segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

PROFESSOR DOUTOR JOSÉ MARQUES 



NOTA:  O Professor José Marques morreu em casa na noite de 28 para 29 de Janeiro de 2021; os seus admiradores e amigos publicaram em A Voz de Melgaço de 1/02/2021 interessantes artigos sobre a sua gigantesca obra. Esses escritos a homenageá-lo vão ser transcritos neste blogue até ao fim do mês. Quero aqui sublinhar que o Professor Marques é um dos melgacenses mais cultos, com mais obra produzida, alguma ainda não publicada. Faço votos para que os seus conterrâneos saibam aproveitar os seus ensinamentos, sobretudo os mais jovens.    


MARQUES, José (Cónego e Professor Doutor). Filho de Manuel António Marques e de Isalmira de Jesus Meleiro. Neto paterno de José Joaquim Marques, natural de Fiães, e de Maria Lourenço, natural de Rouças; neto materno de Manuel José Meleiro e de Angelina Vaz. Nasceu no lugar de Lobiô, freguesia de Rouças, a 12/8/1937. Depois da 4.ª classe, que fez em 1948, ou 1949, ingressou no Seminário de Braga, onde se manteve até Julho de 1961. // Ordenou-se sacerdote a 15/8/1961 (A Voz de Melgaço de 1/3/2020) e cantou missa nova na igreja da sua freguesia a 27/8/1961. // Em Setembro de 1961 foi nomeado prefeito do Seminário Conciliar de Braga, onde esteve até 1970, tendo lecionado História Universal, Ciências Naturais, e Religião, aos alunos do 5.º ano de Humanidades. // Em Outubro de 1969 matriculou-se no Curso de História da Faculdade de Letras do Porto, acabando o curso em 1974 com a classificação final de dezasseis (16) valores. // Em 1973, ainda como finalista, foi contratado como monitor do 4.º grupo da 2.ª Secção da Faculdade de Letras, coadjuvando o Prof. Doutor António Ferreira da Cruz na disciplina de Paleografia e Diplomática. // A 14/11/1974 foi contratado como assistente eventual, passando, nos prazos legais, para a situação de assistente. // Em 1975 e 1976 frequentou, e concluiu, o curso de Bibliotecário-Arquivista da Faculdade de Letras de Coimbra. // Na igreja católica ascendeu a cónego. // Doutorou-se em História Medieval em 1982. A sua tese de doutoramento foi publicada com o título “A Arquidiocese de Braga no século XV” e, como trabalho complementar “A Administração Municipal de Vila do Conde em 1466”, tendo ficado aprovado por unanimidade com distinção e louvor. // Em Julho de 1989 prestou provas de agregação, tendo apresentado como lição de síntese “A Assistência no Norte de Portugal nos Finais da Idade Média”. // Em Abril de 1990, na sequência de concurso nacional, foi provido como professor catedrático na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, tendo-se aposentado em Fevereiro de 2003. Dava aulas nas licenciaturas de História, Ciências Documentais, e Mestrados em História Medieval. // Ministrou cursos intensivos de Paleografia na Universidade de Niterói, Brasil, e também na Faculdade de Filosofia de Braga, e na Pontifícia Biblioteca Vaticana, de Roma, e dois cursos de Diplomática e um de Codicologia (estudo dos códices ou pergaminhos manuscritos) na Universidade dos Açores. // «Pertence a diversas associações científicas e culturais, portuguesas e estrangeiras, e participou em numerosos congressos, colóquios e outras reuniões científicas, em Portugal e no estrangeiro, nomeadamente em Espanha, França, Itália, Suíça, Inglaterra, Bélgica, Alemanha, Áustria, Hungria, antiga União Soviética, e Brasil. Como resultado da participação nestas reuniões científicas, da colaboração em revistas nacionais e estrangeiras, em obras coletivas, livros de homenagem, conferências, etc., o número de títulos publicados ascende, atualmente (*), a 209, sem incluir a colaboração de natureza histórica na imprensa diária e regional. Na sua investigação científica, apesar de ter abordado diversas áreas, privilegiou sobretudo a história eclesiástica e religiosa medieval da Arquidiocese de Braga.» // Tem vários livros editados, entre eles “O Mosteiro de Fiães” (1990), “Limites de Rouças e Fiães” (2005), e “A Origem da Capela de Alcobaça” (2010), e colaborou assiduamente no Boletim Cultural da Câmara Municipal de Melgaço entre 2002 e 2009. // No dia 30/4/2011, no decorrer da Feira do Alvarinho e do Fumeiro de Melgaço, foi entrevistado pelos jornalistas da RTP-1, que se encontravam presentes no local, a fim de cobrirem o evento. Em poucos minutos deu aos portugueses uma lição de história melgacense. // Em Dezembro de 2018 é publicado mais um livro da sua autoria: «Confirmações de Tui (1352-1382) Aspectos do episcopado de D. João de Castro.» // A 28/12/2018 foi internado no Hospital Particular de Braga, Rua do Raio, onde, a 2/1/2019, quarta-feira, foi operado a uma perna, devido a problemas com as veias. A 15/3/2019 ainda se encontrava internado nesse hospital; estava melhor da perna, mas ia ser operado à próstata, salvo erro. // Saiu do hospital em Maio de 2019 e passou a morar na residência dos sacerdotes católicos, na Rua de São Domingos, Braga, até se sentir com forças para voltar para o seu apartamento; a 4/6/2019 já andava na rua – muito magro, envelhecido, mas ainda com o cérebro lúcido. // Morou na capital do Minho desde jovem, na freguesia de São Vicente, no seu apartamento, onde faleceu na noite de 28 para 29/01/2021. // Certo dia, já há muitos anos, eu fui ao Arquivo de Braga a fim de contactar, de ver, o Cartulário do Mosteiro de Fiães. Sentei-me numa das cadeiras e um funcionário trouxe-me o manuscrito. Fiquei fascinado. Olhei para ele com carinho, folheei-o, mas não o consegui ler. O meu latim, quatro ou cinco anos, não me permitia a sua leitura. Logo que tive a oportunidade pedi ao meu amigo Prof. Dr. José Marques que o traduzisse para português do nosso tempo. Não me prometeu nada, pois na altura lecionava na Universidade do Porto, além de membro ativo da igreja católica. No entanto, em 2016 eis que surgem nas livrarias dois extraordinários volumes do Cartulário de Fiães. Quando ambos fomos tomar café à Brasileira, em Braga, agradeci-lhe. Melgaço, e o país, mereciam esta obra. Não traduziu o texto para português, como lhe pedira, mas o volume I, com a Introdução, Transcrição, Índices, ajudam-nos a compreender o conteúdo do Cartulário. A história de Melgaço, nos primeiros séculos, ficou enriquecida. O nosso concelho ficar-lhe-á eternamente reconhecido por este trabalho ciclópico, só possível a grandes investigadores. // Em 2017 oferece-nos outra obra monumental, editada pela Casa Museu de Monção/Universidade do Minho, com o título “ALTO-MINHO E GALIZA – ESTUDOS HISTÓRICOS. São cerca de novecentas páginas de erudição, onde se revela longa e profunda pesquisa, numa linguagem acessível e verdadeira. // Portugal acaba de perder um dos seus melhores filhos. Oxalá os melgacenses jamais esqueçam este seu conterrâneo, leiam os seus inúmeros escritos, aprendam as suas lições. /// (*) Estávamos em 2006.

