quinta-feira, 12 de agosto de 2021

  

FERREIRA DA SILVA

(Um Melgacense do Coração)

Casa fidalga do Rio do Porto
 


Ficha técnica


Título: Ferreira da Silva (um melgacense do coração)

 Autor – Joaquim A. Rocha

 Capa – foto extraída do Notícias de Melgaço

 Execução gráfica –

 Tiragem –

 Depósito legal –

 ISBN –

 Data de edição – 2021

 Correio eletrónico: joaquim.a.rocha@sapo.pt

Blogue: Melgaço, Minha Terra

 Telemóvel: 965815648

 

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Obras do autor

  

Obras a publicar

  

Poemas do Vento

Sonetos do Sol e da Lua

Quadras ao deus dará

Escritos Sobre Melgaço

Entre Mortos e Feridos (romance)

Lembranças Amargas (romance)

Gentes do Concelho de Melgaço (biografias)

Dicionário Enciclopédico de Melgaço

A Minha Vida em Imagens

A minha religião e outros escritos

Auto da Palina

Frágeis Elos (2.ª edição)

Melgaço: padres, monges e frades

Escritores e Investigadores Melgacenses (e afins)

Sob o Signo do Azar

 

 

Obras publicadas

 

Livros

 

Frágeis Elos (uma história familiar)

Dicionário Enciclopédico de Melgaço (I e II volumes)

Lina – Filha de Pã (romance)

Os Meus Sonetos e os do frade

Os Novos Lusíadas (…) - 2018

Melgacenses na I Grande Guerra (…)

(em parceria com Walter Alves) - 2018

 

Separatas

 

A Origem de Algumas Famílias Melgacenses

A Febre Tifoide e os seus Protagonistas

Tomás das Quingostas (200 anos do seu nascimento)

A Provável Origem de Melgaço e Paderne

 

Prefácios nos seguintes livros de José A. Cerdeira e do Dr. Augusto César Esteves:

 

Tomaz das Quingostas (JAC)

O Buraco da Serpe (JAC)

A Adversidade por Madrasta (JAC)

O Sonhador dos Montes da Aguieira (JAC)

Nas Páginas do Notícias de Melgaço (ACE)

 

Colaborações

 

No Boletim dos Serviços Sociais da CGD

No Boletim Cultural da Câmara Municipal de Melgaço

No jornal «A Voz de Melgaço»

No jornal «Fronteira Notícias»

Artigo sobre o santuário da Peneda no livro Lugares Sagrados

 de Portugal I, editado pelo Círculo de Leitores em 2016.

    

Prefácio

 

     O que nos surpreende em Ferreira da Silva é a sua versatilidade, a sua capacidade de se movimentar em vários terrenos, arenosos ou cheios de pedregulhos, e em outros menos agrestes; seu saber ou quase saber, o seu bom domínio da língua portuguesa, tornam-no um pedagogo, um professor, um cientista. Debruça-se sobre variadíssimos temas, aponta erros a técnicos ou candidatos a técnicos, escreve sobre isto e aquilo, e salvo raras exceções não mete o pé na argola, isto é, sai-se bem do assunto que descreve.

     As suas habilitações literárias não devem ultrapassar o antigo sétimo ano do liceu; no entanto, adquiriu através de imensas leituras, e também da experiência, conhecimentos que lhe permitiam escrever os seus artigos jornalísticos com um à-vontade surpreendente. Criticava a Câmara Municipal pelos inúmeros erros que ia cometendo, denunciava a demora na construção de escolas para o ensino primário, a má remuneração dos professores, a falta de civismo, de higiene, de falta de respeito; tentava defender os lavradores, cujos rendimentos eram escassos tendo em conta tanto trabalho para produzir meia dúzia de pipas de vinho, uns alqueires de milho, algum centeio, etc. Enfim, era um verdadeiro homem de ação. Embora prudente, politicamente arriscava, mas ao mesmo tempo tinha a noção de que escrever e publicar em um simples jornal concelhio não era a mesma coisa que escrever e publicar em um jornal nacional. O que se dizia em Melgaço raramente saía do concelho, o regime pouco ligava a isso; não é por acaso que por aqui não havia presos políticos. Os antigos republicanos melgacenses, defensores de uma certa democracia, não se metiam com o governo de Salazar, pelo contrário, por vezes, até colaboravam! Os interesses pessoais e coletivos, o bem-estar, inibem o ser humano; alguns arriscam, mas poucos.

