quinta-feira, 25 de agosto de 2022

FERREIRA DA SILVA (...) 

Por Joaquim A. Rocha


// continuação de 18/06/2022...


     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1485, de 22/9/1963: «PARAGEM DA CARREIRA. // Em Maio do corrente ano foi entregue na Direção Geral de Transportes Terrestres uma exposição endereçada a Sua Excelência o Ministro das Comunicações, na qual se solicitava a sinalização com as respetivas placas de paragem nos locais intermédios entre as Vilas de Melgaço e de Castro Laboreiro. A exposição foi assinada por algumas dezenas de pessoas de representação no clero, comércio, indústria, e outros interessados particulares, e nela se fez (sentir) a urgente necessidade de se sinalizarem os locais de paragem obrigatória no percurso desta Vila (SMP) a Castro Laboreiro cuja carreira serve, subsidiariamente, as freguesias de Rouças, São Paio, Cousso, Gave, Parada do Monte, Cubalhão, Lamas de Mouro e Peneda. O documento seguiu os trâmites legais nos termos do Regulamento dos Transportes Automóveis e remetido para informação à Polícia de Viação e Trânsito que, para o efeito, se deslocou a esta Vila e ouviu sobre o assunto o concessionário da carreira e o primeiro signatário autor da exposição. Desde logo ficou estabelecido que a carreira Melgaço-Castro Laboreiro, a partir dessa data, passaria a parar obrigatoriamente ao quilómetro 99,326 da EN número 202, isto é, no local indicado na planta anexa da exposição a uns trinta metros aproximadamente da (…) do leque de concordância na confluência das duas estradas Melgaço-Castro Laboreiro-Monção. Agora, tornando oficial o que ficou estabelecido na presença do Chefe da Polícia de Viação e Trânsito de Monção, o signatário recebeu o ofício do (teor) seguinte: “Serviço da República. Ministério das Comunicações. Direção Geral dos Transportes Terrestres. 3.ª Repartição. Excelentíssimo Senhor Gerente da firma António Joaquim Esteves & Filhas, Limitada, (Estrada) do Rio do Porto, Melgaço. Sua Referência Exposição. Sua Comunicação = Maio de 1963. Ofício n.º (14996) – III – MTE. Processo n.º 2286. Lisboa. Portugal 18/9/1963. Assunto: placas de paragem de autocarros. Reportando-me à exposição em referência, dirigida a Sua Excelência o Ministro das Comunicações, e de que essa firma foi a primeira signatária, informo V. Excelência que nesta data, e depois de ouvida a Polícia de Viação e Trânsito, é solicitada à Junta Autónoma das Estradas a colocação de uma placa de paragem ao quilómetro 99, 326 da E.N. 202, para a carreira de Castro Laboreiro-Melgaço. A Bem da Nação. Pelo Engenheiro Diretor Geral J. E. Cunha. O caso, em nossa opinião, está incompletamente solucionado visto que, deu-se satisfação e deferimento à reclamação do primeiro signatário da exposição mas, deixou-se por resolver a sinalização dos locais intermédios do percurso daquela carreira, que dão acesso aos inúmeros lugares das oito freguesias antes aqui referidas. O assunto acha-se regulado pelos artigos 100.º e 187.º do Regulamento dos Transportes Automóveis, e não é favor conceder o que sancionam as citadas disposições legais. À polícia de viação e trânsito pareceu que resolvida a reclamação do primeiro signatário da exposição (daquele que não se cala nem se amedronta) resolvida estava a dos outros peticionários – resolvida por negação, evidentemente. O que se pediu na exposição foi a sinalização dos locais de paragem intermediários na estrada Melgaço-Castro Laboreiro e não, apenas, o único local de paragem obrigatório a que se refere o ofício transcrito. Em exame superficial parece que o caso não tem importância se, como é de esperar, o concessionário der aos condutores as devidas instruções, de pararem as caminhetas para entrada e saída de passageiros nos locais mais próximos dos caminhos de acesso às freguesias situadas ao longo do percurso. Mas não é assim. Além de não ser admissível que as gentes das aludidas oito freguesias fiquem na dependência da vontade dos condutores das caminhetas, variável com a sua boa ou má disposição do momento, há que atender a que a sinalização de todo o percurso, como se pediu, implica a criação de zonas e fixação de preços ou tarifas quilométricas, tornando as viagens mais económicas. Nisto falhou, não se sabe porquê, a intervenção da Polícia de Viação e Trânsito, na informação que superiormente foi chamada a dar. Nós, porém, não nos damos por satisfeitos e pugnaremos sem desfalecimentos pelos interesses do povo melgacense.» F.S. 

