleografia, tendo dado cursos na Alemanha, no Vaticano, no Brasil e noutras partes do mundo. Os memoráveis congressos realizados em Portugal e em outras latitudes confirmam o reconhecimento de instituições académicas e universidades. A bibliografia das suas publicações é imensa, não esquecendo as suas raízes melgacenses, pois era natural da freguesia de Rouças. Como pequena referência, assinalo o trabalho “A Origem da Capela de Alcobaça” cordialmente oferecida em 2016. Aliás, devemos sublinhar que tinha o cuidado de nos remeter as separatas das edições. O Cónego, Doutor, Professor José Marques, era um vulto da cultura portuguesa e mereceu o reconhecimento do governo em cerimónia pública, realizada no Salão Nobre da Universidade do Minho, bem como a medalha de ouro da cidade do Porto. Recebia a amistosa gentileza da oferta dos dois volumes – “ O Cartulário do Mosteiro de Fiães”, em 2016, apresentado na alameda dos carvalhos centenários plantados pelos monges beneditinos. Só esta publicação era o bastante para imortalizar o nobre e profundo historiador que era o Professor José Marques. Tive ainda a enorme satisfação de receber das suas mãos a grande obra “Liber Fidei – Sanctae Bracarensis Ecclesia, em 2016, em dois volumes, em Sessão Solene realizada na Catedral de Braga, com a presença do cardeal Monteiro de Castro, testemunhando o apreço que o Vaticano nutria por tão notável historiador, que prestigiava a história da igreja católica. Mas o que cultivamos do Professor José Marques era a simplicidade, a amizade e o calor humano que manifestava nas suas relações. Era uma figura nobre, fidalga, carinhosa, e sempre disponível para ajudar os estudantes universitários e todos aqueles que a si se dirigiam, acompanhando diversas teses de doutoramento. Colaborou com imensas instituições, nomeadamente com o Município de Melgaço que a ele recorreu para vários trabalhos referentes à identidade melgacense. O cónego José Marques, sendo membro do Cabido Primaz de Braga, contribuiu para a dignificação da Arquidiocese de Braga, publicando a grande tese referente à Grande História do Tempo Longo. O ilustre académico e sacerdote era um amigo em todas as horas. A gratidão é memória do coração. Lembrar é fácil para quem tem memória. Esquecer é difícil para quem tem coração. Nós temos coração e sentimos o regresso do cónego Doutor José Marques à Casa do Pai. A luz que nos ilumina iluminará para sempre o historiador, sacerdote José Marques. Até sempre – BENEDICAMUS DOMINO por uma longa vida dedicada à igreja e à cultura.» (José Rodrigues Lima.)

 