     Ferreira da Silva foi de certo modo prejudicado com a ditadura militar e o Estado Novo, mas soube sempre gerir a sua vida, vivendo bem, sem nada lhe faltar. Casou com uma jovem melgacense, filha de comerciantes ricos, teve geração, a quem proporcionou um belo futuro, morou em um solar de antigos fidalgos, os Cunha Araújo, foi considerado por todos, a PIDE nunca o incomodou, que se saiba, conquistou a amizade e o respeito da classe média e alta da Vila de Melgaço, e também de outras partes onde residiu.             

    A este livro vai faltar alguns dos artigos por ele escritos no jornal “Melgacense”; este jornal, semanário salvo erro, dorme sossegado no Arquivo Municipal do Porto. Devido a determinadas circunstâncias é-me quase impossível lá ir. Esperemos que algum investigador se interesse por esta figura e complete este texto, deveras importante para a história do concelho de Melgaço. A Câmara Municipal tem feito algum trabalho nesta área, com a publicação de livros, ou apoiando financeiramente a sua edição, o Boletim Cultural, já com dez números editados. Ultimamente está mais concentrada em documentários cinematográficos, o que também é útil e interessante. A Casa da Cultura, quanto a mim, devia situar-se no Centro da Vila, na zona histórica talvez, perto do Museu do Cinema. O edifício da antiga cadeia não é o ideal para tal fim; adaptou-se, é certo, mas nunca satisfez completamente. O Arquivo Municipal tem o seu espaço no edifício da Câmara; devido à afluência de documentos (da SCMM, etc.) é provável que dentro de algum tempo os metros quadrados que ocupa sejam insuficientes. Façamos votos para que Melgaço cresça em população e em cultura, pois um povo semianalfabeto é como uma planta murcha.      

 

 

 

 

 

 

 

Pequena biografia

 

SILVA, Ernesto Viriato (*). Filho de Maria Beatriz Ferreira da Silva (**), solteira, doméstica, natural da freguesia de São Vítor, Braga, moradora na freguesia da Sé Primaz, da mesma cidade. Nasceu na freguesia da Sé, Braga, a 27/12/1893. // Estudou no liceu, filiando-se na Liga Académica Republicana e no Centro Republicano Dr. Manuel Monteiro. // Veio para Melgaço, transferido de Cabeceiras de Basto, a fim de chefiar a secção de finanças deste concelho, substituindo assim Luís de Passos Viana, que fora transferido para Valença, tomando posse a um sábado, -- de Março de 1918; essa posse foi-lhe conferida pelo aspirante de finanças, Manuel José da Costa (ver Jornal de Melgaço n.º 1197, de 2/3/1918, e Jornal de Melgaço n.º 1199, de 16/3/1918).

     Aqui, no concelho de Melgaço, casou a 21/9/1918 com Maria Margarida, de 23 anos de idade, solteira, natural da Vila de Melgaço, filha de António Joaquim Esteves e de Ludovina da Glória Álvares de Barros, comerciantes no lugar da Loja Nova. Testemunhas: José dos Anjos Pereira Valente, casado, capitão do exército, e Luciana Marcela, solteira, professora da instrução primária, ambos da capital do Minho. // Em Melgaço moraram posteriormente no antigo solar dos fidalgos Cunha Araújo, sito no Rio do Porto, que ele comprara (com dinheiro emprestado por seu sogro, certamente). // Juntamente com Hermenegildo José Solheiro, Dr. António José Joaquim Barros Durães, e professor Abel Nogueira Dantas, fundou, a 21/2/1926, o semanário “O Melgacense”, do qual assumiu a direção.