 

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     Escreveu no Notícias de Melgaço n.º 1485, de 22/9/1963: «QUEIMA. // Com insistência e persistentemente o Grémio da Lavoura deste concelho vem solicitando em vários ofícios endereçados à Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes as devidas facilidades no sentido de regularizar o serviço da queima. E a devoção e cuidado do nosso Grémio tem ido até ao ponto de apresentar um plano racional das normas a que em seu entender aquela Comissão deveria sujeitar o serviço de entregas dos vinhos, a de mandar uma relação em duplicado dos produtores inscritos agrupados por lugares e freguesias. Que destino se deu à relação dos inscritos cuidadosamente organizada pelo Grémio? Até ao nosso conhecimento chegou a revelação espantosa, íamos a dizer criminosa, de que a referida relação dos produtores inscritos foi parar, não se sabe por que artes maquiavélicas de autêntica escamoteação e descaminho, a uma destilaria dos Arcos de Valdevez! Mais, que os funcionários da destilaria de Monção ignoram completamente o que o Grémio solicitou da Comissão de Viticultura dos Vinhos Verdes relativamente às normas a observar quanto ao vinho deste concelho destinado à queima! Como se compreendem estes deslizes, ou mais propriamente esta estranha atitude da C. V. R. V. Verdes que, em vez de prestar ao nosso Grémio a cooperação que lhe é devida, responde esfingicamente, com o prudente silêncio de Conrado (*) ou o que é pior, com recusas e sucessivas negativas da sua variada coleção?! Sabemos e repetimos uma vez mais que o serviço da queima em Monção está a correr muito mal. Há casos de registo inexato dos vinhos ali entregues. Pode isto continuar?! Qual é, claramente, a atitude da Comissão de Viticultura dos Vinhos Verdes? É preciso que se saiba, e já. Se esse organismo, ao qual legal e moralmente compete orientar e dirigir a disciplina da queima e os interesses legítimos dos produtores, não está à altura da responsabilidade das suas atribuições, o caminho, a atitude que dignamente se lhes impõe, é deixar os seus cargos a quem melhor e mais atentamente atende aos problemas da lavoura, e os integre na Ordem Corporativa que lhe cumpre acatar e defender. Os organismos primários e superiores integrados nos quadros da ordem corporativa ou cumprem conscientemente a sua função, ou então, comprometem e desacreditam irremediavelmente o prestígio do regime que com tantas dificuldades o Estado tem procurado erigir e laboriosamente ordenar. Acima da Comissão Reguladora da Região dos Vinhos Verdes não haverá alguém que mande e se lhe sobreponha? Vamos indagar, mas se há alguém superior desde já chamamos para este assunto a sua esclarecida atenção e esperamos que providências sejam tomadas.» F.S.     

                     

      No Notícias de Melgaço n.º 1486, de 29/9/1963, escreveu: «NOVO EDIFÍCIO ESCOLAR. // Não nos fatigamos de apreciar o panorama formosíssimo que nos oferece o varandim da (…) avenida que circunda a parte histórica da nossa vila, que parte do largo cimeiro da Praça da República, envolve em um abraço fraternal as velhas muralhas e termina no Largo Hermenegildo Solheiro. E, certamente, um dos mais belos miradouros da sede do nosso concelho e dali se avistam deslumbrantes trechos de paisagem policroma e casais (verdura) imaculada, num fundo colorido e largo horizonte que extasia e prende de encantamento o nosso olhar. Na íngreme encosta que do planalto se estende até ao rio, a surribagem (*) e fertilidade da (…) excecionalmente produtiva – que se estende em monumental e majestosa escadaria de verdes socalcos, revela a transpiração, os sofrimentos e as lágrimas dos seus arquitetos construtores. Em frente, num pano de fundo que das povoações ribeirinhas se ergue até às cumeadas e picos altíssimos da formação orográfica do país vizinho, admira-se um belo quadro cheio de cor e majestade. Jamais nos cansamos de espraiar a vista por esse panorama ímpar, de beleza forte, e de encantamento estranho, que dos olhos passa ao coração, e agita fortemente a nossa sensibilidade.

