sábado, 12 de outubro de 2024

SONETOS DO SOL E DA LUA

Por Joaquim A. Rocha 


// continuação de 19/08/2024.



SERAFIM

(159)

  

Um dia que porventura eu morra,

Ninguém – suponho - vai chorar por mim.

Dirão: «lá vai o pobre Serafim,

Engraçado, brincalhão, uma porra

 

Tinha por mãe uma pequena zorra,

Por pai tinha um pobre arlequim…

No penteado imitava o Tim-Tim

Na cabeça usava velha gorra.

 

Dizia-se amigo da pequena lua,

O seu deus era o valente Thor;

Falava como uma catatua…

 

O escuro era seu grande horror.

Ninguém o via à noite na rua,

O sol era o seu querido amor.

 

 *


 Capa Negra

(160)

 

Deslizava pela estreita rua,

Como movida pelo norte vento;

No cérebro ondas de pensamento,

Eclipses da terra, do sol e lua.

 

Chamaram por ela:… para, amua,

Transforma-se em choro e lamento;

Assoa o nariz num lenço cinzento,

Fica frágil, como estátua nua.

 

Tento aproximar-me, protege-la,

Levá-la para um lugar seguro;

Para a ilha mais linda, mais bela…

 

Onde o ar seja respirável, puro.

Sem anjos, serafins, deuses, capela,

Sem tronos, sem medos, sem forte muro.

 

 

ARNALDO DE MATOS

(161)

 

Morreu o Doutor Arnaldo de Matos,

Numa manhã fria de fevereiro,

Despedindo-se do mundo inteiro,

De leões, lobos, e até de ratos!

 

Gastou, no percurso, botas, sapatos,

Viu seus leprosos bolsos sem dinheiro;

 Sem crédito pra comer no taberneiro,

Mastigou mil sapos, cobras, couratos.

 

Lutou pelo vero socialismo,

Uniu-se a camponeses, operários;

Dormiu em horríveis colchões de palha...

 

Sonhou o fim do imperialismo,

Esse vil universo de falsários,

Onde só vinga a força da canalha!  

 

  

MALDADE

(162)

  

Paira nos ares a subtil maldade,

Com seus fartos odres cheios de ódio;

Tem corpo esbelto, julga-se no pódio,

Simboliza um tempo sem idade.

 

Sempre cheia de orgulho e vaidade,

Queima mais do que o próprio sódio;

 Brilha bem mais do que o letal nódio,

Não tem amor, pena, honestidade.

 

Tem olhos de bruxa vil, peçonhenta,

A vingança mora na sua mente;

É louca, senil, ladra, rabugenta…

 

Quando faz mal fica alegre, contente,

Essa coisa asquerosa, nojenta,

Que não é cobra, muito menos gente!


// continua...

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