     Foi governador civil de Viana do Castelo de 1925 a 1926, mas devido a problemas de ordem política, e por ser filiado no Partido Democrático, foi preso e julgado como comparticipante do “Movimento de 3/2/1927”, demitido do cargo, sendo-lhe fixada residência em Sines, de onde regressou a 17/6/1928. // Como perdeu o emprego nas Finanças, em 1929 teve de ir trabalhar na Companhia Hidro Elétrica do Varosa, onde foi delegado gerente (1939); em 1940 já era diretor.

 

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     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 3, de 3/3/1929: «Paderne, 22/2/1929. De todos os leitores do Notícias de Melgaço é sabido que terminou a sua publicação neste concelho o jornal “Melgacense”, do qual foi muito digno diretor político o nosso amigo Sr. Ernesto Viriato da Silva. Determinou a sua suspensão, ainda que provisoriamente, a saída daquele nosso amigo do cargo que ocupava, para ir, como já foi, exercer outro, não menos espinhoso, qual é o de diretor dos serviços administrativos da Companhia Hidroelétrica do Varosa, fixando a sua residência na Régua, como participou aos seus amigos, e aonde ofereceu os seus serviços, que podem ser muito valiosos, como sempre. Àquele semanário “Melgacense” deu aquele nosso amigo o melhor do seu esforço, do seu cérebro, da sua atividade, enfim, da sua preclara e lúcida inteligência. Amigos como somos, fui correspondente daquele semanário, a seu pedido, e por isso mesmo senti muito a sua saída porque se nos confrange a alma sempre que vemos desaparecer do convívio da sua família, que o adora, e dos seus numerosos amigos, que o estimam, homens como Ferreira da Silva. Tivemos ocasião de conhecer muito de perto os predicados que lhe exornam o seu caráter impoluto, a nobreza da sua alma; e, porque lhe não foi possível despedir-se de nós pessoalmente, daqui lhe enviamos um efusivo abraço, e as nossas mais sinceras saudações.» // Manuel N. do Outeiro.    

 

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     Nos seus tempos livres inscreveu-se no Clube dos Fenianos, chegando a presidente em 1939. // Foi secretário do Ateneu Comercial do Porto de 1940 a 1944. // Por eleições havidas em 1945, ascendeu ao lugar de presidente da Associação dos Bombeiros Voluntários do Porto. // No “Notícias de Melgaço n.º 755, de 4/11/1945, pode ler-se uma entrevista sua, concedida a Vasco Gama de Almeida.

 

     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1427, de 25/2/1962: «Por a doença o ter enlaçado num forte e inusitado amplexo de mau querer, recolheu ao leito já há dias o nosso querido amigo, senhor EVPFS que, por conselhos da medicina, não pode nem deve nesta altura ser incomodado pela visita afetuosa dos seus muitos amigos. Sabemos contudo estarem-se acentuando as suas melhoras, e oxalá bem cedo seja visto por todos nas ruas desta vila completamente bom

 

     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1430, de 25/3/1962: «Completamente restabelecido da doença de que foi acometido, há pouco tempo tivemos já o prazer de ver numa das ruas desta vila o nosso prezado amigo senhor Ernesto dos Passos Ferreira da Silva. Com os seus muitos amigos se congratula Notícias de Melgaço pois este nosso amigo é dos tais que ainda faz muita falta à nossa terra

 

     «O abaixo-assinado, na impossibilidade de o fazer pessoalmente e, ainda, no bom desejo de suprir faltas inevitáveis, usa deste meio para exprimir o seu profundo e indelével agradecimento às inúmeras pessoas e amigos que se dignaram significar-lhe a sua amizade e estima, informando-se, visitando-o, ou interessando-se, de qualquer modo, pelo seu estado de saúde durante o período evolutivo da sua doença. Melgaço, 23/3/1962.» EVPFS