 

     Num dos últimos passeios pela avenida, sentindo o odor das tílias e o encanto da paisagem, terminada a fase da meditação e do estro poético, reparamos no adiantamento das obras do edifício das escolas e foi com satisfação que da sua estrutura exterior adquirimos a certeza de que, em breve, a mocidade escolar melgacense do ensino primário será transferida das espeluncas onde, atualmente, recebe o pão do espírito, para se instalar no moderno e arejado edifício escolar. Os edifícios escolares têm grande influência na educação da mocidade; transmite-lhes hábitos de ordem, de asseio, e de limpeza que seria impossível ministrar-lhes nos antros imundos, adaptados acidentalmente ao ensino, por melhor que seja a vontade, o espírito de sacrifício e de interesse dos respetivos professores. Não basta a competência técnica e o esforço do professorado, se o meio ambiente não o ajuda e não se presta no desempenho da sua nobre missão. Somos de opinião que o dispêndio de grandes verbas destinadas a propagação do ensino, em vencimentos razoáveis aos professores, em edifícios escolares, em material didático, campos de jogos, cantinas, bibliotecas, etc., constituiu capital reprodutivo, por ventura, o capital mais rendoso que o Estado pode empregar. Não há maior e melhor juro do que aquele que se destina à educação moral e intelectual da mocidade, à formação dos homens do futuro, aos novos germes da sociedade, destinados a tornar digna e admirada a sua terra, isto é, a engrandecer e a tornar respeitada a sua Pátria. Ao professor primário, em especial, cabe a alta e patriótica missão de ensinar a mocidade e transformar a população escolar nos homens de amanhã, naqueles que no devir receberão a pesada herança de dignificar e defender a nacionalidade em todos os quadrantes e obrigações históricas. O novo edifício escolar deve ser tido como a catedral melgacense, que todos deveremos olhar respeitosa e religiosamente, como o monumento mais caro e mais chegado aos nossos sentimentos de devoção e de bem-querer. A obra de pedreiro está concluída e terminada a armação da respetiva cobertura; segue-se a obra de carpinteiro, cujas peças são fornecidas pela serração em condições de aplicação imediata, do reboco e da pintura. Em breve teremos a cerimónia da inauguração, em que os melgacenses deverão elevar ao alto os seus corações, em homenagem a tão festivo ato, o maior dos últimos anos. Desejaríamos incitar desta tribuna a população da vila, e seu termo, a festejar o acontecimento com euforia e entusiasmo, pois bem o merece tão grande e útil melhoramento. Pena foi que se retardasse o início da sua construção e se tivesse perdido tanto tempo.» F.S. /// (*) Lê-se no Grande Dicionário da Língua Portuguesa de José Pedro Machado: «surribar – escavar para afofar (a terra). Romper (a terra) a grande profundidade, especialmente para a desbravar...»  

 

      No dito número do jornal (1486, de 29/9/1963) publicou: «CONTINUANDO... // A título estatístico publicamos os seguintes números respeitantes à queima de vinhos pela destilaria de Monção, referidos aos vinte dias de trabalho, desde 9 de Setembro último – início do serviço de queima – e à razão de vinte pipas por dia útil. Total em vinte dias de trabalho - quatrocentas pipas assim distribuído: (…). Traduzido em percentagem, teremos: Valença 7,25%; Melgaço, 18,75%; Monção 74/%. Se considerarmos o número de pipas manifestadas para a queima (vide Notícias de Melgaço n.º 1483, de 1 de Setembro de 1963) as percentagens relativas a cada um daqueles concelhos seriam: Valença 11%; Melgaço 34%; Monção 55%. Assim, os concelhos de Valença e de Melgaço estão desfalcados: Valença 3,75%; Melgaço 15,25%. Em contrapartida o concelho de Monção está beneficiado em 19%. Será isto defensável? Qualquer serviço ou instituição para que possa ser acreditado e digno deve alicerçar-se na verdade, na justiça e na honestidade. O que está a passar-se na queima pela destilaria de Monção nem é justo, nem honesto, nem verdadeiro. E nós estamos fartos de mentiras, de injustiças e de improbidade. Os produtores melgacenses entregaram confiadamente ao seu Grémio da Lavoura e este, honra lhe seja feita, tem pugnado corajosa e firmemente pelos interesses legítimos dos seus agremiados. Mas a verdade é que da parte da C.V.R.V. Verdes não tem encontrado correspondência e até tem sido contrariados os seus louváveis esforços. Está isto certo? É isto justo? É isto honesto? Não será isto agir em detrimento da organização corporativa? Para que serve a C.V.R.V. Verdes? Para sustentar um estado-maior do pessoal cuja atuação é de resultados duvidosos ou propositadamente ineficazes, olhando de alto os grémios da lavoura como um grande senhor olharia os seus vassalos?! Continuará a importante Comissão a abusar da nossa paciência? Quosque tamdem…» // F.S.

