terça-feira, 24 de janeiro de 2023

PROFESSOR DOUTOR JOSÉ MARQUES 


// continuação...


«Hoje, cerca do meio-dia, tive um telefonema do meu querido amigo Dr. Carlos Nuno Vaz participando-me, com a sua voz embargada de emoção, o falecimento de um outro grande amigo comum e conterrâneo, Cónego Professor Doutor José Marques, pedindo-me algumas palavras de testemunho. Quando assim é, aperta-se-nos a alma e não sabemos bem o que dizer, tanto mais que a pessoa em causa não era um amigo qualquer. Conhecemo-nos há muitos anos, era eu um moço de catorze, quinze anos, e estudava em Braga, em um tempo em que poucos eram os estudantes naquela cidade, sobretudo em família. Depois, dava-se o caso de que a Rua D. Pedro V, onde morava, ficava relativamente próxima do Seminário da Tamanca e, por isso, alguns seminaristas, em Outubro, antes de entrarem no Seminário faziam uma visita aos seus conterrâneos. O Prof. José Marques era uma dessas visitas. Mais tarde, como presidente da Câmara, em 1994, por ocasião da publicação do meu livro “A Praça Forte de Valença do Minho”, tive ocasião de convidá-lo para fazer a sua apresentação que gostosamente aceitou com um estudo aprofundado sobre a obra que era também a primeira de fôlego que eu publicava, o mesmo sucedendo em 2004 na 3.ª edição, reconhecendo que esta deixava a anterior “a quilómetros…” // Encontramo-nos em vários seminários em Pontevedra, Braga, Ponte de Lima, Santiago de Compostela, em convívios que eram sempre agradáveis, não apenas pela simpatia da sua presença, mas também pela simplicidade e pelo muito que sempre nos ensinava. Era um trabalhador incansável, aproveitando todos os momentos disponíveis para dedicar aos seus trabalhos, recordando-nos de em certa ocasião o vermos, em tempo de praia, em Vila Praia de Âncora, absorvido na elaboração dos seus trabalhos, pois nem mesmo em férias descansava. Dos mais de trezentos trabalhos que deixou publicados destacamos especialmente três que lhe eram extremamente caros: “A Arquidiocese de Braga no Século V” (tese de doutoramento), o “Cartulário do Mosteiro de Fiães” (dois volumes), apresentado com justíssima pompa no terreiro do mosteiro, e “Confirmações de Tui (1352-1382) / Aspetos do Episcopado de D. João de Castro”, todos eles de incalculável valor para o estudo da nossa região. Sou-lhe devedor da oferta de muitos dos seus trabalhos, sempre com dedicatórias muito gentis e incentivadoras e servem de motivo para, enquanto Deus quiser, continuar a merecer a sua amizade que será eterna, mas muito aquém da obra incomensurável que a todos nos deixou e às gerações futuras.» // Alberto Pereira de Castro.       

 