 

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     A partir do número 1460, de 3/2/1963, torna-se diretor do “Notícias de Melgaço”. Escreveu então o artigo, ao qual deu o nome de APRESENTAÇÃO: «É de uso no exercício de qualquer cargo ou função diretiva pronunciar ou escrever algumas palavras ao jeito de apresentação. Ao assumir a direção do Notícias de Melgaço, missão para a qual fomos solicitados, insistentemente, por amigo muito querido (*), quase irmão, dedicado e fanático defensor dos interesses desta linda terra, cultor e cantor autorizado das suas belezas e fastos notáveis, não deixaremos de seguir a tradição: dizer aos nossos estimados e amáveis assinantes e leitores quem somos e ao que vimos. // Não nos parece descabido, neste momento, lembrar a uns e informar a outros que, durante largo período de tempo, orientamos e dirigimos o semanário Melgacense, antecessor de Notícias de Melgaço, ao qual imprimimos um aspeto gráfico moderno e nas suas colunas tratamos, o melhor que soubemos, dos problemas e das questões mais urgentes ligadas a este concelho. // De entre outros recordamos a campanha sobre a extensão da linha do Minho e consequente ligação ferroviária a Melgaço, libertando o nosso concelho da dependência vexatória e intolerável do vizinho concelho de Monção. Vão passados cerca de trinta e oito anos! Valerá a pena recordar?! Por agora diremos simplesmente que estamos satisfeitos, cumprimos o nosso dever; tratamos com firmeza, emoção e bairrismo dos assuntos de atualidade e interesse melgacense. Com paixão ou fria determinação e sempre com elegância e boa educação. As questões gerais ou locais, mesmo quando levadas ao terreiro da polémica, tratam-se com boas razões e inteligente argumentação; no fim e ao cabo todos temos o dever de pugnar, obstinadamente, pela grandeza material e moral da terra a que estamos ligados pelo nascimento ou pelo coração. «A missão é de paz e união.» Isto não significa renúncia, vistas as coisas sob qualquer ângulo e em todas as dimensões. Todos os que nos conhecem sabem que por temperamento e por dignidade, nunca viramos a cara a quem quer que seja; somos dotados de espírito combativo e ânimo de lutador. Porém, só compreendemos a luta quando servida pelo mais puro idealismo, por tudo quanto é digno, por tudo quanto é nobre, por tudo quanto de direito e de justiça nos cabe reclamar e defender. Todos juntos somos poucos para desenraizar a nossa terra do entorpecimento, do marasmo e do atraso em que vive, e para a encaminhar na senda do progresso e do engrandecimento a que tem direito incontestável. Ninguém se ofenda com a crítica que reputamos indispensável na campanha que se impõe; crítica construtiva, evidentemente, ao que está mal, aos que não sirvam com honestidade, acerto e dedicação, a tudo o que por preguiça, incompetência, imprevidência ou por medo deixe de fazer-se. // Somos contra o comodismo, a imoralidade, o devorismo, o não te rales, os avanços e recuos de caracol, as inversões de caranguejo; somos contra os interesses particulares quando lesem ou prejudiquem o bom andamento do interesse geral e contra as manifestações da vaidade, da teimosia e da inconsciência criminosa dos que não fazem nem deixam fazer. Nisto somos um inconformista. Um inconformista sem medo. Por outro lado, não regatearemos aplausos a toda a atuação útil, venha de que setor vier, a toda a obra generosa de humanidade, de beneficência e de caridade, a todas as iniciativas ponderadas e detidamente estudadas em prol do progresso material e do bem-estar dos melgacenses. E ficamos por aqui; para apresentação o que deixamos dito, basta. Resta-nos saudar muito fraternalmente todos os melgacenses, sem distinção, a imprensa de todo país e sobretudo a do nosso concelho.» // F.S. /// (*) Trata-se do Dr. Augusto César Esteves