 

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     Lê-se ainda no Notícias de Melgaço n.º 1486, de 29/9/1963: «ÁGUA PÚBLICA. // Não há dúvida que o abastecimento de água potável à nossa vila constituiu melhoramento indispensável e útil ao asseio e à saúde da população. Simplesmente este género de empreendimento exige estudo cuidadoso e sério, tanto no que respeita à prospeção da apreciada linfa como nos materiais da respetiva distribuição. Ora, estão a tornar-se frequentíssimas as avarias na rede de distribuição, em razão do rebentamento dos condutores, por vezes de difícil localização. E senão diga-o o Carriço (perdoe-nos o Alberto que usemos do seu “sobriquet”) que anda continuamente em bolandas em busca das fugas da água e os melgacenses aflitos com a falta do precioso líquido nas suas habitações. Há dias que o empregado da secção do abastecimento de água procura afanosamente, dia e noite, a fuga que esgota o depósito da nascente sem que consiga ver o resultado do seu esforçado labor. Estas fugas dão-se com uma frequência apavorante, causam prejuízos graves e as maiores arrelias aos consumidores. Parece que o mal vem da estrutura da tubagem ou condutas construídas, defeituosamente, sem provas de resistência à pressão, e de materiais impróprios, tanto em qualidade como em doseamento. Diz-se, para aí, que o presidente da Câmara de então, que fez a aquisição das condutas, foi avisado de que estas não satisfaziam o fim a que se destinam e, por tal motivo, teriam sido rejeitadas por outra Câmara. Por outro lado, parece que a entidade fornecedora não ficou contratualmente obrigada à substituição dos tubos de condução avariados ou estourados pela pressão a que estão submetidos, o que revela criminosa imprevidência e faz supor o que não dizemos por o não querermos acreditar. Todavia, isto é caso que merece ser aprofundado e averiguado, visto que na parte que diz respeito à Câmara há que considerar a substituição, à sua custa, das tubagens, o levantamento e reposição das calçadas e o prejuízo da falta do recebimento do custo da água não fornecida aos consumidores; da parte dos consumidores há que ter em conta o prejuízo resultante da falta de água, com todas as perturbações consequentes na vida doméstica, e o indevido pagamento dos mínimos não consumidos. Não seria tempo, ainda, de chamar à responsabilidade os responsáveis por esta espantosa situação, movendo-lhe ação por perdas e danos a satisfazer pelos seus bens pessoais. Entendemos que erros desta natureza, ou decisões suscetíveis de outra designação, não devem ser ilibados com crítica, mesmo violenta, mas sim pela responsabilidade civil ou penal, ou por ambas, conforme os casos, tomada aos seus autores ou fautores. É tempo de exigir moralidade e justeza técnica nos serviços públicos e a responsabilidade pessoal por falta de cautela na aquisição e segurança na distribuição dos materiais. Em tempos idos gritar-se-ia: “aqui de el-rei”; ou mais democraticamente “ó da guarda!” // F.S.   

 