     «Filho de Manuel António Marques e de Isalmira de Jesus Meleiro. Neto paterno José Joaquim Marques, natural de Fiães, e de Maria Lourenço, natural de Rouças; neto materno Manuel José Meleiro e de Angelina Vaz. Nasceu no lugar de Lobiô, freguesia de Rouças, a 12/08/1937. Depois da 4.ª classe, que fez em 1948 ou 1949, ingressou no Seminário de Braga, onde se manteve até Julho de 1961. Ordenou-se sacerdote a 15/08/1961 (A Voz de Melgaço de 1/03/2020) e cantou missa nova na igreja da sua freguesia a 27/08/1961. // Em Setembro de 1961 foi nomeado prefeito do Seminário Conciliar de Braga, onde esteve até 1970, tendo lecionado, aos alunos do 5.º ano de Humanidades, História Universal, Ciências Naturais e Religião. Em Outubro de 1969 matriculou-se no Curso de História da Faculdade de Letras do Porto, acabando o curso em 1974 com a classificação final de dezasseis valores. Em 1973, ainda como finalista, foi contratado como monitor do 4.º grupo da 2.ª secção da Faculdade de Letras, coadjuvando o Professor Doutor António Ferreira da Cruz na disciplina de Paleografia e Diplomática. A 14/11/1974 foi contratado como assistente eventual, passando, nos prazos legais, para a situação de assistente. Em 1975 e 1976 frequentou, e concluiu, o curso de Bibliotecário Arquivista da Faculdade de Letras de Coimbra, Na igreja católica ascendeu a cónego. Doutorou-se em História Medieval em 1982. A sua tese de doutoramento foi publicada com o título “A Arquidiocese de Braga no século XV” e, como trabalho complementar, “A Administração Municipal de Vila do Conde em 1466”, tendo ficado aprovado por unanimidade com distinção e louvor. Em Julho de 1989 prestou provas de agregação, tendo apresentado como lição de síntese “A Assistência no Norte de Portugal nos Finais da Idade Média.» Em Abril de 1990, na sequência de concurso nacional, foi provido como professor catedrático na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, tendo-se aposentado em Fevereiro de 2003. Dava aulas nas licenciaturas de História, Ciências Documentais, e mestrados em História Medieval. Ministrou cursos intensivos de Paleografia na Universidade de Niteroi, Brasil, e também na Faculdade de Filosofia de Braga, e na Pontifícia Biblioteca Vaticana, de Roma, e dois cursos de Diplomática e um de Codicologia (estudo de códices) na Universidade dos Açores. “Pertenceu a diversas associações científicas e culturais portuguesas e estrangeiras e participou em numerosos congressos, colóquios e outras reuniões científicas, em Portugal e no estrangeiro, nomeadamente em Espanha, França, Itália, Suíça, Inglaterra, Bélgica, Alemanha, Áustria, Hungria, antiga União Soviética, e Brasil. Como resultado da participação nestas reuniões científicas, da colaboração em revistas nacionais e estrangeiras, em obras coletivas, livros de homenagem, conferências, etc., o número de títulos publicados ascende atualmente (2006), a 209, sem incluir a colaboração de natureza histórica na imprensa diária e regional. Na sua investigação científica, apesar de ter abordado diversas áreas, privilegiou sobretudo a história eclesiástica e religiosa medieval da Arquidiocese de Braga.” Tem vários livros editados, entre eles “O Mosteiro de Fiães” (2005) e “A Origem da Capela de Alcobaça” (2010), e colaborou assiduamente no Boletim Cultural da Câmara Municipal de Melgaço entre 2002 e 2009, e em "A Voz de Melgaço", entre outras publicações, com artigos interessantíssimos. No dia 30/04/2011, no decorrer da Feira do Alvarinho e do Fumeiro de Melgaço, foi entrevistado pelos jornalistas da RTP-1, que se encontravam presentes no local a fim de cobrirem o evento. Nos poucos minutos que lhe concederam deu aos portugueses uma lição de história sobre a sua e nossa terra natal. Em Dezembro de 2018 é publicado mais um livro da sua autoria: “Confirmações de Tui (1352-1382) Aspetos do Episcopado de D. João de Castro.» // A 28/12/2018 foi internado no hospital particular de Braga, sito na Rua do Raio, onde a 2/01/2019, quarta-feira, foi operado a uma perna, devido a problemas com as veias. A 15/03/2019 ainda se encontrava internado nesse hospital; estava melhor da perna mas ia ser operado à próstata, salvo erro. Saiu do hospital em Maio de 2019 e passou a morar na residência dos sacerdotes católicos, na Rua de São Domingos, Braga, até se sentir com forças para voltar para o seu apartamento; a 4/06/2019 já andava na rua – muito magro, envelhecido, mas ainda com o cérebro lúcido. Morou na capital do Minho desde jovem, na freguesia de São Vicente, no seu apartamento, onde faleceu na noite de 28 para 29/01/2021. Certo dia, já há muitos anos, eu fui ao Arquivo de Braga a fim de contactar, de ver, o Cartulário do Mosteiro de Fiães. Sentei-me numa das cadeiras e um funcionário trouxe-me o manuscrito. Fiquei fascinado. Olhei para ele com carinho, folheei-o, mas não o consegui ler. O meu latim, quatro ou cinco anos, não me permitia a sua leitura. Logo que tive a oportunidade pedi ao meu amigo Professor Doutor José Marques que o traduzisse para português do nosso tempo. Não me prometeu nada, pois na altura lecionava na Universidade do Porto, além de ser membro ativo da igreja católica. No entanto, em 2016, eis que surgem nas livrarias dois extraordinários volumes do Cartulário de Fiães. Quando ambos fomos tomar café à Brasileira, em Braga, agradeci-lhe. Melgaço, e o país, mereciam esta obra. Não traduziu o texto para português, como lhe pedira, mas o volume I com a Introdução, Transcrição, Índices, ajudam-nos a compreender o conteúdo do Cartulário. A história de Melgaço, dos primeiros séculos, ficou enriquecida. O nosso concelho ficar-lhe-á eternamente reconhecido, grato, por este trabalho ciclópico, só possível a grandes investigadores. Em 2017 oferece-nos outra obra monumental, editada pela Casa Museu de Monção e Universidade do Minho, com o título “Alto Minho e Galiza – Estudos Históricos. São cerca de novecentas páginas de erudição, onde se revela longa e profunda pesquisa, numa linguagem acessível e verdadeira, e cuja leitura é agradável e didática. Portugal acaba de perder um dos seus melhores filhos; oxalá os melgacenses jamais esqueçam este seu conterrâneo, leiam os seus inúmeros escritos, aprendam as suas lições.» (Joaquim A. Rocha).  

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