 

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     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1460, de 3/2/1963: «Está de parabéns a redação do Notícias de Melgaço por haver escolhido para diretor do semanário o senhor Ernesto Viriato P. Ferreira da Silva, esse homem que é melgacense pelo coração e já ganhou as esporas de ouro do jornalismo local à frente do “Melgacense”. Isso é garantia do programa do Notícias ainda hoje se cifrar nas poucas palavras escritas em 1961, razão bastante para as não recordar aqui

 

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     Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1460, página 4, o seguinte artigo do professor Ascensão Afonso: «NOVO DIRETOR. Apresenta hoje “Notícias de Melgaço” novo nome no seu cabeçalho. É o nome prestigioso de um homem a quem sobra a experiência e em quem abundam a inteligência e todas as outras qualidades capazes de darem prestígio a uma instituição ou a um jornal. Não comungamos de todas as ideias do novo Diretor do “Notícias” mas nem por isso deixamos de tributar-lhe toda a estima e toda a admiração que nos merece uma pessoa que, sem abdicar dos seus sentimentos, sabe respeitar os dos outros. A tolerância e a compreensão são qualidades que muito se apreciam e que distinguem as pessoas superiores. A nova etapa que “Notícias de Melgaço” hoje inicia há de ser, sem dúvida, benéfica para esta terra, tão falha de valores e tão rica de maldizentes. Confiamos no amor bairrista do Senhor Ernesto Viriato dos Passos Ferreira da Silva e felicitamos “Notícias de Melgaço” pela feliz escolha do novo Diretor. Ao querido Amigo desejamos os maiores triunfos e que estes redundem também em benefício da terra.» // Ascensão Afonso.

 

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     Notícias de Melgaço n.º 1462, de 17/2/1963: «Na Alvorada de um Novo Ano. Com o presente número o Notícias de Melgaço entra festivamente no 35.º ano da sua existência. Mais um ano se inicia com este número; de harmonia com a praxe estabelecida, aqui vimos saudar os nossos queridos conterrâneos e prezados assinantes em especial, os leitores em geral, os dedicados colaboradores, enfim, todos quantos têm auxiliado desinteressadamente a regular publicação deste semanário que, de cabeça erguida, progride e vive honradamente dos seus próprios meios. Ao acolhimento e simpatia do público melgacense, sobretudo dos nossos assinantes, se deve, apesar de todas as dificuldades, o triunfo da sobrevivência do nosso jornal. É pois com grande júbilo que saudamos a alvorada de mais um ano de existência e, com o mesmo entusiasmo, a mesma confiança e a mesma fé de sempre prosseguiremos na rota vitoriosa de converter o Notícias de Melgaço em elo da cadeia que une o passado ao presente e ao futuro deste lindo rincão, em ordem a fomentar o amor que todos os melgacenses têm à sua terra – segredo e fonte do nosso sadio bairrismo. Neste dia de aniversário, sem reclamos, sem barulho, modesta mas devotadamente, cumprimos com alegria o dever que nos cabe de exprimir os mais ardentes votos para que aqui se continue a enaltecer e a honrar a terra de Santa Maria, prezando a sua história, prestando homenagem e culto aos seus homens ilustres, e dando o devido valor aos bens superiores do espírito. Manteremos, pois, acesa em nossas mãos este FACHO de amor bairrista melgacense e esperamos um dia transmiti-lo, assim bem vivo, a quem mais exaltada e firmemente possa e queira empunha-lo. // F.S.       