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           No Notícias de Melgaço n.º 1487, de 6/10/1963, podemos ler o seu artigo: «MONS PARTURIENS. // Largamente anunciada há muito tempo e à socapa, a parentes, amigos e conhecidos, deu finalmente à luz da estampa a estirada e contundente catilinária contra o que publicamos sob o título “Entre Aspas”, no n.º 2482, deste jornal. Custou, mas saiu. Certamente, ao esforço empregado deverá atribuir-se o mau cheiro da incompreensão e despeito da articulista. Sob o pseudónimo de “Uma Castreja”, a presunçosa aspirante ao título da 1.ª dama melgacense tomou posição no tabuleiro, como parceira infeliz de um jogo mal começado e condenado, de antemão, a resultados negativos. Desta sorte, pediu que lhe escrevessem a longa palinódia do requisitório inserto em A Voz de Melgaço a propósito da nossa representação no Cortejo Etnográfico e do Trabalho, deturpando e demonstrando não ter compreendido a ideia mestra a que obedeceu a crítica aos cabides dos trajes castrejos. E, valha a verdade, desta feita, quem satisfez a vaidade de “Uma Castreja” produziu algo diferente do anterior nabo laudatório já composto e retirado, às pressas, da publicidade. Ora, quem ler atentamente a nossa crítica ao património etnográfico castrejo, não necessita de ser muito esperto para concluir que pretendíamos evitar novas falsificações, revestindo de autenticidade as nossas futuras representações. Distinguimos entre “Festas do Traje” e “Cortejos Etnográficos e do Trabalho.” O que vimos no Cortejo de Viana dificilmente se enquadraria numa “Festa do Traje” visto que, a castreja veste-se de burel, usa polainas ao jeito de grevas, socos fechados, luvas de lã sem dedos, lenço por baixo da capucha escura, que lhe dá um recorte monástico e reflete a paisagem tristonha e a vida dura e agreste dos serranos; acrescente-se a este quadro o traje com fateiro, o de festa das moças “rapaças” (termo galego, salvo erro), das fainas agrícolas, do pastorício, do casamento e do luto (com os maridos ausentes ou viúvas) e teremos uma representação quase completa do traje castrejo, digna de ser estudada e apreciada. Admitimos que as gentis professoras e estudantes poderiam, sem inconveniente, servir de modelos ou de simples e prosaicos cabides dos trajes serranos numa “Festa do Traje”; porém, contestamos a sua presença num “Cortejo Etnográfico e do Trabalho”, cujos figurantes devem ser autênticos, reais, de caras frescas lavadas com sabão, sem ademanes, nem meneios ou movimentos e atitudes de gente puxada à civilização. Acrescentaremos para elucidação da articulista que não somos contra o uso dos produtos de beleza de toucador, quando aplicados levemente e com arte nas simpáticas carinhas que tivemos o prazer de contemplar; em contraste, negamos legitimidade ao seu uso em caras lavadas das raparigas serranas, que consideramos um verdadeiro atentado à beleza e às cores naturais e saudáveis da sua cútis. Relutância maior manifestamos quanto à aplicação daqueles produtos em epidermes enrugadas, onde os estragos do tempo exigiriam consumo excessivo de tintas e pomadas para compor e irizar a descorada imagem do sol poente… Com que então o jornalista mentiu ao anotar que a nossa representação se confundira com a do Soajo e a ela não se referiram os jornais da sua leitura habitual?! Aludíamos ao Primeiro de Janeiro que supomos ser o jornal diário de maior circulação no país, não falando naqueles outros que se limitaram a copiar o que constava do programa do Cortejo… Sobre o primeiro reparo, afirmámo-lo de ciência certa com base no que ouvimos, distintamente, a espectadores que mais perto de nós se encontravam entre a assistência; quanto ao apodo ultrajante, designado por mentira… que pena o escrevinhador do requisitório ter posto nos lábios de “Uma Castreja” uma palavra tão feia e grosseira, comprometendo-a em atitudes deselegantes e sem elevação! Acaso a nossa interlocutora conhece o significado do vocábulo – mentira - ?! Abra qualquer léxico ao acaso, antigo ou moderno: Frei Domingos Vieira, Morais, Lelo, Moreno, Cardoso Júnior, ou as enciclopédias de Maximiano de Lemos, Portuguesa Brasileira, e nelas poderá ler «Mentira – afirmação contrária à verdade com intenção de enganar», fraude, etc. Será legítimo concluir da nossa afirmação a intenção de enganar?! A resposta deixamo-la em suspenso, entregue à consciência de quem lançou o aleivoso apodo se, na verdade, é católico e temente a Deus. Relativamente ao “bicho que nos teria mordido”, quedamo-nos embaraçados e, com franqueza, não nos lembramos de qualquer contacto com a articulista, salvo se, sub-repticiamente, nos transmitiu algum “Pediculus” ou Phthinius pubis”, variedade degradada dos “Pediculídeos” com habitat nas florestas capilares. Neste caso, ter-nos-ia pregado uma boa peça, e ficaria excluída a hipótese improvável de mordedura da nossa arguente, cuja dentição reputamos fracatível (!) para atentar contra a rijeza da nossa pele – que é pele do diabo. Finalmente, ao jeito de peroração e para terminar, lamentamos, muito sinceramente, a frustração da articulista, aludindo sentidamente, à infecundidade e ao mistério da renovação da vida, representadas pela boneca em vez da criança que a componente do fateiro deveria transportar. Fiquemos por aqui, até ver… // F.S.    