     Depois da sua morte os amigos e admiradores publicaram em “A Voz de Melgaço” de Fevereiro, Março e Abril, de 2021, os seguintes artigos: 

     «Tinha pensado, caso não fosse sonhado, no Cónego José Marques há ainda poucos dias. Nunca foi meu professor, mas ensinou-me coisas importantes; nunca fomos “próximos”, mas sempre o senti como um que me era da Casa; nunca trabalhamos juntos, mas sempre que nos víamos era uma “festa” e não poucas vezes nos deixávamos estar em plena rua dos Chãos na cidade dos arcebispos, a falar disto ou daquilo, de História, a disciplina do Cónego Marques, ou Filosofia, a minha. Era sempre um prazer, um enorme prazer, dar de caras com o Cónego José Marques, fosse na igreja dos Congregados ou na Rua dos Chãos, ou qualquer outro lugar nos arredores dos espaços onde vivíamos. A última vez que vi o Sr. Cónego Marques foi, talvez, no verão passado, só que desta vez não conversamos: ele caminhava em frente ao liceu Sá de Miranda e eu guiava o carro em que viajava. Caso contrário, teria ido ao seu encontro. Pois, já então, sentia saudades dos nossos esporádicos encontros. Hoje, para além da Saudade, fico com pena de o não ter saudado pessoalmente, pelo menos, uma vez mais. Uma vez só que fosse! Braga e a igreja que nela está fica agora mais pobre; na verdade, muito mais pobre! Conto que o Cónego José Marques me leve consigo neste seu definitivo Abraço com o Amor do Pai. Descanse em paz, caro Cónego Marques. E obrigado! Sim, muito obrigado por tudo o que, mesmo parecendo pouco, na realidade me deu, tanto mais que o que me deu foi a imagem de uma Igreja capaz de sorrir mesmo por entre tudo quanto, ora aqui ora acolá, sempre nos entristece! – João Vila Chã – S. J  