 

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    Lê-se no Notícias de Melgaço n.º 1473, de 2/6/1963: «Quando nos dispúnhamos a saborear uma xícara de café na linda princesa do Minho – a Vila de Caminha – ouvimos de chofre, pela rádio, a notícia alucinante: morreu Aquilino Ribeiro! Sentimos como que uma pancada na cabeça, ficamos atordoados, o coração quase paralisou e os olhos estavam humedecidos. Sabíamo-lo doente, mas sem gravidade, e estávamos preparados para assistir à homenagem que o Rotary Clube de Viseu estava a organizar, em comemoração do jubileu literário do eminente polígrafo e ilustre homem de letras, dos maiores entre os grandes que, pela sua excecional capacidade criadora, pela beleza e riqueza do seu portentoso estilo, se elevou às culminâncias de Mestre consagrado das letras nacionais com larga projeção internacional. // Morreu Aquilino Ribeiro! Infelizmente a triste notícia era verdadeira! Morreu um Homem! Um homem com h maiúsculo, igual a si próprio até ao último suspiro; um escritor cuja saudosa memória ficará acesa no nosso coração, como uma chama viva e imperecível perenemente ligada à glória de Portugal! Ainda há poucos dias enriquecemos a estante da nossa modesta biblioteca, onde se alinha toda a obra literária do Mestre, com a reedição revista de “Abóboras no Telhado”, onde o polemista de extraordinário valor deixa algumas das personagens em farrapos; “Tombo no Inferno” e “O Manto de Nossa Senhora” (teatro), drama serrano, espécie de buette, género literário de nós, [portugueses], desconhecido. // Homem de letras, jornalista, escritor, crítico, biógrafo, polemista, historiógrafo, investigador, ensaísta, contista, novelista, romancista, Mestre Aquilino sorveu a sua imensa atividade e inspiração nas fontes que brotam da terra e do povo, viveu e morreu como um autêntico democrata e combativo liberal. Nos sessenta volumes da sua bagagem literária, encontramos de tudo: autobiografia – trípico de “Jardim das Tormentas”, “Lápides Partidas” e “Via Sinuosa”; tradutor – “Dom Quixote de La Mancha”; polemista – “Abóboras e Aboborões no Telhado”; contista – “Quando ao Gavião Cai a Pena”, etc.; biógrafo e crítico – “Romance de Camilo”, etc.; novelista – “Filhas de Babilónia”, “Estrada de Santiago”, etc.; romancista – “Maria Benigna”, “Arcanjo Negro”, etc.; antropomorfista – “Romance da Raposa”, “Mestre Grilo Cantava e o Gigante Dormia”, etc.; ensaísta – “Luís de Camões, “Cavaleiro de Oliveira”, etc.; historiógrafo – “Constantino de Bragança”, “Camões, Camilo, Eça”, e alguns mais, etc.; paisagista – “Geografia Sentimental”, etc.; cronista – “A Grande Casa de Romarigães, etc. // Aquilino Ribeiro estava em plena comemoração do 50.º de vida literária e a receber as homenagens de admiração do mundo das letras pela sua obra ímpar, inimitável, de conteúdo maravilhoso, fecundo de verdade e de beleza humana. A morte é uma consequência da vida, mas neste surto foi além de traiçoeira e impiedosa terrivelmente assassina. Não matou, assassinou… Assassinou um dos maiores vultos do nosso século, uma das maiores glórias da nossa pátria, um dos grandes da literatura mundial. Aquilino era um serrano por nascimento e pelo coração; um atleta formado nas inclemências serranas da Beira; maciço, forte, leal, combativo, intemerato, sadio e sempre de alma aberta às ideias nobres, à verdade e à causa do democracia. Não o acompanhamos à sua última morada, no cemitério que por ironia toponímica chamam de Cemitério dos Prazeres, mas daqui, do extremo norte do país, também batido pelos ares da serra, nos descobrimos com o maior respeito e piedosa (…) e recolhidamente desfolhamos, com a maior emoção, sobre o seu ataúde, as pétalas da nossa imperecível saudade. Aquilino entrou na imortalidade; silenciosa e amarguradamente entoamos a oração da Paz. MORREU UM HOMEM! No panteão da história passa a ocupar um lugar de honra.» F.S.     // continua...                

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