 

 

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     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1488, de 20/10/1963: «SOLDADOS DA PAZ. // Lemos há dias nos jornais a distribuição pelas diversas corporações dos bombeiros voluntários da verba cobrada para o serviço de incêndios. Na zona norte, a que pertencemos, lá vinham contempladas as numerosas corporações dos bombeiros voluntários, com a indicação da verba que lhes era atribuída pelo respetivo inspetor. Com que tristeza verificamos a ausência do nosso concelho que, mais uma vez, foi excluído da distribuição. Porquê?! Porque a Corporação de BVM existe no papel mas de facto não conseguiu ainda reorganizar o seu corpo ativo e assim não tem, praticamente, existência real e efetiva. Ora, as verbas a distribuir anualmente pelos inspetores das zonas norte e sul destinam-se à aquisição de material para o serviço de ataque e extinção de incêndios, de assistência e socorro a calamidades públicas e de equipamento do pessoal do corpo ativo. No que respeita ao serviço de incêndios o material a adquirir exprime-se em autocarros ou jipes equipados com motobombas, sarilhos de manga, absorvos, extintores, croques, machados, escadas de ganchos ou de lanços, etc.; quanto à assistência e socorro a desastres e calamidades públicas, traduz-se em automacas, material sanitário, pronto-socorro, etc.; finalmente quanto ao equipamento do corpo ativo, em capacetes, cintos, ganchos de clavina, machadinhas, etc. Como referimos anteriormente é condição sine qua non para receber o benefício anual da distribuição da verba global do imposto cobrado para o serviço de incêndios a existência real e efetiva do corpo ativo dos bombeiros. Não havendo bombeiros não há distribuição de verba, por isso que, logicamente, não há quem maneje utilmente e tecnicamente o material. Ignoramos o que no capítulo de reorganização do corpo ativo dos bombeiros tem feito a nossa Associação Humanitária. Não aceitamos a ideia de que o assunto terá sido esquecido ou abandonado por inércia da respetiva direção ou por outro qualquer motivo e, não acreditamos na impossibilidade de restaurar a ética do bombeiro voluntário, recrutando-o no resto da população válida, que ainda não emigrou e continua agarrada ao cortiço da vila, na plenitude do seu bairrismo e dos seus sentimentos humanitários. Tenhamos na devida atenção as centenas de milhares de escudos que perdemos nestes anos atrasados por não termos um corpo ativo de bombeiros; o que temos em material de incêndios é sucata inaproveitável que tem apodrecido, ingloriamente, nas arrecadações do edifício associativo e que para nada servirá no caso de um sinistro anormal e violento reclamar o esforço, o auxílio e a solidariedade de todos nós. A extinção de incêndios a balde fez a sua época e hoje é ineficiente, tendo em vista a ligeireza das edificações e as matérias inflamáveis que nelas se empregam, não esquecendo os novos perigos criados por curtos-circuitos, etc. O que neste concelho está a passar-se em matéria de prevenção e extinção do perigo de incêndio revela uma imprevidência criminosa, da qual só daremos conta quando tivermos de enfrentar um sinistro sério e extenso. Será então tarde; não conseguiremos debelar o inevitável. A direção da Associação Humanitária dos BVM deve urgentemente tomar a iniciativa de chamar todas as influências locais em ordem a pugnar pela reorganização do corpo ativo e iniciar a campanha de que todas as pessoas válidas, sem distinção de classes, devem sentir-se honradas de se alistarem nas fileiras dos Soldados da Paz. // F.S.