 

     «É com pesar que informamos o falecimento do Professor Doutor José Marques. Foi um dos mais ilustres investigadores da História e Cultura do Alto Minho. Ao longo da sua vida foi colaborando com iniciativas dos diversos municípios alto minhotos, quer através das bibliotecas, quer dos arquivos municipais. Nasceu na freguesia de Rouças, em Melgaço, a 12/08/1937, e foi deixando a sua marca um pouco por todo o país. Em 1994 foi agraciado com a Medalha de Mérito – Grau Ouro da Câmara Municipal de Braga; em 2003 recebeu a Medalha de Ouro da Faculdade de Letras da Universidade do Porto; e em 2004 a Medalha de Mérito – Grau de Ouro da Câmara Municipal do Porto. Também o Governo português o consagrou com a Medalha de Mérito Cultural, na Universidade do Minho, sob proposta da Casa Museu de Monção. Em Agosto de 2017 o município de Melgaço honrou-o com o título de Cidadão de Honra. Uma justa homenagem! Distinto estudioso e leitor (paleógrafo) de documentos antigos, com grande valia e crítica, José Marques, além de distinto investigador, foi um notável professor universitário, coordenador, nomeadamente de pós licenciaturas e doutoramentos. É autor do Cartulário do Mosteiro de Fiães “uma obra que vai dar a conhecer muito do que é a história de Melgaço nos seus primórdios”, dizia o professor aquando do lançamento e apresentação da obra, em 2016. Deixou-nos ainda um importante legado: o livro ALTO MINHO E GALIZA – ESTUDOS HISTÓRICOS, uma edição do Município de Melgaço e da Casa Museu de Monção, com textos que ao longo do tempo o professor José Marques escreveu, em uma coordenação de Viriato Capela, presidente da Casa Museu de Monção. Obrigado! Foi decretado o dia de amanhã, 30 de Janeiro, dia de luto municipal.» (Câmara Municipal de Melgaço).  

 

     «Quando entrei para a Faculdade de Letras da Universidade do Porto em 1976 estava longe de imaginar que um dia o desaparecimento do Doutor José Marques me levasse a escrever umas breves, mas sinceras linhas de reconhecimento. Tendo sido aluna dele em duas cadeiras – História de Portugal Medieval no 2.º ano e Paleografia e Diplomática, já depois do curso concluído; reconheço que este académico medievalista de referência e com extensa obra publicada foi um excelente professor de fino trato e amigo. Foi no meu 2.º ano do curso de História da Faculdade de Letras que, como sua aluna, o conheci. Logo no início, pela sua pronúncia, percebi que devia ser do Alto Minho, talvez de Melgaço, e como tal podia conhecer a minha família. Quando o questionei, disse-me logo: “conheci muito bem o teu avô Firmino Salgado, de Rouças, e temos parentela comum!” Ao lembrar-me dele evoco a dedicação e o saber despertar nos seus alunos o interesse pelo estudo da Idade Média e da consolidação da nacionalidade portuguesa. Nos últimos anos consultei-o algumas vezes para me aconselhar ou elucidar na leitura paleográfica de assentos paroquiais de Melgaço, na freguesia de Rouças; como tal, sempre que um assento me suscitava dúvidas telefonava-lhe avisando-o (Filomena Salgado) que lhe enviaria o documento por correio eletrónico para me ajudar na sua leitura. Tive sempre o apoio e a orientação necessária de forma espontânea e amistosa. Recordo a última vez que nos encontramos pessoalmente: a sessão da apresentação do livro Cartulário do Mosteiro de Fiães numa tarde aprazível de agosto, na alameda de acesso ao mosteiro de Fiães, à sombra de carvalhos e castanheiros centenários. Ali o reencontrei com professores e antigos colegas da Faculdade de Letras do Porto que calorosamente o ouviram. Há um ano, pouco depois de me ter telefonado para desejar um bom natal para toda a minha família, ligou-me novamente, mas agora para felicitar a coragem da minha mãe que, com os seus 93 anos de idade, tinha feito algo que ele me disse admirar profundamente e já não ter ânimo para o realizar: ir passear para a terra santa e lá passar o natal. A notícia tinha-lhe chegado por este jornal – A Voz de Melgaço. Como interessada que sou pela história local e concretamente pela do concelho de Melgaço, a obra do Professor Doutor José Marques será sempre uma referência fundamental para estes estudos. Fui, sou e serei sempre sua discípula. Porto, 29/2/2021. // Filomena Salgado.» 

                                            // continua...        

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