segunda-feira, 28 de março de 2022

OS MEUS SONETOS E OS DO FRADE 

Por Joaquim A. Rocha

// continuação de 18/12/2021.



SÍNTESE DA MORAL MELGACENSE

(impressões dum frade)

I


No cu de Portugal, nariz de Espanha,

Lá onde o Minho a cobra imita,

Onde até às nuvens se arrebita

Dum e outro lado áspera montanha.

 

Jaz um feio curral, que à vista acanha;

É vila. O povo – que dentro habita –

Diz: «noutros tempos era bem bonita».

Mas quem pode engolir essa patranha?!

 

Aqui, de gente boa pouca resta.

Quase toda a que pisa este espaço

É vil, maldizente, e desonesta!

 

Leitor, pela pintura que aqui faço,

Não saberás tu que terra é esta?

É a terra das putas… É Melgaço!!!


     No jornal “Notícias de Melgaço” número 787, de 18/8/1946, alguém escreveu: «feito isto e mais alguma coisa que deixamos de registar por descargo de consciência, voltaremos a ter foros de terra civilizada e a poder dizer que o célebre frade foi um caluniador

 II


Tu, das terras do Minho a mais danada,

Oh! esfarrapada, vil, torpe Melgaço;

Inda tens mais putas do que bagaço,

E todas ao deus Baco consagradas!

 

De marotos, albergas tal manada,

Tamanho mandrião, tanto madraço,

Que a conta por barato que lhes faço

São tantos como o milho a não ser nada!

 

E que línguas, que pérfida gentalha,

Em todos morde, em todos ferra o dente,

Esta futragem, esta vil canalha!

 

Quase tudo o que diz é maldizente,

Aqui por génio se murmura e ralha.

Maldita condição, maldita gente!

 


 

 

RESPOSTA AO FRADE

 

Frade ilustre, primaz dos fradalhões,

De São Bernardo o filho mais prestante;

Tonsurado cambrone, astro brilhante,

Trovador de sotaina, frei Camões!

 

Tu, ó frade, que enchendo os teus pulmões,

Cantar soubeste, em verso altissonante:

- Melgaço é uma corte radiante

De asnos, futres, patifes e ladrões.

 

Que novo redentor tu foste, ó frade!

Tu, que disseste aos tristes que aqui vêm:

- Isto é Melgaço, um brado à sociedade.

 

Tal brado, um evangelho em si contém…

Sem o qual estaria a humanidade

Sem honra, sem camisa e sem vintém.

 

Frade: exprimiste-te com razão.

De putas, malandros, viste o efeito:

Para baixo é porta sim, porta não;

E para cima… é quase tudo a eito!


Dr. Cândido Furtado Dantas

(juiz – 1798)

  

NOVA RESPOSTA AOS

SONETOS DO FRADE

  

Frade egrégio, que em mil e setecentos,

Tomaste a lira para a posteridade,

Com mentiras mil, algo de verdade,

Legaste e difundiste aos quatro ventos.

 

Que ser provaste, em palavrões nojentos,

Mais qu’em latim, um ás na obscenidade;

A ti rendo meu preito, ó bravo frade,

E louvo os elevados pensamentos…

 

E… mais: admiro a douta borracheira,

Aonde germinou, à hora da sesta,

Tão rica confissão de ódio e de asneira!

 

É que em Melgaço, a «vila desonesta»,

Ama a franqueza, mesmo a da videira…

E o silêncio traidor, e vil, detesta!

  

Elmano Minhoto


*

NOVÍSSIMA RESPOSTA

AO FRADE

(101)

  

Ó frade tanso, as belezas não viste,

Desta vila entre montanhas erguida,

Que é em si mesma santa e perdida,

Lugar dos mil deuses e deles chiste!

 

Ao dizeres tão mal, por mal, mentiste.

Não soubeste distinguir morte e vida,

O dia alegre e a noite atrevida…

Ao dizer mal, por mal, não resististe!

 

Vivas tu, ó frade, no vil inferno,

Lá onde te devorem loucas chamas,

As pontas aguçadas te penetrem;

 

Vivas… sem primavera, nem inverno,

Enterrado em porcas, sujas lamas…

Que os cornos do demo em ti vegetem!


Joaquim A. Rocha 



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