     «Perder um verdadeiro amigo custa mesmo muito. E assim de repente, ainda mais. Nesta edição do jornal que ele tanto apreciava e onde colaborava com verdadeiro gosto e sentido de missão, fazemos uma sentida homenagem com vários textos que refletem diferentes olhares, mas que convergem no essencial. Destacam a grandeza do Homem e do Sacerdote que, mais do que ser Professor Catedrático e Membro da Academia de História, propendia a estar realmente contente e feliz junto das suas raízes: familiares e de nascimento. Lobiô, Rouças; de formação académica e para o sacerdócio (Braga e Porto, sobretudo); de homem de fé sólida e esclarecida, imbuído de verdadeiro espírito evangélico. Isto traduzia-se na sua total disponibilidade para tudo o que lhe pediam, mesmo que isso alterasse os seus planos, como acontecia muitas vezes. // Companheiros no seminário, onde foi meu prefeito nos últimos anos de Teologia; nas férias, nas lides académicas e jornalísticas, o Doutor José Marques sabia valorizar o que aparentemente era secundário para outros. Sirva de exemplo a sua colaboração em “A Voz de Melgaço” e no “Diário do Minho”. Vi como nas suas provas universitárias de agregação, na Faculdade de Letras do Porto, estavam bem patentes alguns exemplares do humilde “A Voz de Melgaço”, onde tinha publicado textos, mormente de índole histórica. Estive na sua Missa Nova, como ele esteve na minha e de meu irmão, padre Júlio. Acompanhou-nos nos momentos de dor e luto: morte dos meus pais, de meus tios sacerdotes e de outros familiares. Fomos juntos a dezenas de funerais de colegas de sacerdócio. Soube encorajar, de palavra e com ações, as tomadas de posição que, como diretor do jornal, tinha de tomar, enviando uma palavra de incentivo e apreço. Apreciava sobremaneira o convívio dos sacerdotes naturais de Melgaço, de que guardava religiosamente as fotos dos mesmos. O último convívio foi em Vila Praia de Âncora, a 5/11/2019. De Braga fomos quatro no mesmo automóvel: ele, padre Lobato, padre Júlio e eu mesmo. Um dia memorável foi, sem dúvida, aquele 12/08/2016, na Alameda da Carvalheira de Fiães, para apresentação da obra “Cartulário de Fiães”, que tanto a peito tomou, e que conseguiu deixar-nos como testemunho indelével e fonte de conhecimentos e saber sobre a história do nosso concelho. Uma tarde muito quente, mas sumamente agradável de passar, à sombra daqueles carvalhos centenários, num bucolismo difícil de descrever, pois que só vendo, apreciando e sentindo, se pode atingir. Estive muitas vezes em Fiães, mas a magia daquela tarde foi muito, muito especial. Fazia ele 79 anos de idade. Que melhor prenda podia ter, rodeado de amigos, num local que tanto lhe dizia, e cuja beleza não se cansava de exaltar! Lá tinha frequentado a escola primária durante um ano. Depois veio para a de Rouças e alojou-se na residência paroquial, juntamente com o José Cândido Marques. // Outro momento marcante foi a apresentação da reedição crítica do “Liber Fidei” na capela de São Geraldo, da Sé de Braga. Desse facto e da obra do Doutor José Marques falou bem o Doutor Ernesto Português em texto que publicamos na edição de fevereiro de 2017. De outros momentos marcantes da vida profissional e académica falam outros amigos nas colunas deste jornal. Vou centrar-me um bocadinho na colaboração que enviou para o jornal nos últimos cinco anos. De 2016 realço a apresentação do livro “Cartulário de Fiães”, de que se fala na edição de setembro, páginas 1, 28 e 29, e os textos: “Primaz das Espanhas… e não de Braga”, em Julho, e “João Francisco Marques – Im Memoriam”, em Agosto… // Em 2017 há o relato de outra importantíssima apresentação, a do “Liber Fidei” na edição de fevereiro. Em maio é destacado o facto de ter sido agraciado com a medalha de mérito cultural do Ministério da Cultura, ao mesmo tempo que se apresentava no Salão Nobre da Reitoria da Universidade do Minho o livro “Alto Minho e Galiza – Estudos Históricos”, um volume de novecentas e uma páginas. Em julho há um texto dele: “Dois párocos de São Fagundo, na página treze. Em agosto: “Recordações de uma peregrinação beneditina”. Em novembro, a apresentação em Melgaço de “Alto Minho e Galiza”. // Em 2018 há um artigo sobre ele: “José Marques, nomeado académico correspondente da Academia Auriense e Mindoniense de San Rosendo”. Em Janeiro: “Dom Lourenço Vicente morreu há 620 anos”, páginas 28 e 29; em março há mais um texto seu: “De Rompecilla (Padrenda) para Rouças, página doze. Em junho: “Cubalhão em festa”, páginas 10 e 11. // Em 2019 “Capela de São Paio, depois Santa Rita, Rouças”; em maio “O arciprestado de Melgaço e Dom Frei Bartolomeu dos Mártires”, páginas 30 e 31. // Em 2020: “Inventário da extinção do mosteiro de Fiães”, em Janeiro; “Origem da capela de Barata na freguesia de São Paio, em fevereiro, páginas 32 e 33. “O Mosteiro de Fiães visto através do inventário de extinção”, em maio, páginas 6 e 7. “Senhora da Cabeça - programa iconográfico, Junho, página 27. “O forno de telha de Lamas de Mouro”, Julho, página 6. Este viria a ser o último texto por ele publicado neste jornal. // Sabendo das múltiplas solicitações que recebia de todo o lado e a que lhe custava muito dizer que não, pois se sentia sobrecarregado em excesso, não posso deixar de assinalar este especial amor à terra natal que estes textos entre muitos outros bem refletem. Vários alunos e amigos destacaram em publicações do facebook a sua humildade e simplicidade, que são apanágio e fazem grandes os grandes homens. E a sua devoção mariana fica excecionalmente bem refletida no nicho com a imagem da Virgem na sua casa de família, em Lobiô, diante da qual se juntam as pessoas no fim de tarde de maio para rezarem o terço. Com que enlevo me falava deste facto e de a sua gente mais próxima manter esta devoção a Nossa Senhora. Especialíssima também a devoção a Santa Rita, cuja visão da capela e obra o extasiava sempre que por lá passava a caminho da casa de família em Lobiô. E ainda a colaboração como membro da Mesa Administrativa de São Bento da Porta Aberta, lá se deslocando todos os meses e participando também na contagem das esmolas. A grandeza estava em servir, mesmo que a tarefa em si possa ser secundária para muitos. Durante quase 30 anos celebrou na Igreja dos Congregados, em Braga. Desse facto se mostraram reconhecidos e gratos os atuais reitores. Termino com uma prece adaptada da que consta no facebook do Seminário Maior de Braga: “Senhor, que fizeste da história um lugar de contínua salvação, dai suavidade à dor de quantos neste momento enchem os olhos de lágrimas e se cobrem de escurecido luto. Ao padre José Marques, que por décadas de generosa partilha humana e sacerdotal, sobretudo na docência e nas publicações, foi luz lançada às vicissitudes e aos factos passados, para compreendermos o enraizamento do presente e projetarmos solidamente o futuro, abraçai-o estreitamente na abundância do vosso coração de Pai”. // Padre Carlos Nuno Vaz.» 

// continua... 

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