 

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     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1489, de 27/10/1963: «SITUAÇÃO GRAVE. // Continuam … as buscas infrutíferas dos desvios das águas da nascente abastecedora da Vila. Em qualquer ponto da rede de abastecimento dá-se o rompimento da conduta e até agora não é possível localizá-lo. Estas avarias são frequentes e por vezes são difíceis de encontrar. Quando os terrenos atravessados pelas condutas são relativamente impermeáveis, a água, submetida à pressão do desnível, irrompe e aparece à superfície dos arruamentos indicando o sítio da avaria; mas em uma terra como esta, em que o subsolo é cortado por canalizações de levadas, com destino às regas dos campos e de condução das águas pluviais, se acontece que uma das condutas de abastecimento das águas potáveis rebente, ao lado ou cima dessas canalizações, então só por milagre a localização da avaria se faz a tempo de não deixar a população sem a preciosa linfa. A última rutura nas condutas de abastecimento ainda não foi encontrada, e já lá vão uns bons quinze dias, tendo-se lutado com falta de água no período das vindimas, em que tão necessária é para a lavagem do vasilhame, das adegas, etc. Entretanto, o pobre do Alberto continua a procurar, sem resultado visível, o ponto fraco do escoamento da mina e do depósito abastecedor de água potável. Estes casos de rompimento das condutas, por deficiência de fabrico, são frequentíssimos e dão-nos uma noção clara das tremendas dificuldades que o futuro nos reserva. A situação é grave. É mesmo muito grave! Está provado que as condutas em serviço não resistem à pressão a que estão submetidas e, positivamente, não satisfazem ao fim que lhes é exigido e lhes foi destinado. Os fornecimentos de materiais aos municípios e, sem exceção, aos serviços públicos, obedecem a requisitos de segurança bem estudados, filhos de larga experiência. Esses requisitos foram adotados e traduzidos em regras e disposições normativas incluídas nos respetivos cadernos de encargos, nos quais também se estabelecem o calibre ou diâmetro interno das canalizações, desenvolvimento axial, condições de resistência à corrosão interna e externa, esforços a que tenham de ser sujeitos, perfeição do fabrico e excelência dos materiais, pressões e experiência das condições do serviço, traduzidas em escala manométrica, garantias e responsabilidades sob a forma de cauções, multas pecuniárias, etc. As autoridades administrativas não podem ser iludidas quando cumpram o seu dever, visto que os fornecimentos aos seus serviços são feitos precedendo concursos públicos, sujeitos a caderno de encargos e às mais rigorosas experiências, devidamente fiscalizadas. Parece que dúvidas não há quanto à responsabilidade civil e penal das autoridades administrativas, pelos atos praticados, em que se verifique incompetência, excesso de poder, preterição de formalidades, violação da lei, etc. Ora no caso do concurso (se o houve), do não cumprimento do caderno de encargos, aquisição sem prévio certificado da qualidade dos materiais, defeitos de fabrico e falta de experiência das canalizações da rede de abastecimento de água potável, não resta dúvida de que os responsáveis estão sujeitos, pessoalmente, às responsabilidades e indemnizações de perdas e danos estabelecidos nos códigos civil, administrativo e penal. Quem indemniza o nosso município pelo montante do custo da substituição das canalizações (que, em nossa opinião têm de ser levantadas e substituídas por outras, na totalidade), no levantamento e reposição dos arruamentos, na recolocação, à devida profundidade e fora das faixas de rodagem, das condutas, dispositivos de segurança, etc.? A nossa Câmara não tem dinheiro para obra de tal vulto, mas os responsáveis pelas aquisições das condutas, não obstante terem sido rejeitadas por outrem, têm bens de fortuna para repararem os danos causados. Nos termos da lei são pessoalmente responsáveis, e não só perante o município mas também perante os munícipes consumidores de água potável, pelos prejuízos sofridos na sua vida doméstica e no pagamento dos mínimos indevidamente cobrados. Não haverá um homem duro e forte que pratique a boa obra de rever a administração do passado e responsabilizar, por ela, os seus executores?! Responda quem puder e souber.» // F.S.   

 

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     Publicou no Notícias de Melgaço n.º 1490, de 3/11/1963, o seguinte artigo: «ADEGA COOPERATIVA. // O Grémio da Lavoura, pela voz e ação do seu ilustre Presidente, nosso colaborador e amigo, professor Ascensão Afonso, chamou a atenção aos viticultores melgacenses para as vantagens que resultariam da constituição de uma sociedade destinada ao estabelecimento da adega cooperativa no nosso concelho. Ninguém deu ouvidos à autorizada e insistente (..) deste importante empreendimento que consideramos fundamental na resolução do problema da economia do vinho verde na nossa região, não obstante ter-se salientado o valor da instituição, do seu apetrechamento e do modo como seria financiada. A taxa de crescimento da produção vinícola do nosso concelho está distante ainda do seu limite, porém, na penúltima colheita já evidenciou, alarmantemente (apreensível), o terrível destino reservado aos viticultores que teimam em optar pelo fabrico individual em condições obsoletas e tecnicamente primitivas, minimizando as qualidades, a conservação sanitária (!) e a colocação dos vinhos nos mercados, a preços compensadores. Até 31 de Dezembro do ano passado foram manifestadas no Grémio da Lavoura de Melgaço (vide mapa número 3 do Relatório), 7324 pipas de vinho tinto e branco produzido no concelho, número este que reputamos bastante inferior ao real, porquanto, não andaremos muito longe da verdade, computando-o em dez mil pipas ou sejam 5.000.000 de litros. O nosso concelho é, sem dúvida, um concelho predominantemente vinícola e, como tal, deve ser considerado pelas instâncias oficiais. O plantio e enxerto de bacelos é cada vez maior e traduz-se, anualmente em progressivo aumento de produção; em contrapartida, o consumo concelhio é cada vez menor, em virtude do crescente número de emigrantes para França e outros países de mais elevado nível de vida, melhor organização e justiça social. Para uma produção vinícola do volume da colheita do ano findo, a capacidade do consumo interno é muito reduzida e, como é óbvio, os excedentes têm de colocados no mercado externo ou entregues às refinarias para queima ou destilação. No primeiro caso, torna-se preciso a criação de centros de preparação e engarrafamento, em ordem a promover o aperfeiçoamento da técnica do fabrico, da melhoria de qualidade, e a obter, de uma forma efetiva, a garantia de procedência e de genuinidade; no segundo caso, é indispensável criar uma instalação de queima local a fim de evitar arbitrários graus de precedência, em um clima antipático de favores e de compadrio. Por isso, em seguimento das esquecidas recomendações do nosso Grémio da Lavoura, iniciaremos hoje a defesa da constituição da sociedade, e correlativa criação de uma adega cooperativa, e instalação de queima privativas para uso exclusivo dos viticultores melgacenses. Desta forma, evitaremos futuras dores de cabeça, provocadas pela falta de compradores do vinho das nossas adegas; pela sua conservação em bom estado sanitário, sem flor, azedia, volta, manite, casses, etc.; pelo aviltamento dos preços oferecidos pelos armazenistas, exportadores e outros compradores; pelo cuidado com o vasilhame, etc. // Por outro lado, deixaremos de ter cuidados com o envasamento, os atestos, trasfegas, clarificação, colagem, filtração, lotação, desinfeção, etc. Tudo isto e o mais que fica por dizer, passaria a ser atribuição da administração da Adega Cooperativa, em condições especiais de técnica, especialização, limpeza e ordenamento. O II Plano de Fomento destina avultada verba para a construção de Adegas Cooperativas e no seu financiamento comparticipam a Junta de Colonização Interna com empréstimos hipotecários equivalentes a 50% do custo da obra, inclusive o valor do terreno, amortizável em trinta anos, à taxa de juro de 2% ao ano; a Junta Nacional do Vinho com um subsídio, não reintegrável, conseguido através do Fundo de Fomento de Exportação, de 20% do custo efetivo do terreno e da obra projetada e, ainda, com os adiantamentos necessários à conclusão da obra, estes, amortizáveis também em trinta anos. Este último organismo fornece ainda o apetrechamento da adega, a pagar em quinze prestações anuais, tais como: bombas de trasfega, sulfitómetro, arejadores, esmagadores, desengaçadores, prensas hidráulicas, prensas contínuas, caldeira bagaceira, etc. Os restantes 30% terão de ser cobertos, aparte qualquer subsídio a conceder pela Comissão de Viticultura dos Vinhos Verdes, pelos associados da Sociedade Cooperativa, os quais terão de contribuir com uma cota de 200$00, aproximadamente, por pipa de quinhentos litros, paga em prestações. Lemos há poucos dias no Diário do Governo n.º 184, 3.ª série, de 6 de Agosto último, a portaria que aprova os estatutos da Sociedade Cooperativa de Santo Tirso, e a sua leitura inspirou-nos as considerações que deixamos escritas para conhecimento dos viticultores melgacenses, na esperança de que sirvam de modesto contributo nas diligências a realizar junto do Grémio da Lavoura para a criação da Adega Cooperativa de Melgaço.» // F.S. //  continua...                     

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